Enrolação de Pazuello no Senado aumenta pressão por CPI

Abertura da comissão parlamentar já tem assinaturas suficientes, mas depende do aval de Rodrigo Pacheco

Eduardo Pazuello, usando sua máscara de cabeça para baixo, durante audiência com senadores. Foto: Pedro França / Agência Senado
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Comentamos na última edição que os senadores iam decidir, a partir de uma audiência com o ministro da Saúde Eduardo Pazuello, se abrem ou não uma CPI para investigar a atuação do governo federal durante a pandemia. A reunião aconteceu ontem, estendendo-se por cinco horas. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), disse depois que ia conversar com os líderes da Casa para avaliar se as respostas foram “suficientes”. Segundo a Coluna do Estadãoaté governistas ficaram surpresos (negativamente) com a performance do ministro. A oposição já tem assinaturas suficientes para o início da comissão parlamentar, e cabe a Pacheco dar o sinal verde. Sabe-se lá o que vai ser decidido, mas definitivamente não dá para dizer que a audiência tenha sido muito informativa.

Sob pressão, o general disparou informações que simplesmente não têm lastro no mundo real. Disse, por exemplo, que toda a população brasileira “vacinável” (isto é, maior de 18 anos) vai ser imunizada ainda este ano, e metade desse total até junho. Pode ser que milagres aconteçam, mas o próprio o Plano Nacional de Imunização estima, sem mencionar datas específicas, que isso só vá acontecer até 12 meses depois que os grupos prioritários estiverem cobertos. E, para o primeiro trimestre, o Brasil só conta com doses suficientes para vacinar 25% desses grupos… Até agora, as vacinas chegaram a 2,7% da população adulta. E só a primeira dose. Com estoques no fim, pelo menos sete capitais devem interromper as campanhas ou limitar ainda mais o público-alvo na próxima semana. 

O problema, segundo Pazuello, é que está difícil conseguir comprar vacinas de fora e as empresas agora oferecem poucas doses. Exatamente: ao longo dos últimos meses vimos o governo federal cruzar os braços enquanto vários países estabeleciam tantos contratos quantos fossem capazes. O general mencionou pequenas compras anunciadas, como as 10 milhões de doses da Sputnik V e outras 20 milhões da Covaxin (sendo que este imunizante ainda nem tem resultados de ensaios de fase 3), e voltou a desdenhar da Pfizer, porque em sua opinião o Brasil “não precisa se submeter” às cláusulas contratuais da farmacêutica – ao contrário dos EUA, do Reino Unido e dos países da União Europeia, que as aceitaram de bom grado.

A verdadeira aposta brasileira, disse Pazuello, está na produção nacional, a partir do Instituto Butantan e da Fiocruz. É… Só que essa produção depende de insumos de fora, e, como temos visto, o fornecimento anda muito menos veloz que o desejado. Mesmo assim, para o ministro, está tudo azul: o Brasil está “abrindo o leque para ter reservas” de vacina e exportar para outros países da América Latina (uma possibilidade que já foi mesmo levantada pelo Instituto Butantan – porque o Ministério da Saúde não decidia se ia ou não querer mais doses da CoronaVac para o SUS). 

Pazuello ainda ofereceu um estapafúrdio argumento contra a abertura da CPI. Usando uma comparação com a Alemanha de Hitler, ele disse basicamente que investigar os erros do governo na pandemia pode gerar mais mortes: “A Alemanha perdeu a guerra duas vezes porque ela abriu a frente russa. Não há como manter duas frentes. Nós temos uma guerra, é contra a covid. Se nós entrarmos numa nova frente nessa guerra, que é a frente política, vai ser mais difícil ganhar a guerra.  E o resultado disso, é óbvio, é perder mais gente”. 

Qual é a fonte?

Tem mais. Durante a audiência, Pazuello disse que a variante do coronavírus identificada em Manaus é “três vezes mais contagiosa”, mas “graças a Deus tivemos a notícia clara de que as vacinas têm validade com essa variante ainda”. São duas informações que nunca haviam sido divulgadas em lugar nenhum, mas foram jogadas assim, sem qualquer explicação adicional.

Como foi feita a análise sobre a transmissibilidade (se é que foi feita)? Que vacinas foram testadas contra a nova variante, quando foi isso, que resultados foram colhidos (se é que isso aconteceu)? O ministro não deu detalhes, e nos parece altamente improvável eles existam. O irônico é que que se a pasta realmente descobriu que a P.1 é 200% mais contagiosa e não fez nada a respeito, isso é nada menos que um atestado de omissão. O Reino Unido viu que sua variante é cerca de 40% mais transmissível e tem sido uma grande correria para impedir o espalhamento. O território inteiro está em lockdown, mesmo que um quinto da população já tenha tomado a primeira dose de alguma das vacinas.

A propósito, o Brasil registrou ontem 1,4 mil novas mortes por covid-19, que é o maior balanço diário desde julho. Em transmissão ao vivo, Jair Bolsonaro disse que não adianta ficar em casa chorando, pois a economia não pode parar.

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