Bolsonaro: a Amazônia para fazendeiros — e os EUA…

Em entrevista, presidente falou em rever demarcações indígenas e… “explorar com Trump”. Leia também: Ciência perde 2/3 dos recursos; ataques químicos contra sem-terra; telemedicina favorece antibióticos – e muito mais

Foto: Felipe Werneck/Ibama
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OS PLANOS PARA A AMAZÔNIA

Durante a campanha eleitoral, Jair Bolsonaro prometeu que não iria demarcar mais nenhum centímetro de terras para indígenas. Ontem, em entrevista à Jovem Pan, foi mais longe: “A demarcação que eu puder rever, eu vou rever“, garantiu. E ainda lembrou: “Quando estive agora com Trump, conversei com ele que quero abrir para ele explorar a região amazônica em parceria. Como está, nós vamos perder a Amazônia, aquela área é vital para o mundo”. 

O presidente acha que existe uma “indústria da demarcação” de terras indígenas, e que isso “inviabiliza qualquer projeto na Amazônia”. Insinuou que as demarcações são definidas por “laudos suspeitos”, relatando que já ouviu queixas de fazendeiros sobre isso. Ele também reclamou  do tamanho da área destinada a indígenas no país. Quer que indígenas e quilombolas possam “vender ou explorar suas terras como quiserem”.

Em tempo: provavelmente a Terra vai levar 10 milhões de anos para se recuperar da destruição das mudanças climáticas provocadas por humanos. 

Enfim, Bolsonaro ainda disse que a Venezuela “não pode seguir como está”, mas ainda não sabe o que vai fazer se os EUA decidirem invadir. E falou também que o filho, Carlos, devia ganhar um ministério por ajudá-los nas redes sociais. “Ele não me atrapalhou em nada. Eu acho até que ele devia ter um cargo de ministro, ele que me botou aqui. Foi a mídia dele que me botou aqui”. 

O COLAPSO DA CIÊNCIA

A ciência brasileira está muito perto do fundo do poço depois que o governo Bolsonaro anunciou o contingenciamento de R$ 30 bilhões, no fim do mês passado. Como já dissemos aqui, no Ministério de Ciência, Tecnologia e Comunicações o resultado é um corte de 42% em um orçamento que já era baixo.

Dos R$ 5,1 bilhões orçados, o  MCTIC só está autorizado a gastar R$ 2,9 bilhões em  2019, o que é cerca de um terço do que tinha cinco anos atrás – e menos do que a NASA gasta em uma única missão a Marte. Na prática, o colapso no financiamento pode desmantelar um sistema de pesquisa e desenvolvimento que levou séculos para ser construído, diz a matéria no site do periódico Science. Se o congelamento se tornar permanente, “muitos laboratórios e instituições de pesquisa podem ser empurrados para a estagnação, incluindo instalações financiadas pelo governo federal que fornecem serviços cruciais, como monitoramento do clima e vigilância da saúde pública”.

Os problemas para a saúde também são lembrados na Deutsche Welle: os laboratórios, que precisam de manutenção, são os primeiros a sofrer drasticamente com os cortes. Ildeu Moreira, presidente da SBPC, nota que o país só foi pioneiro no estudo do zika, por exemplo, porque na época havia recursos para pesquisas. A reportagem diz ainda que os cortes prejudicam cooperações internacionais, e a Europa está de olho na situação.

Nos anos 2000 começaram a crescer os investimentos em ciência, que chegaram ao auge no governo Lula. O ano de 2010 foi o melhor, com um orçamento que, corrigido hoje, equivaleria a quase R$ 10 bilhões. Em 2013, continuava tudo bem. Mas, a partir de 2014, começou a crise que se estende até hoje.

Nature lembra que em 2017 o governo Temer tentou fazer um corte de 44% no orçamento do ministério, mas acabou restaurando parte do montante no fim do ano. E diz também que o CNPq já estava mal das pernas: “O Congresso reduziu o orçamento do CNPq para estudantes de graduação e pós-graduação, que financiam 80.000 prêmios, de 959 milhões de reais em 2018 para 785 milhões de reais em 2019. O CNPq também iniciou neste ano 300 milhões de reais em dívidas”. A DW aponta que metade dos 80 mil bolsistas da agência fazem iniciação científica, e recebem entre R$ 100 e R$ 400 reais por mês. Os valores do mestrado (R$ 1,5 mil) e doutorado (R$ 2,2 mil) não são reajustados desde 2013. 

Uma das principais consequências é a chamada ‘fuga de cérebros’. Pesquisadores ouvidos pelo site contam que alguns dos nomes mais proeminentes dos projetos estão deixando o país. E lamentam que, com Paulo Guedes propondo reduzir cada vez mais o tamanho do Estado, o que está ruim pode piorar: “No fundo do poço pode haver um alçapão”, diz o físico  Luiz Davidovich, presidente da Academia Brasileira de Ciências. 

