Dançando pelo fim da violência

SP e Recife engrossam manifestação global que propõe: “Um bilhão de mulheres violadas é atrocidade. Um bilhão dançando é revolução”

130608-OneBillion

.

Por Suzana Lourenço*

“Uma em cada três mulheres do planeta será espancada ou estuprada no decorrer da vida.” Essa é a afirmação que inspirou o nome do evento global “Um bilhão que se ergue” (One billion rising), que acontece em São Paulo e no Recife no próximo dia 16. “Um bilhão de mulheres violadas é uma atrocidade. Um bilhão de mulheres dançando é uma revolução”, diz no Facebook a chamada do evento, que acontece em diversas capitais do planeta.

A ideia é reunir mulheres e homens para dançar, numa coreografia coletiva, pelo fim da violência contra mulheres e meninas. “One billion rising” (veja no YouTube) congrega cerca de 5.000 organizações, ONGs e universidades em todo o mundo. O movimento tem sua origem na peça “Monólogos da Vagina”, escrita pela dramaturga e ativista Eve Ensler com base em entrevistas sobre a sexualidade feminina e o estigma social em torno do estupro e do abuso.

A peça fez sucesso em diversos países – no Brasil, teve direção de Miguel Falabella e ficou em cartaz por mais de uma década. Ao final de cada apresentação, Ensler encontrava mais mulheres que queriam compartilhar suas histórias de sobrevivência, transformando o espetáculo em mais do que uma manifestação artística sobre a violência feminina. Em 14 de fevereiro – o Valentine’s Day, dia dos namorados norte-americano – de 1998, Eve e um grupo de mulheres de Nova York criaram o V-Day, para demandar o fim da violência contra mulheres. Nascia aí a ideia do “One billion rising”.

No Brasil: Quatro entre cada dez mulheres brasileiras já foram vítimas de violência doméstica, revelam os números do Anuário das Mulheres Brasileiras 2011, divulgado pela Secretaria de Políticas para as Mulheres e pelo Dieese. Entre 1998 e 2008, cerca de 42 mil mulheres foram assassinadas – dez a cada dia –, 40% delas dentro de casa, conforme dados de outro estudo, o Mapa da Violência 2011, realizado pelo Instituto Sangari a partir de informações do DATASUS/Ministério da Saúde.

Movimentos de mulheres vinham denunciando essa situação desde os anos 1970, e deram os primeiros passos na formação de coletivos de apoio às vítima da violência. Foram criadas as primeiras Delegacias da Mulher. Mas foi só a partir dos anos 2000 que a questão ganhou a esfera nacional, com a criação, em 2003, da Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM).

Um marco no enfrentamento da violência de gênero no Brasil foi a lei 11.340, de agosto de 2006 – conhecida como Lei Maria da Penha, em homenagem a Maria da Penha Fernandes, que foi atingida por um tiro do marido enquanto dormia, ficou paraplégica e sofreu tortura, mas veio a público e conseguiu levar seu caso a cortes internacionais.

Desde a sua criação pela SPM, em 2005, até março de 2012, a Central de Atendimento à Mulher – Ligue 180, com funcionamento 24 horas, inclusive fins de semana e feriados – realizou 2.527.493 atendimentos. De 2006 a março de 2012 foram registrados 603.906 relatos de violência, assim tipificados segundo a Lei Maria da Penha: física 182.857 (30%, vai de lesão corporal leve ao assassinato), psicológica 76.620 (12,8%), moral 32.168 (5,4%), sexual 5.899 (1%) e patrimonial 4.920 (0,8%).

A violência parte frequentemente do marido ou companheiro. No mesmo período, das 131.047 informações sobre o tempo de convivência entre vítima e agressor, o relacionamento era de dez anos ou mais em quase 40% dos casos; e entre cinco e dez anos em cerca de 20%. A frequência das agressões foi registrada em 228.180 atendimentos, sendo diária em aproximadamente 60% e semanal em cerca de 20%. Foram presenciadas por filhos e filhas em mais de 65% dos casos; em quase 20%, eles foram agredidos junto com as mães.

