“Desvinculação” de verbas: feitiço contra o feiticeiro?

Bancadas ligadas à Saúde e Educação reagem: jogada de Guedes para acelerar desmonte da Previdência pode atingir governo. Leia também: o bizarro direito dos embriões nos EUA; planos de Saúde ampliam cobrança irregular; e muito mais

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PREVIDÊNCIA & DESVINCULAÇÃO

Parece que Paulo Guedes errou mesmo feio em sua previsão de que seria ok aprovar a desvinculação do orçamento agora. Em entrevista ao Valor, o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), disse que a proposta pode até ‘atrapalhar’ a Reforma da Previdência, da qual ele será relator no Senado. “Porque você cria resistências. Muita gente que potencialmente votaria a favor da Previdência passará a ser contra. Você acha que a bancada da Saúde, por exemplo, é a favor de desvincular? A da Educação, na qual a questão da vinculação de um percentual do Orçamento é quase sagrada? Cria um núcleo de insatisfação por uma ação errada do próprio governo”.

E Rodrigo Maia disse ontem que “é inócua a desvinculação na saúde e educação porque ninguém vai mexer nisso, a pressão é muito grande, principalmente a nível federal” (mas sabe-se lá, né? Como contamos em outra news, o ministro da Saúde, Mandetta, disse ser favorável…). Já a Previdência, Maia considera ‘viável’ aprovar ainda este semestre… Mas, pela matéria da EBC, não pareceu muito seguro quanto ao apoio dos parlamentares. “Nós, que defendemos a urgência e a decisiva reforma da Previdência, precisamos mostrar a 250, 280 deputados que não foram eleitos com essa agenda, que, para que o Brasil volte a investir, a gente precisa da reforma da Previdência”. Ele comentou que sempre diz a Paulo Guedes: “Ministro, infelizmente, não temos 320 liberais no parlamento brasileiro. É uma construção”.

Por sua vez, Mourão falou sobre isso com em almoço na sede do governo paulista, com João Doria. Que reafirmou apoio incondicional e se desdobrou em elogios a Bolsonaro. 

O plenário do Conselho Nacional de Saúde aprovou uma recomendação para que o Congresso interrompa a tramitação da reforma, entendendo que ela vai aumentar a desigualdade social e causar grave impacto na saúde da população. 

EM NOME DO EMBRIÃO

Existe um lugar onde uma mulher grávida que sofreu um acidente de trânsito foi processada por colocar a vida do bebê em risco. Este lugar não é Gilead, nação fictícia do romance O Conto da Aia, mas o condado de Madison, no Alabama (EUA), que tem uma das leis mais restritivas do país em relação ao aborto. Como explica Cláudia Collucci em sua coluna de hoje na Folha, lá foi aprovada uma emenda estadual que  garante a “proteção dos direitos do feto” e “reconhece e apoia a santidade da vida não-nascida e os direitos da criança não-nascida”. Com a emenda, legisladores puderam aprovar o estatuto da “personalidade fetal”, determinando que a vida começa na concepção.

E com isso chegamos a um bizarro caso recente: um rapaz, descontente com a interrupção voluntária de gravidez pela namorada de 16 anos, foi à Justiça em nome do embrião abortado para processar a clínica que realizou o procedimento. Ele chama o feto de Baby Rose. Collucci parte do Alabama para chegar ao Brasil. Afinal… “Vamos estabelecer políticas públicas para o bebê na barriga da mãe nesta nação”, foi o que nossa ministra da Mulher disse logo após sua indicação para a pasta.

KIT GAY POLONÊS 

Na Polônia, governa hoje o Partido Lei e Justiça, e vai haver eleições em novembro. O prefeito de Varsóvia, de um outro partido de oposição, promete apoiar pessoas LGBT e garantir que o currículo escolar inclua educação sexual e sobre identidade de gênero. Pronto. O líder do partido de situação, Jaraslow Kaczyński, diz que é um ataque às famílias e vai causar “sexualização das crianças”. Suas investidas contra essa abordagem não são recentes. No ano passado, uma campanha chamada “Pare de sexualizar crianças e jovens” acusava grupos que faziam oficinas de educação sexual de  promover “depravação”, e alegava que seguir as recomendações da OMS nessa área poderia causar “dependência sexual” e “confusão de identidade de gênero”. E, para aconselhar sobre mudanças curriculares na educação sexual, o governo nomeou um professor de teologia católica que alegou que a contracepção pode gerar “hedonismo”…

FAKE MOMO

Quem tem filhos (e talvez quem não tem também) deve ter visto pelas suas redes uma matéria que diz que uma boneca assustadora  – uma tal boneca Momo – vem aparecendo no meio de vídeos do Youtube Kids, com mensagens suicidas. Ela apareceria em momentos aleatórios, no meio das imagens, ensinando passo a passo como se suicidar.  Mas tudo indica que é fake news. O Youtube afirma não ter encontrado nenhum vídeo com a boneca na versão infantil da plataforma. No Youtube regular ela aparece, em vídeos que discutem o tema. Mas no Kids, não dá pra subir. O pessoal do Boatos.orgchecou: eles viram que o burburinho começou há duas semanas em países de língua inglesa, mas não acharam os tais vídeos em nenhum lugar. Pra testar, tentaram subir um vídeo com a boneca no Youtube Kids… Foi vetado. 

