Extrema direita avança no Brasil

Bolsonaro alcançou 46% dos votos, com impactos nos pleitos estaduais e na eleição para os legislativos

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08 de outubro de 2018

EXTREMA DIREITA AVANÇA NO BRASIL

Jair Bolsonaro (PSL) conseguiu 46,03% dos votos válidos. Fernando Haddad (PT), 29,28%. Se enfrentarão no segundo turno, daqui a 20 dias. O problema do campo popular progressista, até lá, será tirar votos do capitão reformado do Exército. Isso porque eleitores de candidatos do campo conservador – Geraldo Alckmin (PSDB), com 4,7%; João Amoêdo (Novo), com 2,5%; Cabo Daciolo (Patriota), com 1,26%; Henrique Meirelles (MDB), com 1,2%; Álvaro Dias (Pode), com 0,8% – tendem a migrar para a candidatura do PSL, e não para Haddad em uma eleição que continua a ter caráter plebiscitário. É certo que alguma, senão boa parte dos votos que Ciro Gomes (PDT) obteve, 12,47%, irão para Haddad. Ele sinalizou ontem mesmo que apoiará o petista. Também é o caso do 0,58% de Guilherme Boulos (PSOL). E há o 1% de Marina Silva (Rede)… Mas uma transferência perfeita de votos dos três (com mínimas chances de acontecer) colocaria Haddad com 43%. Ou Bolsonaro perde votos – muitos – ou ele leva a eleição, com todas as consequências que isso acarretará.

Em transmissão ao vivo, o candidato repetiu que vai varrer o “comunismo” do país e voltou a colocar em xeque a lisura do processo eleitoral: “Se tivéssemos confiança no voto eletrônico, já teríamos o nome do futuro presidente da República decidido no dia de hoje.” O domingo foi de avalanche de notícias falsas sobre as urnas eletrônicas nas redes de seus apoiadores. A começar por um de seus filhos, eleito senador pelo Rio. Flávio Bolsonaro divulgou vídeo em que a urna completava o voto para Haddad – mentira rebatida por perícia do TRE-MG que provou que o vídeo foi editado.

Em tom muito diferente, Haddad fez pronunciamento público: “Queremos unir as pessoas que têm atenção aos mais pobres desse país tão desigual. Queremos um projeto amplo para o Brasil, profundamente democrático, mas também que busque de forma incansável a justiça social.”

Nos estados, e na eleição para os legislativos, o bolsonarismo se fez sentir. No Rio de Janeiro, o ex-juiz e ex-fuzileiro naval Wilson Witzel (PSC) colou na reta final sua imagem a dos Bolsonaros e alcançou inacreditáveis 41,28% dos votos. Já o veterano Eduardo Paes (DEM) ficou com 19,56%. Por lá, quatro dos cinco deputados estaduais mais votados pertencem ao partido de Bolsonaro. Sendo o campeão de votos, Rodrigo Amorim, o mesmo que há uma semana divulgou foto em que se exibe com a placa que homenageava a vereadora assassinada Marielle Franco quebrada (e escreveu “preparem-se, esquerdopatas: no que depender de nós, seus dias estão contados”). Em São Paulo, a coautora do impeachment Janaina Paschoal (PSL) foi a deputada estadual mais votada da história. E Eduardo Bolsonaro se reelegeu deputado federal por SP com uma votação também recordista de 1,8 milhão, maior que a de Eneás Carneiro em 2002. Por lá, disputam o segundo turno João Doria (PSDB) – que vem tentando emular Bolsonaro – e o governador Márcio França (PSB).

NOVA FORÇA POLÍTICA

Piauí resume a performance do desconhecido e antes nanico PSL, que segundo pesquisa Datafolha, já está empatado com o PSDB como segundo partido na preferência do eleitor brasileiro (com 4%), só perdendo para o PT (isolado na liderança, com 21%):

“Foi a maior vitória eleitoral da direita desde o fim da ditadura. O ex-capitão do Exército Jair Bolsonaro recebeu quase 50 milhões de votos e ficou a pouco mais de um João Amoêdo e meio de ser eleito presidente da República no primeiro turno. Seu partido, que elegera um único deputado federal há quatro anos, montou a segunda maior bancada da Câmara (…) O PSL elegeu ainda quatro senadores e levou seu candidato ao segundo turno nas disputas pelos governos de três estados.”

SOBE E DESCE DAS BANCADAS

O PT elegeu a maior bancada da Câmara, com 56 deputados. O PSL ficou com 52 cadeiras. O PP, que era a maior bancada, ficou com 37 deputados. Já o MDB diminuiu – e muito – indo de 65 para 34 cadeiras, se posicionando como a quarta maior bancada junto com o PSD, que também fez 34 deputados. O PR vem atrás, com 33. O PSDB perdeu quase metade dos deputados, em comparação com o último pleito e agora tem 29. Antes eram 54. É a oitava bancada, junto com o DEM. O PSOL dobrou a sua, e agora tem dez deputados. E o Partido Novo, estreante, conseguiu eleger oito.

ADEUS, PSDB?

E o Nexo explica a derrocada do partido que, junto com o PT, polarizou as eleições desde 1994.

