Covid longa: entre a dificuldade para defini-la e a necessidade de ajudar quem sofre

Existe certo consenso de que a covid longa existe, mas não sobre o que ela é. Como caracterizar melhor os sintomas e entender se são todos causados pela covid-19?

Imagem: Dawid Markiewicz / The Atlantic
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Já falamos aqui na newsletter sobre como grupos organizados de pacientes com covid longa têm criticado a forma como cientistas veem sua condição, e como, desde o ano passado, precisaram se organizar e estudar por conta própria antes que seus sintomas duradouros começassem a ser levados a sério. Na New Yorker, o médico Dhruv Khullar escreve sobre seu contato com o maior desses grupos – o Survivor Corps –, e sobre questões delicadas relacionadas à própria definição do que é covid longa.

O Survivor Corps é um grupo de Facebook em que os participantes conversam sobre sintomas, desabafam e trocam dicas de tratamento – alguns cientificamente fundamentados, outros não. Sua criadora, Diana Berrent, se infectou em março de 2020 e foi uma das primeiras a alertar médicos sobre os sintomas que pacientes continuavam relatando depois de muito tempo. Hoje, ela se reúne regularmente com funcionários do governo e cientistas importantes e há pesquisas em vários países sobre os efeitos de longo prazo da covid-19.

Berrent e outros pacientes acreditam que essas pesquisas ainda são insuficientes para dar conta de toda a extensa gama de sintomas que aparecem nas discussões: problemas no fígado, nos pulmões, no estômago, na pele, nos dentes, no humor. De acordo com eles, o trabalho científico deve partir dos dados já coletados por grupos como o Survivor Corps, com base nos que os pacientes estão relatando há meses. Embora essa demanda faça sentido, avalia Khullar, ela deixa de lado as preocupações dos cientistas em distinguir o que é ou não apoiado por evidências.

Existe certo consenso de que a covid longa existe, mas não sobre o que ela é. Alguns médicos sugerem que certos sintomas poderiam ser psicossomáticos ou causados por outras doenças não relacionadas à covid-19, e ambas são hipóteses possíveis, mas ainda não se sabe ao certo. Como o número de infectados pelo coronavírus é muito, muito grande, aumenta a chance de eles compartilharem também outros agravos que podem ter sintomas em comum. Além disso, alguns tratamentos contra a covid-19 usados para outras doenças podem gerar problemas duradouros – é o caso do uso de ventiladores, que está associado a fraqueza prolongada, perda de memória, ansiedade e depressão. 

Em entrevista a Khullar, o médico Vinay Prasad, especialista em medicina baseada em evidências da Universidade da Califórnia, diz que para definir direito a covid longa seria preciso caracterizar melhor seus sintomas e pesquisar se eles estão sendo causados pelo vírus ou por outra coisa. As pesquisas mais relevantes feitas até agora têm limitações nesse segundo ponto, pois não comparam a prevalência de sintomas entre quem teve covid-19 e quem não teve.

Mas Prasad diz também que, no fim das contas, o que interessa é reconhecer o sofrimento das pessoas, qualquer que seja a sua causa: “Quando alguém sente algo em seu corpo, isso é real – esteja ou não relacionado à covid-19. As pessoas gastam muita energia mental perguntando se algo é covid longa ou não. Mas, em última análise, a profissão médica é sobre compaixão. Do ponto de vista médico, se os pacientes estão sofrendo, precisamos descobrir como ajudá-los”.

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