Manifestação: A manifestação acontece em São Paulo das 14 às 18 horas do sábado, 16 de fevereiro, no vão do MASP (Museu de Arte de São Paulo). As danças e coreografias serão ensaiadas a partir das 12 horas, pelos participantes concentrados no museu. No Recife, a dança-protesto ocorrerá na Praça do Marco Zero, às 19 horas.

Na página do Facebook Um bilhão que se ergue em SP encontram-se os vídeos da coreografia em SP e da coreografia original. No site oficial da campanha podem ser assistidos videos da autora Eve Ensler e da atriz e militante Jane Fonda dizendo porque se levantaram contra a violência. Aqui, o ator e diretor Robert Redford dá seu depoimento sobre o tema.

Suzana Lourenço é pós-graduanda em Integração da Améria Latina pela USP. Estuda temas relacionados a política ambiental e participação da sociedade civil em processos decisórios.

Leia Também:

3 comentários para "Dançando pelo fim da violência"

  1. marcio ramos disse:

    … pode parecer que o foco do movimento não esta legal, a primeira vista pode ser, eu tenho esta impressão com muitos “movimentos” e quando acompanho por um tempo percebo que estes “movimentos” são fundamentais para que outros aconteçam e medidas sejam tomadas, o tema discutido, as ideias aprofundadas, acompanhe e verá.
    … é muita mulher sendo massacrada, a violência, a crueldade tem que acabar e a violência que eu falo é aquela extrema porque as pequenas violências do dia a dia é demasiado humano e nunca deixarão de existir, mas a guerra, a tortura, a fome, o assassinato, a crueldade, a morte por falta de medicamento existente, por falta de comida, moradia, conhecimento tem que acabar, não pode ser admissível em hipótese alguma uma instituição religiosa dizendo que não pode usar camisinha, um governo corrupto que não atende seu povo, uma empresa negando medicamento, e a industria bélica enterrando inocentes todo dia.
    No Brasil tem muita violência contra a mulher quase sempre dos homens da família primeiramente e depois de toda sociedade ou seja para muitas meninas so sobrou ser puta devido a traumas que sofreram desde criança e que trabalham para viver mesmo nas piores condições e sem garantias.
    Tem muita mulher também que deixa de se relacionar devido a violência domestica ou que tem toda a vida afetiva, sexual, etc comprometida devido a traumas causados por homens violentos dentro e fora do casamento. Não esquecer que os filhos, homens, estão ali ao lado e sofrem também com isso, como vitimas e, ou futuros algozes, é um problema de toda a sociedade mas a dor pega mesmo é na mulher pois e ela que é estrupada, toma porrada, sente na pele e na alma toda dor e humilhação.
    Acho que todos devem apoiar e participar destes movimentos e também se movimentarem pelas causas das mulheres e aqueles que agem com violência devem ser punidos com rigor.

  2. sei que hoje em Salvador ninguem vai ler. Mas vou postar e depois repercuto.

  3. Pedro Simpson disse:

    Acho que o foco do movimento não está legal. E, portanto, corre o perigo de não chegar lá. Lá onde? Explico: nem um bilhão se reerguendo, nem (apenas) m
    ulheres violadas é atrocidade, nem mulheres dançando é solução. Isto cheira a Lei Maria da Penha. Mulher não deve ser violada, nem homem, nem criança, nem velho, nem…Mulher não deve viver dançando, nem homem, nem….Os hábitos é que têm de ser mudados. Acho. O consumismo é algo estranho e pernicioso por trazer oculto subliminarmente em si alegrias vazias e violências camufladas. Há que se descobrir plano de ação aceitável pela humanidade que mostre que ter alguns princípios intocáveis é algo exponencialmente bom. Nosso país tem muitas coisas boas, mas devemos fugir dos dois extremos. Um deles já alertado: acabar com o complexo de vira latas. O outro, achar que nosso jeito de ser, muito riso, muita alegria, muita festa, é a panacéia para os problemas do mundo. Menos, Brasil!

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *