O desinvestimento em pesquisa de doenças tropicais no Brasil
• Brasil deixa de pesquisar doenças tropicais • Evento internacional de enfermagem • A greve dos enfermeiros no Reino Unido • Na Alemanha, profissionais de saúde também querem parar • Ultraprocessados e câncer • Enteados tem direito a plano de saúde? •
Publicado 20/03/2023 às 11:07
Como já mostrou o Outra Saúde, há um fenômeno global de negligência em relação a doenças tropicais, diretamente relacionado com o poderio econômico e o investimento científico dos países afetados e não afetados por tais condições. Refém de anos de austeridade fiscal e destruição da pesquisa científica, o Brasil não poderia ter ficado de fora dos retrocessos em políticas de redução dessas doenças. E isso está demonstrado em pesquisa coordenada por Gabriela Melo, doutoranda em Ciências e Tecnologias em Saúde da UnB, que trata sobre o recuo dos financiamentos públicos relativos a doenças tropicais entre 2004 e 2020. A explicação de Gabriela à Folha evidencia o caráter transversal da questão. “Essas doenças continuam afetando a população, especialmente as pessoas que vivem em situações vulneráveis, como por exemplo, acesso inadequado a saneamento básico, saúde, educação etc”. O Fórum Social Brasileiro de Enfrentamento das Doenças Infecciosas e Negligenciadas entregou carta à hoje ministra da Saúde Nísia Trindade e diversas autoridades, em evento do ano passado, com uma série de ações sugeridas a respeito do tema.
Evento debate necessidades da enfermagem
Foi realizado nesta semana, no Rio de Janeiro, o Fórum de Regulação da Prática de Enfermagem na Região das Américas, que reuniu profissionais e entidades do setor de 14 países. Nos dois dias de duração, foram debatidas questões como regulação da profissão e necessidades técnicas e materiais, nos distintos contextos dos países representados. “A fraca regulação do ensino de Enfermagem exercida pelo poder público no país é um dos principais problemas que impactam negativamente a profissão, principalmente com o advento do ensino a distância”, afirmou Manoel Neri, presidente do Conselho Regional de Enfermagem de Rondônia (Coren-RO), ao analisar o cenário brasileiro. O encontro contou ainda com a participação da OPAS, do ministério da Saúde e da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo.
Incertezas continuam em greve da saúde inglesa
As lutas sociais e trabalhistas seguem a esquentar o inverno inglês. No caso do National Health System (NHS), o movimento de greve, capitaneado pela enfermagem e paramédicos, parece mais perto de obter um reajuste salarial, num contexto onde a inflação atinge 10% e a precarização do sistema público de saúde gera forte estresse tanto entre servidores como usuários. No entanto, a onda de greves abarca diversas categorias do serviço público e, como se pode acompanhar nesta página do jornal Guardian, as negociações não param. Além disso, o governo de Rishi Sunak ainda não esclareceu as fontes de financiamento do reajuste oferecido, enquanto sindicatos de outras áreas, como de educação, seguem na mesa de conversas. A proposta é de aumentar 8,2% neste ano e mais 5% no próximo, o que provavelmente não superaria a inflação do período. Caso rejeitada, há ameaça de greve no NHS, o que poderia fazer o governo lançar mão dos médicos juniores na prestação do serviço.
Saúde pode parar na Alemanha
Não é só na Inglaterra que os trabalhadores da saúde estão insatisfeitos. No país mais poderoso da União Europeia a situação não é diferente. Depois de um aviso de greve realizado em 9 de fevereiro, ao lado de trabalhadores de vários setores, funcionários de hospitais, enfermagem, serviços psiquiátricos e de emergência de vários estados da federação alemã se mantiveram em estado de greve por dois dias nesta semana. Eles alegam que os salários perderam valor real nos últimos três anos e, através da Ver.di, entidade sindical que os representa, pedem reajuste de 10,5%, ante inflação de 8%. As categorias mobilizadas também reclamam da postura patronal, que em alguns casos sugeriu até renúncia ao salário em caso de má situação financeira do empregador. “O estado do sistema de saúde alemão é alarmante: mais da metade das clínicas teme limitar o atendimento ao paciente devido à falta de condição financeira”, publicou o Die Linke, partido da esquerda alemã, em nota oficial. Foram duas rodadas de negociações até aqui. As próximas conversas entre representantes das empresas de saúde, trabalhadores e governo estão marcadas para 27 de março e, no caso específico dos médicos, 4 de abril.
Ultraprocessados e câncer: relação cada vez mais evidente
Estudo coordenado por pesquisadores do Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde e do Departamento de Medicina Preventiva da FMUSP (Faculdade de Medicina da USP) analisou a alimentação de 521 mil pessoas de dez diferentes países por uma década e concluiu que aquelas que consumiam uma proporção maior de alimentos ultraprocessados desenvolveram mais tipos de câncer. O estudo dividiu as pessoas em quatro grupos, de acordo com o nível de presença de ultraprocessados em sua dieta, e constatou 25 tipos diferentes de neoplasia. Por outro lado, também foi notado pela pesquisa que uma inversão de pelo menos 10% de alimentação de ultraprocessados para produtos in natura já é capaz de reduzir as possibilidades da doença. De fora da pesquisa, o Brasil recebe o alerta, uma vez que a presença de ultraprocessados na alimentação cotidiana tem aumentado. Avanço da obesidade na população é outra das consequências já verificáveis atualmente.
Comissão aprova inclusão de enteados em planos de saúde
Na quarta-feira, 15/3, a Comissão de Assuntos Especiais do Senado aprovou um projeto de lei que propõe a inclusão de enteados e pessoas sob alguma forma de tutela em planos de saúde privados, desde que demonstrada sua dependência econômica. A ideia é equiparar tais pessoas à condição de filhos e garantir seus direitos de acessar serviços de saúde contratados pela família. Agora, o projeto passa pela avaliação da Câmara dos Deputados e precisa ser votado nas duas casas antes de sua eventual sanção pelo presidente Lula. A ANS já prevê em seus regulamentos a inclusão de parentes sanguíneos ou de afinidade, mas deixava a critério das operadoras a aceitação de enteados e crianças ou adolescentes sob tutela.