Como o Brasil vai lidar com a nova fase da pandemia

Vai ser preciso vacinar muito, inclusive as crianças, e submeter o vírus à vigilância genômica, sequenciando genes aos milhares. E criar passaporte vacinal e certificados de vacinação. Mas, adivinhe: o país está bem preparado para esse novo desafio. Agirá?

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Essa semana marcou o novo estilo de enfrentamento da pandemia no Brasil, a começar por uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), na segunda, 6/12, dando o prazo de 48 horas para o governo explicar por que não adota medidas essenciais, como a exigência do passaporte da vacina no Brasil, ou de quarentena obrigatória para a entrada de viajantes que possam colocar em risco a segurança sanitária nacional.

Em tempos de imunização avançada, doses de reforço e atenção redobrada com o controle de variantes-surpresa como a ômicron – tudo isso associado à volta de atividades que haviam sido reduzidas ou interrompidas na fase mais aguda das infecções –, as autoridades sanitárias fizeram coro à prontidão do STF. “Nós precisamos exigir o passaporte de vacinação para a reentrada na vida normal”, comentou, por exemlo, a pneumologista Margareth Dalcolmo, da Fiocruz.

Ela fez uma síntese esclarecedora sobre o atual cenário pandêmico, afirmando que a solução é “vacinar, vacinar e vacinar”. Temos ótima proteção vacinal, diz, mas agora é preciso ir além.

“Precisamos assegurar o máximo de proteção, como doses de reforço para todas as pessoas e idades”, declarou à CNN. E temos que sequenciar muito porque somente com a vigilância genômica poderemos determinar a tendência das contaminações.

O presidente Jair Bolsonaro, como sempre, desdenhou as vacinas. “A sensação é que a gente continua na vanguarda da estupidez mundial”, respondeu a infectologista Luana Araújo. Mas o presidente não fala pelo país. As cidades vão exigir passaporte vacinal em festas particulares de fim de ano, registra o noticiário. Vão exigir inclusive testes, raros atualmente: certificados negativos para covid. Notavelmente, pode nem haver réveillon no Rio de Janeiro.

A grande festa tradicional da cidade foi, em princípio, cancelada no sábado, 4/12, pelo prefeito Eduardo Paes. “Respeitamos a ciência”, explicou ele no twiter. Como há opiniões divergentes entre comitês científicos, “vamos sempre ficar com a mais restritiva”. Quase todas as capitais estaduais, de fato, devem cancelar seus réveillons. Mesmo o carnaval terá de ceder aos ditames da prudência. No Rio, sem certificado de vacinação, não se entra na Sapucaí, decidiu a Liesa, Liga Independente das Escolas de Samba. E ela avalia tornar obrigatório o uso de máscaras pelo público.

Já a Anvisa diz que, sem o passaporte de vacina, o Brasil pode virar “destino turístico antivacinal”. Sua diretora, Meiruze Freitas, acha que deve-se apliar a imunização de crianças. Tudo isso são novas maneiras de proteger a saúde de todos. A decisão do STF tem esse sentido: a segurança sanitária do país, como todos os países. A Alemanha, com bastante apoio popular, saiu na frente na Europa, como noticiou ontem Outra Saúde. Mesmo tendo boa imunização e, por enquanto, pouca preocupação com a ômicron.

Contra a qual, a testagem é um freio importante, avalia o infectologista Álvaro Furtado Costa, do Hospital das Clínicas da USP. O foco, em geral, é ampliar ao máximo a segurança, como disse Margareth Dalcolmo. O Brasil já tem um bom nível de vacinação: “Temos de 64% a 65% da população perfeitamente imunizada”, diz ela. Mas o vírus ainda circula muito, em vários locais do mundo, e novas ondas e variantes podem surgir. Chegar, então, em 80% da população imunizada até o fim do ano, nos daria um alívio.

Essa e outras medidas ampliam a proteção e garantem efeito vacinal duradouro. As doses de reforço, por exemplo, contornam a queda de proteção com o tempo, como assinala Renato Kfouri, diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações. Isso vale especialmente para os mais idosos, diz ele. O infectologista Igor Marinho, do Hospital das Clínicas de São Paulo, calcula que a defesa cai após seis meses. Isso indica possibilidade de reinfecção, que é preciso evitar.

O Brasil está bem preparado para fazer isso e muito mais, diz Margareth, mencionando que logo podemos ter autonomia na produção de vacinas. O país pode, além disso, participar de estudos sobre novos medicamentos e de sua futura produção. Desde o final de setembro, a Fiocruz foi autorizada pela OMS a fabricar vacinas de RNA mensageiro e a funcionar como centro para o desenvolvimento e produção de vacinas na América Latina.

Outro avanço recente responde, em princípio, à necessidade de dar um salto nos sequenciamentos genéticos. Conquistamos tecnologia com a inauguração, dia 6/12, do terceiro centro de sequenciamento de alto desempenho, no Instituto Nacional de Cardiologia, RJ. Desde o lançamento do programa Genomas Brasil, em 2020, outros dois centros foram instalados no Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo, e na Fiocruz. O equipamento no INC é dos mais potentes do mundo: pode sequenciar de 4 a 5 mil genomas humanos em um ano.

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