Do blues às pílulas

Sentimentos como tristeza e tensão são patologizados. Professor da Universidade de Paris discute os motivos

MAQUINARIA DIAGNÓSTICA

.

Artigo do psiquiatra Gérard Pommier, professor da Universidade de Paris, discute os limites cada vez mais indefinidos entre o sofrimento humano e sua patologização. Traduzido por Le Monde Diplomatique Brasil, o texto traça as origens desse processo nos anos 1950, quando a Associação dos Psiquiatras Americanos publicou pela primeira vez o manual conhecido pela sigla DSM, que reúne disgnósticos de transtornos mentais. Mora lá, diz ele, a chave para entender porque sentimentos como tristeza e tensão se transformaram em doenças – para as quais, é claro, a indústria farmacêutica tem uma ‘solução’.

“‘Depressão’, por exemplo, é palavra que faz parte do vocabulário corrente. O blues (tristeza) pode dominar qualquer pessoa, a qualquer momento da vida. Mas por que dar esse sentido ao conceito de “depressão”? Ela foi elevada à dignidade de uma doença à parte. Contudo, a tristeza pode ser um sintoma tanto de melancolia – acarretando risco elevado de suicídio – quanto de um estado passageiro e mesmo normal, como o luto. Confúcio recomendava ao filho um luto de três anos após a morte do pai; hoje, se você continua triste depois de quinze dias, está doente. Vão lhe dar antidepressivos, que podem temporariamente aliviar o problema, mas não o resolverão. Entretanto, como não convém interromper o tratamento de repente, a prescrição dura às vezes a vida inteira”, diz.

SENTIDOS DE UNIVERSAL

A segunda matéria que resumimos por aqui, publicada semana passada pela revista The Economist, fala sobre o conceito de cobertura universal em saúde. A reportagem não aborda o aspecto polêmico do conceito, que virou uma bandeira da Organização Mundial da Saúde sob a influência de organismos como a Fundação Rockefeller e o Banco Mundial e, hoje, é um dos objetivos de desenvolvimento sustentável a serem atingidos até 2030. O foco está na comparação entre países que não têm sistemas de saúde estruturados e as consequências que programas verticais focados em algumas doenças ou ações pontuais financiadas por entidades filantrópicas acarretam em situações limite.

De saída, dão o exemplo de Serra Leoa durante a epidemia de ebola, que matou 11.310 pessoas (entre elas, 7% da força de trabalho em saúde do país que tem um médico para cada 50 mil habitantes; em comparação, na China, a proporção é de um para 275). “Provavelmente mais gente morreu como um resultado indireto da epidemia do que da contaminação com o vírus. O número de crianças com malária tratadas em Serra Leoa em 2014 foi 39% menor do que quatro meses antes [da irrupção da epidemia], já que os trabalhadores estavam sobrecarregados”, diz a revista, que localiza nesse episódio o impulso para o conceito da cobertura universal.

A matéria cita um relatório publicado em dezembro pelo Banco Mundial e pela OMS que diz que pelo menos metade da população mundial não tem acesso a serviços de saúde essenciais, como pré-natal. O mesmo texto estima que 800 milhões de pessoas gastam mais de 10% das suas rendas mensais com saúde – e que, dentre elas, 100 milhões estão em situação de extrema pobreza (ou seja, ganham menos do que US$ 1,90 por dia). Outros estudos menores, diz a Economist, mostram o mesmo: uma pesquisa feita num hospital público de Uganda concluiu que 53% das pessoas precisaram pegar dinheiro emprestado para pagar pelo tratamento, 21% venderam posses e 17% perderam o emprego por conta do problema de saúde.

“Era comum mesmo em países ricos as pessoas terem que escolher entre a saúde física e a financeira. Quando o primeiro sistema nacional de saúde de caráter universal foi criado, em 1948 no Reino Unido, os domicílios recebiam mensagens em que o governo garantia que os serviços de saúde ‘seriam um alívio para suas preocupações financeiras em períodos de doença’. Desde então, muitos outros países seguiram o exemplo e organizaram esquemas de seguro social”, diz a revista, sem fazer distinção, contudo, entre um sistema universal de saúde (como o NHS) e um esquema de cobertura universal, que não necessariamente prevê serviços públicos geridos pelo setor público, mas a compra de serviços de saúde no mercado pelo governo.

De qualquer forma, a revista segue a linha de argumentação de que aumentar o gasto público em saúde é positivo. Para isso, menciona um conjunto de estudos que vinculam o crescimento econômico a mais investimentos na área. E sentencia: “Esse especial vai argumentar que serviços de saúde universais são tanto desejáveis quanto possíveis, mesmo para países de renda baixa”.

CRESCIMENTO

O mercado de planos de saúde registrou em março 47,4 milhões de usuários, o que representa um aumento de 128,4 mil pessoas quando comparado ao mesmo período do ano passado, de acordo com dados da ANS, noticia o Valor. É o quarto mês seguido de alta. A Bradesco Saúde cresceu 0,68% entre os meses de março e fevereiro deste ano. As duas operadoras que abriram capital no mês passado também registraram alta. O número de usuários da NotreDame Intermédica aumentou 3,65% e da Hapvida avançou 0,35%.

Já o mercado de planos odontológicos cresceu ainda mais: detinha em março 23,2 milhões de beneficiários, aumento de cerca de 120 mil usuários na comparação com o mês anterior e de 1,3 milhão em relação ao mesmo mês de 2017.

COMO UM CIBORGUE

Um biofísico está pesquisando formas de ampliar a integração de próteses com o corpo humano. Hugh Herr é chefe do grupo de pesquisas em biomecatrônica do Laboratório de Mídia do Instituto de Tecnologia de Massachusetts e também alguém com uma motivação direta para fazer avançar os limites dessa ciência: amputado aos 17 anos, após um acidente com alpinismo, ele é o responsável pela criação de algumas das próteses mais avançadas no mundo, que respondem através de sensores a comandos cerebrais. O próximo objetivo dele é integração total. “Sou um homem biônico, não sou ainda um ciborgue”, diz, completando: “Quando toco ou movimento meus membros, não experimento de volta as sensações de mexer e saber onde o pé está sem olhar para ele […] Minhas pernas são ferramentas separadas do meu corpo”. Por isso, ele quer criar próteses sensíveis ao toque.

CONSOLIDAÇÃO EM CONSULTA

Em setembro de 2017, o Ministério da Saúde terminou o projeto que teve como finalidade a consolidação de 18 mil instrumentos normativos, reduzindo-os a 749. Esses procedimentos passaram por uma segunda análise e foram consolidados em seis portarias, que dizem respeito a assuntos como direitos e deveres dos usuários do SUS, ações e serviços, financiamento, entre outros. Agora, o Conselho Nacional de Saúde abriu uma consulta pública para saber a sua opinião. As contribuições podem ser dadas até o dia 8 de junho.

FIQUE DE OLHO

A 6ª Conferência Nacional de Saúde Indígena deve acontecer no primeiro semestre de 2019. A expectativa é que ainda em 2018 ocorram as etapas municipais e distritais, reunindo milhares de participantes em todo o país. A informação foi confirmada na 100ª Reunião da Comissão Intersetorial de Saúde Indígena do Conselho Nacional de Saúde.

Leia Também:

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *