Por que é difícil comparar vacinas

Diferenças nos protocolos de pesquisa afetam resultados: número de voluntários, perfil do público-alvo e até definição de casos de covid-19 variam conforme o estudo

.

Este texto faz parte da nossa newsletter do dia 13 de janeiro. Leia a edição inteira.
Para receber a news toda manhã em seu e-mail, de graça, clique aqui.

A taxa apresentada pela CoronaVac é a menor entre as vacinas que já tiveram resultados divulgados até agora. Está bem abaixo dos 95% da Pfizer/BioNTech e da Moderna e dos 70% da vacina de Oxford/AstraZeneca. Além disso, difere bastante de outros resultados que a própria CoronaVac atingiu em ensaios de outros países: a Turquia chegou a relatar mais de 90% de eficácia, e, na Indonésia, ela foi de 65%. Em relação a esse último ponto, a explicação é que há diferenças em cada ensaio (como o público-alvo selecionado, por exemplo) e, sobretudo, no número de infecções usados para fazer o cálculo. Na Indonésia foram analisados os dados de apenas 25 voluntários infectados; na Turquia, 29. Em ambos os casos, muito menos que os 252 avaliados no Brasil – e a questão é que a conta vai ficando mais precisa quanto maior é esse total. 

A comparação com outras vacinas é um pouco complicada. Nesse caso, a diferença principal está obviamente no imunizante testado, o que com certeza explica em parte as eficácias distintas. Mas a equipe do Butantan acredita que as especificidades de cada protocolo também têm um papel nisso. De acordo com eles, o ensaio da CoronaVac no Brasil usou uma definição de caso mais abrangente: foram feitos exames PCR em todos os voluntários que relataram um ou mais sintomas (como diarreia, tosse, vômito) por dois dias seguidos. Para comparação, no caso da Pfizer os mesmos sintomas foram incluídos, mas o período deveria ser de quatro dias.

Essa explicação não é consensual. No Science Media Centre, alguns pesquisadores estrangeiros criticam a definição de caso adotada pelo estudo brasileiro como não sendo clara. Um deles,  Paul Hunter, professor de medicina da University of East Anglia, disse que os números principais de eficácia para as três vacinas atualmente registradas no Reino Unido foram baseados em infecções com qualquer sintoma; portanto, provavelmente também incluem as categorias adotadas no estudo da CoronaVac, como a de caso “muito leve”.  

Outro ponto é que o ensaio brasileiro com a CoronaVac só recrutou profissionais de saúde, então há também uma hipótese de que talvez eles estejam mais propensos a identificar e relatar qualquer mínimo sintoma, o que ajudaria a jogar para cima o número de infeções muito leves e, consequentemente, achataria a eficácia geral. Não dá para bater o martelo em relação a nada disso, mas Palacios disse acreditar que, na vida real, o resultado pode ser melhor.

De todo modo, há certa unanimidade na avaliação de que comparar vacinas diferentes é difícil.  “Os protocolos definem as eficácias, que são calculadas contra um certo desfecho, definido por um conjunto de sintomas. Todas estas definições podem variar de um protocolo para o outro, e aí as eficácias não podem ser comparadas diretamente”, resume, n’O Globo, Maria Amélia Veras, professora da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.

Leia Também: