SUS e Constituição completam 30 anos

Marco da redemocratização e da garantia de direitos como a saúde, Constituição Cidadã é celebrada em momento de incertezas

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. Essa e outras notícias aqui, em cinco minutos.

05 de outubro de 2018

SUS E CONSTITUIÇÃO COMPLETAM 30 ANOS

Foi em 5 de outubro de 1988 que se promulgou a nossa Constituição Federal. Selando o fim da ditadura civil-militar que se abateu sobre o país entre 1964 e 1985, se tornando símbolo da redemocratização e garantindo uma série de direitos sociais, ela ficou conhecida como Constituição Cidadã. Foi nela que se estabeleceu a saúde como direito de todos e dever do Estado e que nasceu formalmente o SUS (dois anos depois ele ainda seria regulamentado pelas leis orgânicas da saúde). Mas alguns desses direitos estão hoje sob ameaça, inclusive por meio de mudanças feitas na própria Carta Magna, como a Emenda 95. Ao congelar os gastos federais para áreas como a saúde até 2036, o dispositivo não elimina literalmente os direitos da Constituição, mas, na prática, os desidrata.

Ainda por cima estamos em um processo eleitoral conturbado, para dizer o mínimo, em que o candidato líder nas pesquisas elogia publicamente a ditadura, inclusive práticas como a tortura. “O texto já não é o texto. Foi jurisprudencializado em demasia (assim como o restante do Direito), por vezes substituído pela voz das ruas ou por superinterpretações. Ou simplesmente por juízos morais”, escreve, no Conjur, o jurista Lenio Luiz Streck, referindo-se à nossa história recente e completando: “Hoje corremos o risco de termos, já em 2019, constituinte até sem povo. Claro que isso só é possível com ruptura institucional. Quem deseja isso?”.

Os anos de chumbo são lembrados pelo tributarista Fernando Scaff, no mesmo site. Além de falar da ausência das ‘liberdades públicas’ e da presença de corrupção, ele escreve sobre a saúde: “Antes, no âmbito da saúde pública, o atendimento médico era apenas para quem fosse segurado da previdência, o que deixava grande parte da população à míngua de tratamento, ficando ao sabor das eventuais cortesias do sistema de saúde. Hoje, qualquer pessoa tem acesso ao atendimento gratuito pelo SUS”.

Nas versões online e impressa, o Estadão publicou hoje um artigo do ministro do STF Luís Roberto Barroso. Ele diz que “em uma geração, derrotamos a ditadura, a inflação descontrolada e obtivemos vitórias marcantes sobre a pobreza extrema”. E depois afirma que o Brasil precisa de um “choque de livre iniciativa”.

Uma série especial foi feita pela Rádio Câmara e tem um bloco sobre o SUS. “Com o SUS, veio a garantia de 8% do PIB, 30% das receitas da previdência e outras verbas para a seguridade social”, diz o locutor. Que distância…

Já o IDEC publicou um resumo dos serviços de saúde a que todo mundo tem direito, citando a legislação envolvida em cada caso.

E a comparação com outros lugares do mundo foi o foco da matéria do Balanço Geral, da Record de Minas. Aparecem regiões muito pobres e/ou de conflitos, em que não há sistemas estruturados; os EUA, onde não há nada gratuito e a saúde é baseada na cobertura por planos; e o britânico NHS, descrito na matéria como “SUS de ‘primeiro mundo'”. 

Teve ontem uma sessão solene no STF pra comemorar. Temer foi. O ministro Dias Toffoli, que há pouco tempo disse que preferia chamar o golpe de 1964 de “movimento“, falou que “nunca mais a escravatura, nunca mais a ditadura, nunca mais o fascismo e o nazismo, nunca mais o comunismo…”. 

ÚLTIMO DEBATE

Aconteceu ontem à noite, na Globo, o último debate televisivo entre candidatos à presidência antes do primeiro turno. Só foram convidados oito candidatos, e participaram sete: Alvaro Dias (Podemos), Ciro Gomes (PDT), Fernando Haddad (PT), Geraldo Alckmin (PSDB), Guilherme Boulos (PSOL). Henrique Meirelles (MDB) e Marina Silva (Rede). Jair  Bolsonaro saiu do hospital, mas negou a participação alegando restrições médicas. No entanto, deu uma entrevista na Record no horário do debate.

Como era de se esperar, o ausente Bolsonaro e Haddad foram os ,mais espetados. Álvaro Dias estava especialmente agressivo com Haddad, e também mais desorientado (literalmente) do que o normal. Saiu do foco da câmera várias vezes e chegou a estourar o tempo de uma pergunta antes mesmo de fazê-la.

