A Câmara em 2021: todos os PLs sobre aborto criam barreiras ao acesso

Principal nome contra a garantia desse direito é a deputada Chris Tonieto (PSL/RJ), que apresentou duas das sete proposições

Imagem: Edward Hopper
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Se o México descriminalizou o aborto há duas semanas e a Argentina o legalizou no fim do ano passado, o máximo que o Brasil tem conseguido fazer é evitar uma rápida corrida para trás. Quem nota o descompasso é o site Gênero e Número a partir de levantamento do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfmea). Até agora, em 2021 foram apresentados sete projetos de lei envolvendo o aborto na Câmara dos Deputados – e todos eles buscam impedir ou criar barreiras para a interrupção da gravidez, incluindo nos casos hoje autorizados pela legislação.

O número de projetos de lei sobre o tema diminuiu em relação a 2019 (quando foram 28) e 2020 (14), mas antes havia os que buscavam garantir ou ampliar esse direito. Agora, não mais. O principal nome da Câmara na cruzada contra o aborto é o da deputada Chris Tonieto (PSL/RJ), que este ano apresentou duas propostas. Uma é para a criação do Estatuto do Nascituro – que volta e meia aparece no Congresso – e outra é para proibir a orientação, prescrição ou realização do procedimento via telemedicina.

Para quem não está familiarizado com o assunto, pode parecer estranha a ideia de se realizar aborto “a distância”. Mas isso é possível porque, quando realizado no começo da gestação e bem orientado, o aborto induzido por medicamentos é bastante eficaz e seguro, podendo acontecer em casa. O recurso já era usado em países como os Estados Unidos antes da pandemia e, com a covid-19, se mostrou uma boa forma de garantir a continuidade do acesso. No Brasil, o Ministério Público Federal publicou uma nota em julho deste ano defendendo a prática nos caso de gravidez decorrente de estupro. O primeiro serviço legal de aborto por telemedicina aqui é o Núcleo de Atenção Integral a Vítimas de Agressão Sexual (Nuavidas) do Hospital das Clínicas de Uberlândia. Só em 2021, conseguiu evitar 90% das internações de aborto legal.

Mas voltando à incansável Chris Tonieto, ela também apresentou um Projeto de Decreto Legislativo com o objetivo de sustar resolução do Conselho Nacional de Saúde que destaca o aborto legal como direito. Sim, era aquela mesma resolução que o ministro da Saúde Marcelo Queiroga decidiu tornar sem efeito por pressão de bolsonaristas nas redes sociais. 

Segundo Joluza Batista, assessora técnica do Cfemea, o endurecimento dos projetos contra o aborto no Congresso tem sido muito visível nas duas últimas legislaturas e, principalmente, desde 2019. Claro que “essa alta movimentação é conectada com o governo Bolsonaro e sua pauta conservadora, o Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos e a agenda internacional.  Existe uma estratégica tática dos fundamentalistas em cima dos PLs, por isso, eles trabalham muito nessa pauta, buscando retrocesso dos direitos das mulheres”, diz ela. E essa a agenda não é apenas nacional, mas também local.

Vale ressaltar que o direito ao aborto no Brasil – ainda muito restrito – é recente. Embora esteja previsto no Código Penal desde 1940, ele só começou a se concretizar realmente em 1989, quando foi criado o primeiro serviço público destinado a isso. Os 25 anos seguintes viram relativo empenho do Estado em efetivar esse direito. Mas depois, houve uma estagnação, e agora um alargamento parece completamente fora do horizonte. 

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