Onde FHC ganha de Lula‏

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Os números de uma “comparação” que circula entre acadêmicos podem levar a imensas confusões por parte de quem recebe a informação.

Vamos ver um exemplo, bastante simples. Seu filho, ou sobrinha, ou seja lá quem for da família, pede, encarecidamente, que vocês tenham um bichinho de estimação. Coincidentemente, o vizinho também resolveu ter um bichinho de estimação, e, tanto para vocês quanto para eles, o orçamento não permite algo que vá dar muitos gastos no mês. Com isto em mente, você vai a uma loja e volta … com um cavalo. Havia um camundongo, que encantou a criança, mas, como o bom vendedor deixou claro, o gasto com a alimentação seria muito elevado. Melhor o cavalo, pois vocês irão gastar menos, como o bom vendedor explicou.

Por outro lado, seu vizinho voltou com um camundongo, a gosto de todos da casa. Discretamente, você deu uma risadinha, pois o tolo não havia sido capaz de ver o que, claramente, os dados mostravam.

Apesar de que, a cada final de mês, o cavalo pesa muito no seu orçamento, você continua achando que o bom vendedor tinha razão. Afinal, ele havia comprovado isso com os dados. Seu vizinho, com o camundongo, parece não ter problemas de orçamento, mas, vai ver que é só impressão sua. Ele deve, de fato, estar nadando em dívidas para conseguir manter o camundongo sem pedigree.

Como foi a façanha que o vendedor fez? Ele mentiu? Ele falseou dados?

Não, ele não mentiu. Não, ele não falseou dados. A façanha foi na apresentação que ele fez para você. Ele explicou que o cavalo pode parecer comer mais, mas, de fato, cada 1 grama de cavalo consome umas 9 calorias por dia. Contudo, o maldito camundongo, que parece comer muito menos, consome, por cada grama, 246 calorias por dia, umas 27 vezes mais que o cavalo, como ilustra o gráfico abaixo, gentilmente apresentado pelo bom vendedor:

Assim, o bom vendedor provou, a você, que sua família iria gastar muito mais para manter um camundongo em casa do que para manter um cavalo. Ou melhor, o que ele disse é que sua família gastaria mais para manter um grama de camundongo do que para manter um grama de cavalo. E, isto, é verdade. Contudo, quando ele te vendeu o bicho, ele te vendeu todos os 500.000 gramas de cavalo. Seu vizinho, levou todos os 25 gramas de camundongo. Agora, no final de cada mês, sua família arca com um gasto 700 vezes maior que o seu vizinho, em termos de compra de alimento para os animais. E, isto, também é verdade.

A façanha do vendedor se deve a três pontos básicos:

  1. à forma de análise/apresentação dos dados;
  2. à crença difundida na sociedade de que “dados não mentem”;
  3. ao fato de que o vendedor, muito bom, conta com que você e outros não irão, de fato, verificar como ele fez as contas que apresenta.

O que todo cientista mediano deve saber é que quando os dados coletados não se referem, diretamente, a taxas ou a porcentagens, a apresentação destes dados na forma de taxas e/ou porcentagens precisa ser muito bem explicada.

Em outras palavras, se quem apresenta os dados não explicar o “como fez as contas”, o resultado apresentado se torna extremamente capcioso para a interpretação.

Por exemplo, responda rápido: se uma certa espécie de peixe tem a freqüência cardíaca com uma sensibilidade térmica de 4 entre 5 oC e 15 oC, e uma sensibilidade térmica de 2 entre 15 oC e 25 oC, a freqüência cardíaca desta espécie é maior a 14 oC ou a 21 oC ?

Recentemente, fui alertado quanto a uma página da rede

http://pt-br.governobrasil.wikia.com/wiki/Governo_Brasil_Wiki

na qual se apresentam inúmeros gráficos comparativos de desempenho entre dois governos. Por incrível que pareça, dos 24 itens ilustrados, 20 são fortemente favoráveis a um dos governos. Digo “por incrível que pareça” pois há inúmeros destes dados que contrastam com o que o senso comum de percepção do nosso entorno e nosso cotidiano indicam. Outros, contrastam fortemente com o que dados brutos que temos, mostram. Por exemplo, o gráfico abaixo ilustra o que é apresentado como “crescimento anual de matrículas em universidades federais”. Contraste, agora, esta figura com a que está mais abaixo, referente ao número de professores contratados nas universidades federais (dados brutos obtidos das mesmas fontes citadas na referida página de rede).