Enfim, a saúde. O tema foi citado por Meirelles quando Álvaro Dias o chamou mas nada perguntou, e o emedebista pôde divagar sobre suas propostas de forma geral. Na saúde, sua ideia fixa é com a informatização, e foi o que ele disse.  Mais adiante, foi Meirelles quem perguntou a Dias o que ele faria para melhorar a qualidade do atendimento. “Não roubar e ter competência de gestão”, respondeu Dias, que passou a falar mal do PT, o que fez a noite inteira. Ele também disse que “o SUS, que é um grande programa, acabou sendo um programa pífio, um desastre, um caos”.  E prometeu criar o Médico Federal no lugar do Mais Médicos, que “é outra corrupção, dinheiro que vai pra Cuba”.

Alckmin não disse, dessa vez, que a saúde está fora da Emenda 95, mas afirmou categoricamente que nenhum direito foi retirado com a reforma trabalhista. Como no debate anterior, foi Boulos quem confrontou a afirmação, falando da terceirização irrestrita e da permissão para o trabalho de gestantes em lugares insalubres. “Vocês falam de custo-Brasil. Pra vocês, direito é um custo. Para nós, custo é um bilhão de reais para auxílio-moradia, 400 milhões todos os anos para pagar juros abusivos para banqueiros e agiotas. Educação e saúde não são gastos, são investimento no futuro. Gasto é bolsa-empresário, é fazer com que os super ricos não paguem impostos”, disse o candidato do PSOL.

Boulos também falou sobre política de drogas.  Reafirmou que o tráfico tem que ser combatido com inteligência. E completou: “A ideia de que usuário tem que ser usado com porrada, bomba e prisão está superada em todas as partes do mundo. Não pode ser tema do código penal, isso só leva ao encarceramento em massa. A população de presos no Brasil dobrou nos últimos anos, mas alguém sente mais seguro com isso? Abuso de substância química é caso de saúde pública, do SUS”.

Tanto ele como Ciro citaram a Emenda 95 e a necessidade de revogá-la.

MAIS UM

E na série que analisa as propostas dos candidatos à presidência, hoje temos Haddad. A saúde tem um bom destaque em seu plano de governo e ele toca em pontos pouco ou nada explorados pelos demais, como programas voltados para para alimentação adequada e atividades físicas. Mas, depois que ele foi prefeito de São Paulo, a saúde foi uma das áreas mais mal avaliadas pela população. Na gestão, a chapa quer “aprimorar a regulamentação” das relações com as organizações sociais.

MANTER A SANIDADE

A visão de psicólogos e psiquiatras sobre por que as eleições estão acabando com a nossa saúde mental – e o que fazer para sair dessa – estão na coluna de Marcello Zorzanelli na Folha. 

FUTURO

Também em coluna na Folha, Vladimir Safatle imagina a vida aqui a um ano, com Bolsonaro presidente. E escreve como se fosse o próprio, no momento em que a população reclama e o caos toma conta.  “Agora, tem gente de novo na rua dizendo que eu não estou nem aí com a saúde pública, que está tudo sucateado e o povo apodrece em fila de hospital porque não aumentei os recursos para o SUS. Eu tinha dito que não ia aumentar mesmo, que não precisava disso”. Para pôr ordem nas coisas, ele e o General Mourão decretam estado de exceção.

FURA-FILA

No Rio, deputados aprovaram em primeira discussão uma lei que autoriza unidades de saúde em todo o estado a atender pacientes independentemente de agendamento prévio e da ordem no sistema de regulação de leitos, consultas e exames. O Ministério Público já disse que, caso a lei passe, cabe ação direta de inconstitucionalidade.

MIGRANTES

Um estudo da Organização Internacional para as Migrações e do Unicef avaliou as condições de crianças e adolescentes venezuelanos que estão no Brasil. Em relação à saúde, a maioria (87,1%) estava com as vacinas atualizadas e 70% tinham acesso aos serviços de saúde, mas as condições sanitárias eram ruins: 60% não tinham acesso a água limpa para beber e 45% não tinham acesso regular a água para cozinhar e para a higiene pessoal. Um percentual significativo (16%) disseram que passaram fome.

ARCA DE NOÉ

Mas de micróbios. Um grupo de cientistas propõe que se organize uma coleção deles para proteger a saúde da humanidade no longo prazo. Seriam germes coletados ao redor do mundo, em populações que não foram expostas a antibióticos, comidas processadas e produzidas com agrotóxicos, que nos fazem perder a diversidade microbiana e, com ela, a proteção contra várias doenças. A proposta foi divulgada ontem na Nature e foi inspirada no Cofre Global de Svalbard, na Noruega, que é a maior coleção de sementes do mundo e foi criada para preservar a diversidade da agricultura.

JABUTI

Tem três publicações sobre saúde entre os finalistas do Prêmio Jabuti, na categoria Ciências: Bioética e a violência contra a mulher – Um debate recorrente entre profissionais da Saúde e do Direito,  de Janice Nazareth, Reinaldo Oliveira e Nadir Prates; Brasil saúde amanhã: complexo econômico-industrial da saúde, de Telma Ruth Pereira, Paulo Gadelha, José Carvalho de Noronha e Carlos Grabois Gadelha; e Nutrição e saúde pública: produção e consumo de alimentos, de Elizabeth Torres e Flavia Sarti.

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