MAS É UM LIMBO

Ainda que a segurança das crianças em relação à Momo pareça estar garantida, o YouTube está longe de ser um lugar tranquilo para elas. N’O Joio e o Trigo, João Peres fala de youtubers mirins e classifica a plataforma como um ‘limbo’, sem regulação.  Depois que a propaganda voltada para crianças foi limada da TV aberta, vídeos na internet protagonizados por elas se tornaram uma alternativa mais que atraente para a indústria anunciar lançamentos. Peres lembra que isso, além de estimular muito o consumismo, “confronta diretamente mecanismos de garantias de direitos, como o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e a própria regulação da comunicação”. Boa parte da criançada tem tablet desde o berço e fica na internet regularmente. O texto fala do panorama mais geral e, também especificamente, sobre a (má) influência do fenômeno sobre hábitos alimentares infantis. 

Falando nesses hábitos, o Ministério da Saúde começou ontem uma coleta de dados sobre alimentação de crianças menores de cinco aos para o Estudo Nacional de Alimentação e Nutrição Infantil.  Serão visitados 15 mil domicílios em 123 municípios. 

E o Isags (Instituto Sulamericano de Governo em Saúde) acaba de publicar um estudo sobre a interferência da indústria de alimentos nas políticas de rotulagem, na América Latina. 

CONTA-SURPRESA

Falamos muito no ano passado sobre uma norma da ANS que regulamentava o pagamento de coparticipação nos planos de saúde. Era ruim – estabelecia um teto de 40% ou 60% sobre o valor de certos procedimentos, o que é bem alto –, foi vetada via liminar do STF e, em seguida, suspensa pela agência. Mas isso não quer dizer que esteja tudo bem. Afinal, as cobranças acontecem, só que sem regulamentação mesmo. A matéria do Globo diz que mais da metade dos usuários de planos de saúde pagam algum extra quando usam o serviço. Sem saber quanto vai ser cobrado, nem quando. 

SAÚDE NA JUSTIÇA

Cada vez mais gente vai pra Justiça, contra o SUS ou planos privados, para conseguir coisas como remédios, leitos, cirurgias e consultas. Entre 2008 e 2017, o número de ações judiciais na saúde cresceu 130% no país, muito mais do que o observado no volume total de processos, que foi 50%. Os dados são de um inquérito divulgado ontem, realizado pelo Insper sob encomenda do Conselho Nacional de Justiça. O estudo mostrou ainda que as demandas não são iguais em todas as regiões. No Norte, os pedidos por leitos estão em 75,2% das ações, enquanto no Sudeste estão em 36,7% delas. 

O lançamento foi no Hospital Sírio Libanês, e o ministro da Saúde, Mandetta, estava lá. Puxou a sardinha para seu barco, comentando uma das ações que sua gestão já anunciou, que é a de compartilhar riscos com a indústria no que diz respeito à incorporação de novas tecnologias e insumos. De acordo com ele, isso pode servir para trazer mais remédios para o SUS, e diminuir os processos para aquisição de medicamentos caros. 

PARA ONDE VAI A CIÊNCIA?

O astronauta-ministro de Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações, Marcos Pontes, anda meio esquecido do noticiário. A Agência Públicaapresenta uma matéria sobre ele, que não é dos piores nomes do time Bolsonaro… Mas, pela pouca articulação política, talvez não consiga implantar projetos. 

SEM MAR DE ROSAS

Se o SUS é universal, precisa dar conta da população em situação de rua. Mas só em 2011 começou a funcionar a estratégia do Consultório na Rua, e ainda hoje ela não é lá tão conhecida. O psicólogo  Igor da Costa Borysow estudou o programa no doutorado. Uma das conclusões é que funciona como “um jogo de cabo de guerra entre interesses pessoais, políticos, institucionais e da população”. De acordo com ele, quem está em altos cargos, como no ministério, tem mais facilidade em impor opiniões, e internamente, quem bate mais o martelo são médicos. Na comunidade, o programa ainda é mal compreendido. “Muitos nos abordavam dizendo para internarmos as pessoas e as tirarmos da rua”, diz ele, no Jornal da USP. 

CHEGA DE  FÓRMULA

Após meses de debate interno, o British Medical Journal anunciou ontem que não vai mais veicular publicidade de empresas de leite artificial. Vai deixar de ganhar 300 mil dólares em 2020. Recentemente, o Royal College of Pediatrics and Child Health  do Reino Unido decidiu parar de aceitar doações dessa indústria. 

DENGUE

O número de casos na capital do Rio, em janeiro e fevereiro,  aumentou 45%em relação ao mesmo período do ano anterior. E, no noroeste paulista, são 20 as cidades com epidemia. 

GRIPE

Começa mês que vem a campanha de vacinação contra gripe, mas, no Amazonas, já vai ser amanhã. É que o estado enfrenta, pela primeira vez, um surto de H1N1. Já foram 666 casos de síndrome respiratória aguda este ano, com 34 mortes

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