GOVERNADORES ELEITOS

Treze estados definiram governantes no primeiro turno. O primeiro e terceiro maiores sucessos das urnas foram petistas: Camilo Santana, do Ceará, bateu quase 80% dos votos válidos. E Rui Costa, da Bahia, obteve 75%. Também Flávio Dino (PC do B) se reelegeu no Maranhão, com 59%. E Wellington Dias (PT), com 55% no Piauí. Em Pernambuco, Paulo Câmara (PSB) obteve 50,7%. E seu companheiro de partido na Paraíba, João, ficou com 58%. Em Alagoas, Renan Filho (MDB) conseguiu a segunda melhor votação (77%). No Norte, Tocantins e Acre elegeram seus governadores:  Mauro Carlesse (PHS), com 57%, e Gladson Cameli (PP), com 53%. E no Sudeste, apenas o Espírito Santo definiu: Renato Casagrande (PSB) foi eleito (55%). Em Goiás, o ex-senador Ronaldo Caiado agora é governador (59%). Mauro Mendes (DEM) ganhou em Mato Grosso, com 58%. E Ratinho Júnior (PSD) desbancou a governadora Cida Borghetti (esposa do ex-ministro da saúde, Ricardo Barros), e venceu com quase 60% dos votos.

COMO COLLOR

E para Ricardo Barros, Bolsonaro terá dificuldades para governar, caso eleito. “Collor representou momento desse, o caçador de marajás, e acabou depois se mostrando incapacitado para formar governo, maioria, e manter relacionamento com as instituições do Brasil”, disse ao Estadão.

NADA BOM

A cientista política Maria Hermínia Tavares de Almeida falou ao Nexo sobre o significado da expressiva votação que Bolsonaro obteve: “Revela que uma parcela importante do eleitorado fez uma opção por um candidato de extrema direita, e isso não é uma coisa comum em nenhum lugar do mundo, em nenhuma democracia do mundo. Em geral, a extrema direita até tem certa força nas democracias consolidadas. Porém, ultimamente, é raro ver candidatos tão pouco comprometidos com as regras democráticas, com os valores democráticos, terem uma votação tão expressiva quanto essa que o candidato Jair Bolsonaro teve.”

ELE NÃO

Na última sexta-feira, nos posicionamos contra a candidatura de Bolsonaro:

“Temos lado; não partido. Preferíamos ver qualquer outro candidato no segundo turno. Não precisamos “acreditar” que as propostas de Jair Bolsonaro (PSL) são uma ameaça para a democracia e para uma ampla parcela da sociedade brasileira – as ideias do candidato estão escritas e gravadas. Sob o manto da “união do Brasil” – já bastante gasto, posto que usado por Michel Temer (MDB) – Bolsonaro descortina um horizonte de rupturas com princípios civilizatórios.

A possibilidade concreta de que este projeto político vença as eleições, demonstrada a cada nova pesquisa de intenção de votos desde o início da semana, é preocupante. E, a não muito tempo atrás, era impensável. Mas as eleições de 2018 parecem ser a esquina em que, finalmente, uma metade do Brasil encontra com a outra. É contraproducente fechar os olhos na tentativa de conjurar outra realidade. Teremos de lidar com este presente, esta divisão e estes fantasmas, qualquer que seja o futuro.”

No texto, analisamos o programa de governo do candidato do PSL e suas propostas para a saúde.

PARA RELER

Também analisamos o que propõe Fernando Haddad para a saúde, outras áreas sociais, e falamos de algumas propostas polêmicas de seu programa de governo, como a da nova Assembleia Constituinte.

INFECÇÃO GERAL

A taxa de mortalidade por infecção generalizada nos pronto-socorros públicos é o dobro da registrada nos serviços privados (42,2% contra 17,7%), segundo o estudo do Instituto Latino Americano de Sepse (ILAS). Participaram 350 pacientes internados em 74 hospitais – 46 particulares e 28 públicos. A diferença no desfecho, de acordo com a entidade, pode ser explicada, dentre outros fatores, por falta de leitos de UTI no serviço público. A transferência de uma pessoa com sepse para uma unidade de terapia intensiva deve ser feita nas primeiras 24 horas da infecção. Segundo o estudo, essa recomendação é seguida por 42% dos hospitais privados e 14,8% dos públicos. Nestes, os usuários permaneceram no pronto-socorro até a alta ou a morte em 38% das ocasiões, com taxa de mortalidade de 61%. Nos privados, a taxa de mortes foi de 37% e a permanência no pronto-socorro de apenas 6%. No Brasil, existem 41 mil leitos de UTI, metade deles estão disponíveis para o SUS, que atende todos os brasileiros – enquanto a outra metade serve a cerca de 25% da população com plano de saúde. A região Norte tem apenas 5% desses leitos, enquanto o Sudeste concentra 53%.

Entrevistado pela Folha, o infectologista Marcos Boulos, da USP, estranhou a disparidade das taxas de mortalidade encontradas pelo estudo. “Tanto há hospitais públicos e privados muito bons quanto os muito ruins, que sofrem sobrecarga, falta de leitos de UTI. Não é compreensível essa diferença.” Ele destacou que nos últimos três anos a falta de profissionais no SUS ficou mais aguda, resultado do corte de recursos na saúde. E isso poderia estar afetando negativamente a qualidade da assistência.

ÀS COMPRAS

Um dos cinco maiores laboratórios de medicina diagnóstica do país está indo às compras. Na última sexta, o Sabin fechou aquisição do Medical, com unidades no ABC paulista. Trata-se da segunda aquisição em São Paulo em um mês e a quarta compra de ativos de laboratórios neste ano, segundo o Valor.

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