ARMA QUÍMICA

Em março do ano passado, agricultores sem-terra acampados em Marabá (PA) foram surpreendidos por uma aeronave que, voando muito baixo, despejava glifosato. O acampamento é numa área revindicada por uma empresa do banqueiro Daniel Dantas. Os efeitos da intoxicação foram sentidos logo, alguns duram até hoje. O inquérito policial concluiu que não houve irregularidade na pulverização, mas, para os agricultores, não restam dúvidas de que foi um ‘ataque químico’. Um ano depois, a Agência Pública retoma a história – e conta que o caso não foi o único do tipo: “Desde 2013, três acampamentos de agricultores sem-terra foram atacados com pulverização aérea no sudeste do Pará, assim como a comunidade quilombola do Tiningu, município de Santarém, no oeste do estado – o que sugere uma estratégia deliberada dos fazendeiros da região na disputa pela terra”. 

GRAVES VIOLAÇÕES

No mesmo site, graves denúncias de violações em presídios do Ceará. Um relatório de peritos do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura aponta castigos físicos, celas insalubres, presos com doenças graves (tuberculose, hepatite e HIV) sem receber tratamento e impedido de receber visitas de familiares. “Há presos que ficaram mais de dois meses sem qualquer comunicação, incluindo acesso aos advogados. É muito grave porque, após dois meses, a possibilidade de verificar os fatos e identificar os autores vai ficando menor. Não pode haver um local de privação de liberdade com incomunicabilidade absoluta, isso traz uma suspeita inclusive para os bons funcionários porque não será possível coibir alguma prática irregular feita dentro dele”, explica Luis Gustavo Silva, um dos peritos.

SEM VER

Parece haver uma relação entre a telemedicina e a prescrição exagerada de antibióticos. Isso é o que sugere um estudo publicado ontem no Pediatrics. Foram analisados os dados de mais de 340 mil crianças de um plano de saúde, que entre 2015 e 2016 acessaram serviços de saúde com sintomas de doenças respiratórias. Crianças gripadas que se consultaram virtualmente tiveram mais prescrição de antibiótico do que aquelas que viram o médico pessoalmente. Os pesquisadores também descobriram que é mais comum, na telemedicina, o médico prescrever antibióticos para doenças virais, que não são afetadas por esse tipo medicamento.

MAIS PERTO

N’O Joio e o Trigo, João Peres fala do relatório da Anvisa com as contribuições da consulta pública sobre o novo modelo de rotulagem, em discussão no Brasil. O texto lembra a guerra que existe entre a indústria e pesquisadores que pensam direitos dos consumidores e alimentação adequada: estes últimos querem uma rotulagem com alertas, nos moldes do que fez o Chile. “O relatório mostra que a maior parte das pessoas rejeita a autorregulação, ou seja, a possibilidade de que as próprias empresas definam modelos de rotulagem e perfis de nutrientes. O fato de o documento enfatizar esse aspecto é relevante no sentido de fechar as portas a um acordo voluntário com as empresas, nos moldes do que foi feito com o açúcar”. Mas o documento não estabelece qual será o modelo de rotulagem, o que só vai ser feito em agosto. Em seguida, haverá nova consulta pública. 

OS 80 TIROS

Ontem falamos rapidamente sobre os militares do exército que abriram fogo contra um carro no Rio de Janeiro, com uma família dentro, e mataram o músico Evaldo Rosa dos Santos. A notícia divulgada ontem tinha imprecisões: o pedestre que passava na rua não morreu, mas está hospitalizado, e só havia uma criança no carro (o filho de Evaldo).  O Comando Militar do Leste prendeu dez dos 12 militares envolvidos no fuzilamento. 

SEMPRE AS ISENÇÕES

Somente em  2018, o Brasil deixou de arrecadar R$ 2,07 bilhões de reais com a comercialização de agrotóxicos. As desonerações cresceram 32% em relação ao ano anterior.

ATÉ ELE

O último relatório semestral do Banco Mundial pede que países da América Latina prestem mais atenção aos mais pobres, impulsionando planos de proteção social para atravessar as crises. Mas, ao mesmo tempo, coloca a necessidade de o governo brasileiro aprovar sua reforma na Previdência. 

Enquanto isso, Paulo Guedes propõe o fim da valorização real do salário mínimo. 

DE ONDE VEIO?

Há um surto de contaminação por E. Coli nos EUA que já se espalhou por cinco estados e atingiu mais de 70 pessoas. Mas as autoridades ainda não descobriram qual foi a fonte. 

16ª CNS

Estão abertas as inscrições para organizar atividades na 16ª Conferência Nacional de Saúde.

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