Suicídios: na pandemia, os vulneráveis tornam-se suscetíveis

Índice de mortes autoinfligidas caiu no país, mas aumentou no Norte e Nordeste – principalmente entre mulheres e idosos. Pesquisadores da Fiocruz destacam: é possível prevenir o fenômeno, examinando seus fatores sociais

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Para entender os impactos da pandemia de forma mais ampla – e tendo em vista que muito tem se falado sobre seus efeitos na saúde mental – dois pesquisadores da Fiocruz investigaram como se comportaram as taxas de suicídio no Brasil, ao longo da crise sanitária. Os resultados apontam para um aumento especialmente entre grupos vulneráveis, nas regiões Norte e Nordeste, durante a primeira onda da covid. O estudo, comentam os pesquisadores, também serviu para avaliar padrões dentro do território, considerando diferentes faixas etárias, sexo e regiões com realidades socioeconômicas distintas. O trabalho foi aceito para publicação no International Journal of Social Psychiatry, tradicional periódico que abrange pesquisas no campo da psiquiatria social.

Enquanto, em um plano geral, os números dos que retiraram a própria vida caíram 13% entre março e dezembro de 2020, houve aumento de 26% desta causa de morte entre os homens a partir dos 60 anos da região Norte; um “aumento expressivo” do suicídio entre mulheres de 30 a 59 anos, também na mesma região, ao lingo de dois bimestres consecutivos. O fenômeno também foi observado entre as mulheres a partir de 60 anos, no Nordeste, com um “excesso” de mortes de 40%.

Os suicídios são, em todo o mundo, causa destacada de morte prematura. Por isso, “é fundamental conhecer a sua magnitude, distribuição e possíveis razões, visando a sua prevenção”, explica Jesem Orellana, pesquisadora da Fiocruz Amazônia e uma das autoras do estudo. Ela acrescenta que a ocorrência pode variar amplamente, dependendo da dinâmica social, econômica, sanitária e de coesão social, especialmente em períodos de forte instabilidade, como em uma pandemia. “Elevadas taxas de suicídios têm sido associadas a fatores biológicos como sexo ou idade, bem como a fatores sociais e transtornos mentais, especialmente ansiedade e depressão”, cita.

O trabalho, explica Maximiliano Ponte, pesquisador da Fiocruz Ceará e também autor do estudo, evidencia a importância de tratar o suicídio para além do problema de saúde individual. “Trata-se de uma questão com profunda relação com as desigualdades econômicas e de acessos aos serviços sociais e de saúde pública”, diz ele. E isso ficou evidenciado na medida em que os idosos das regiões Norte e Nordeste foram os mais vulneráveis ao excesso de suicídios, afirma. No caso dos idosos, o psiquiatra explica que ocorre um duplo fator de risco, que é a maior ocorrência deste tipo de morte e também maiores riscos de mortalidade pelo vírus, e que esses fardos “se retroalimentam”.

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