O quebra-cabeça para a distribuição de vacinas

Brasil prevê ter doses suficientes para menos de metade da população até julho do ano que vem

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O acordo anunciado ontem por Eduardo Pazuello – e cancelado hoje de manhã por Jair Bolsonaro – permitiria que a CoronaVac fosse incluída no programa nacional de vacinação, ficando disponível a outros estados que não São Paulo. Não aumentaria, porém, o número total de doses já garantidas pelo Brasil. Somando as 46 milhões da CoronaVac, as 100 milhões da vacina de Oxford/AstraZeneca e as 40 milhões do consórcio internacional Covax Facility (há nove candidatas em testes e não se sabe quais serão disponibilizadas), a previsão seria ter tenha 186 milhões de doses até o meio do ano que vem. Isso se os testes clínicos de fase 3 mostrarem bons resultados, é claro. Se consideramos uma vacinação em duas doses por pessoas, daria para imunizar pouco menos de metade da população: 93 milhões de brasileiros, no melhor dos cenários.

O planejamento do Ministério da Saúde para definir e atingir grupos prioritários ainda não está pronto, mas o G1 fez um compilado do que se sabe até agora. A pasta já divulgou que profissionais de saúde e integrantes de risco devem ser vacinados primeiro, embora não haja informações detalhadas sobre quais os perfis desses grupos e qual seria o cronograma de vacinação deles ao longo do ano. Em todos os casos, será preciso apresentar o CPF para tomar a vacina, para evitar desperdícios e facilitar o monitoramento dos efeitos adversos. Por aqui, imaginamos que deve ser importante também para garantir que as pessoas tomem as duas doses da mesma vacina, e não de laboratórios distintos. Mas a adoção do CPF não é um ponto defendido unanimemente. “Essa decisão não leva em conta os ‘invisíveis’ da população brasileira, cuja existência e dimensionamento foram tornados muito mais nítidos no curso da pandemia. (…) Os números são imprecisos e há estimativas de milhões de pessoas nessa condição”, nota o posicionamento da Abrasco sobre as vacinas, divulgado ontem.

A discussão sobre a obrigatoriedade continua a toda e pode mesmo se tornar mais um caso levado à Justiça durante a pandemia. Mas o fato é que, ao menos em um futuro próximo, não vai haver vacinas para todos. N’O Globo, o ex-secretário de Vigilância em Saúde Wandreson Oliveira chama a atenção para este detalhe que também temos tentado frisar por aqui: “Quando falo de obrigatoriedade, eu teria que ter a garantia de que todos estariam tendo acesso àquele imunobiológico. Fora disso, me parece prematuro esse debate sem sequer os governos terem apresentado uma estratégia para vacinação e sem definir quais serão os grupos prioritários”. Para ele, o mais importante não é definir obrigações, mas investir em campanhas para conscientizar as pessoas do papel da vacinação individual na proteção coletiva.

Os níveis de aceitação

Nature publicou ontem um estudo sobre a potencial aceitação de vacinas contra covid-19 feito a partir de entrevistas com 13,4 mil pessoas em 19 países. Em média, apenas 71% dos entrevistados tomariam com certeza um imunizante comprovadamente seguro e eficaz – o que está abaixo da cobertura de 95% que normalmente é considerada necessária para controlar outras doenças.

É interessante notar que, em todos os países, as pessoas relataram que teriam menos chances de topar a vacina caso ela fosse exigida em seus ambientes de trabalho; isso era percebido como uma limitação da liberdade de escolha e uma imposição forçada dos interesses dos empregadores.

No Brasil, a aceitação ficou em torno de 85%, um percentual que está entre os mais altos. Outros países com mais de 80% de aceitação estão predominantemente na Ásia. México e Estados Unidos tiveram taxas de cerca de 75%, enquanto Canadá e países europeus tiveram as maiores hesitações: menos de 60% das pessoas nesses países disseram que tomariam uma vacina contra o novo coronavírus.

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