Então, me pergunto: que façanha é essa ? A resposta já está dada pelo nosso bom vendedor. As comparações estão sendo feitas, a sua grande maioria, através de taxas percentuais (ou seja, uma mistura de passagem dos dados originais para taxas e, em seguida, para frações). Como vimos, estes procedimentos podem levar a imensas confusões por parte de quem recebe a informação. Portanto, não são os “dados” que estão, de fato, sendo apresentados. São transformações destes dados, não claramente indicadas, e obscuras em seu procedimento de cálculo.

Se você notar, então, verá que a aparente “profunda análise” apresentada se pauta nos mesmos três pontos do nosso bom vendedor:

  1. forma de análise/apresentação dos dados;
  2. crença difundida na sociedade de que “dados não mentem”;
  3. o fato de que o administrador conta com que você e outros não irão, de fato, verificar como ele fez as contas que apresenta.

Assim, meus caros, recomendo uma atitude científica na apreciação de dados. Recomendo que taxas e porcentagens em dados que não são, originalmente, obtidos nestes formatos, sejam vistas com ressalvas e cuidados. Caso contrário, é capaz de você colocar um cavalo na sua sala pelos próximos 4 anos, achando que está no lucro.

José Guilherme Chaui-Berlinck

Professor do Departamento de Fisiologia

IB – USP

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7 comentários para "Onde FHC ganha de Lula‏"

  1. Mario Vieira da Silva disse:

    Eu recuso a tal de boa pascoa.

  2. Mario Vieira da Silva disse:

    Há tempos li um livro de contos do Leo Szilard, um dos cientistas que participou do principio da nossa historia atomica, chamado “Voice of the Dolphins”. Em uma das histórias um personagem diz que a diferença entre um cientista e um politico é que quando um cientista diz algo os outros examinam a declaração para testar se é verdadeira ou falsa. Quando um politico diz algo os outros dizem: porque será que ele disse aquilo?” Alguns leitores fazem comentários de politicos (não comentários politicos) sobre a matéria em questão dizendo: “Ah ele disse isto porque é tucano”, sem demonstrar se a materia continha bom senso ou não. É uma pena que nosso anafalbetismo politico tenha a tendência a se estender por muito tempo.

  3. bob lahton disse:

    Coitado desses tucanos, O FHC está mais vendido que as ações do banco Panamericano, já que ele gosta de Bancos quebrados, e que o diga o Banqueiro Magalhães Pinto, sogro do seu filho na época da quebradeira, aí criou se o proer e tudo bem, gastaram 40 bi para salvar o Nacional e venderam depois por 5 bi ao Pedro Moreira Salles.
    Mais 40 para o Banespa para depois venderem por 7….. agora vem esse idiota do Berlinck juntamente com o Ameni para defender esses vendilhões da pátria….. FHC, Serra, Alckimim, Kassab, Afif Domingos, Aloysio Nunes, o Quercia estava morto, mas o Romeu Touma ainda estava vivo, aí anunciaram a morte dele 2 semanas antes do ocorrido, e disseram que foi um engano por parte do jornalista. A turma do PIG só se enganam quando é a favor dessa gente ruim da qual eu estou me referindo. Mesmo assim uma boa Pascoa a todos…..

  4. manoel disse:

    Que artigo tipicamente paulistucano! Fala, fala, com retorica e suposta erudicao, para nao dizer absolutamente nada. Em outras palavras, quem estah manipulando quem (ou o que), cara palida?

  5. Rafael disse:

    Acrescentando ao sensato comentário do usuário “voto nulo”, ressalto que o Governo Brasil Wiki (e o Blog Governo Brasil, onde são publicadas as atualizações) fornece links para as fontes originais dos dados e encoraja o leitor a verificá-los por conta própria.
    Além disso, valores absolutos são informados no texto, ao lado da variação percentual.
    No caso específico do número de matrículas em ensino superior, o governo FHC de fato leva vantagem com qualquer das duas abordagens: valores absolutos e variações percentuais. Dessa forma, é um equívoco (ou resultado de má-fé) atribuir à apresentação dos dados uma suposta vantagem indevida.

  6. voto nulo disse:

    O problema é que porcentagens não são “inúteis” ou só um truque para maquiar a verdade. Podem ser usadas como tal, mas não é o caso nessas comparações. Aqui a comparação em absolutos é que acaba sendo traiçoeira.
    Pode ser errado meio como comparar o desempenho de professores de diferentes anos letivos, avaliando o conhecimento que os mesmos alunos tiveram ao passar pelos dois. É praticamente necessariamente verdade que um aluno da oitava série vai saber mais do que ele mesmo sabia na quarta. Isso não significa que os professores que lhes deram aula da quinta à oitava eram tremendamente melhores que os que deram aula até a quinta série, mas é nessa falácia que consiste a maior parte das comparações triunfalistas dos petistas.

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