Saúde em crise: agora, o sarampo voltou

Brasil volta a registrar casos da doença, que estava erradicada. Deficiências na vacinação são causa principal. Leia também: o quanto já se cortou na assistência farmacêutica; os 70 países onde ainda é crime ser homossexual; e muito mais

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BRASIL VAI PERDER TÍTULO DE PAÍS LIVRE DE SARAMPO

A má notícia não é surpresa, pois essa possibilidade estava posta há meses. Mais um caso da doença foi confirmado no último dia 23, e assim completamos mais de um ano de transmissão sustentada do sarampo. Com isso, o Brasil vai perder seu certificado de país livre do sarampo, que tinha sido concedido em 2016. O governo brasileiro informou que vai colocar em prática um plano para erradicar, de novo, a doença, com ampliação dos horários nos postos de saúde e a exigência de carteira de vacinação para matrícula em escolas. Hoje isso já é exigido, mas de forma “burocrática”, segundo o Estadão. O ministro da Saúde, Mandetta, quer mandar um projeto para o Congresso. Sua proposta é que o atraso no calendário vacinal não impeça a matrícula, mas traga implicações para os responsáveis, como o encaminhamento para o conselho tutelar. O problema, como mostra a matéria, é que nem sempre a culpa é dos pais. Há vacinas oferecidas em frascos com várias doses e, em alguns postos, não se pode abrir um frasco no fim do expediente, para não perder o que não é usado. Alguns municípios recomendam que a criança volte no dia seguinte… Mas às vezes os pais não têm condições de voltar.

SEM NOÇÃO

Embora aqui seja residual, na Europa e nos EUA o movimento antivacina é chave para entender os surtos de doenças como  sarampo. E Nos EUA eles estão pegando pesado. Quando uma criança morre por doenças preveníveis pela imunização e a família torna isso público, ‘ativistas’ se juntam para ir nas redes sociais das mães e postar mensagens do tipo “você está mentindo”, “seu filho foi vacinado sim e por isso morreu”, “seu filho nem existia” e “você que matou seu filho e inventou essa história”, além de xingar palavrões. Pesadíssimo.

Enquanto isso, um político antivacinas da extrema direita italiana – que chegou a classificar como ‘stalinista’ um programa de vacinas obrigatórias – está internado. Com catapora. 

QUEDA LIVRE

O Inesc lançou ontem um estudo bem importante pra se entender como a “austeridade” está minando a assistência farmacêutica – mas nem de longe a indústria ou o consumo de remédios. Depois de grande alta em 2016, no ano seguinte o orçamento federal para programas de acesso a medicamentos caiu 14,4%, muito mais do que a queda geral do orçamento da Saúde, que foi 3% (isso logo após a emenda do Teto dos Gastos). Mas as vendas das farmacêuticas continuaram de vento em popa e, também em 2017, cresceram 13%. Aliás, em 2021 o Brasil deve se tornar o quinto mercado mundial de medicamentos. Quando o Outra Saúde conversou com a pesquisadora Evangelina Martich sobre os genéricos, ela observou que a demanda por medicamentos justamente é inelástica, ou seja, as pessoas consomem porque precisam, mesmo que precisem cair na pobreza para continuar comprando. 

Apesar de cortar na assistência, o governo segue com crescentes subsídios ao setor. Que em tese deveriam se converter em preços mais baixos para o consumidor, mas isso não aconteceu. O resumo da ópera é o seguinte: Em 2017 o orçamento para a área caiu R$ 2,8 bilhões e foi para R$ 16,4 bi; o setor farmacêutico teve lucro de R$ 11,3 bi, e os gastos tributários anuais do governo com essa indústria são de R$ 9,5 bi. O documento completo está aqui.

ALGUMAS DÚVIDAS

A maconha medicinal é sempre pauta de reportagens (e portanto vive aparecendo aqui) porque tem toda essa dificuldade na liberação em vários países, porque é um grande negócio incipiente para a indústria e porque se tem muita esperança nessa planta para vários usos. A matéria do New York Times, traduzida no Estadão, sugere que se ponha algum freio nas expectativas. Não que o canabidiol não tenha grande potencial: a agência de vigilância dos EUA já aprovou um remédio à base da substância para formas raras de epilepsia (o Epidiolex), há dados indicando efeitos anti-inflamatórios, estudos em andamento para avaliar ação na ansiedade, em estresse pós-traumático, no autismo, no tratamento do vício em heroína, no apoio à quimioterapia…

O problema é que, mesmo a maconha sendo algo tão amplamente usado e há tanto tempo, as pesquisas envolvendo o canabidiol ainda estão em um estágio bem incipiente. Há estudos divergentes entre si, e além disso ainda falta investigar melhor os efeitos colaterais (pacientes que usam Epidiolex têm apresentando mais infecções e alergias, problemas para dormir e elevação nas enzimas do fígado, por exemplo). E ainda nem se determinou direito a dose terapêutica correta a ser testada. “As pessoas imaginam que se trate de um remédio paradisíaco, o que é um erro. Não é possível que uma substância seja capaz de curar tudo”, alerta Yasmin Hurd, diretora do Centro de Pesquisa do Vício do hospital Mount Sinai, em Nova York. 

E ALGUNS RESULTADOS

E sobre o uso recreativo da cannabis: foram publicados ontem no Lancet Psychiatry  os resultados de um estudo feito com dados de cerca de duas mil pessoas em dez países da Europa e no Brasil.  Segundo os cientistas, o uso diário ou de formas mais potentes da droga está ligado a um risco substancialmente  maior de desenvolver psicoses. A pesquisa envolveu cerca de 2100 pessoas em 11 cidades da Europa e em uma região brasileira. Mas Bill Murray, que coordenou a pesquisa, é favorável à legalização: “É muito mais importante que as pessoas sejam informadas“, disse à CNN.

OS CUBANOS QUE FICARAM

Quando o governo cubano saiu do Mais Médicos, o recém-eleito Bolsonaro disse que daria “asilo” aos que escolhessem ficar. Cerca de 2,5 mil o fizeram, mas estão numa precariedade total. Não podem exercer a medicina, nem encontram outro tipo de trabalho, segundo a matéria da BBC. Segundo os médicos entrevistados, a opção de fazer o Revalida é inalcançável porque Cuba retém seus documentos. Voltar ao país natal não é uma opção, porque, considerados desertores, não podem entrar de novo por oito anos. Eles agora miram os EUA.

HOMOFOBIA DE ESTADO

São 70 os países em que ser homossexual é crime; em 44 deles, a proibição á para homens e mulheres e, no restante, só para homens. A punição varia de multas a prisão perpétua e pena de morte. As informações são do último relatório mundial sobre o tema, “Homofobia de Estado”, que foi lançado ontem e inclui apenas as 193 nações que fazem parte da ONU. A maioria dos países (32) está na África; outros 22 são asiáticos, 9 estão nas Américas e 6 na Oceania. É tudo muito bizarro, mas ao menos a lista diminuiu desde o ano passado. Pouquíssimo, é verdade: ao longo de 2018, a prática foi descriminalizada em dois países, Índia e Trinidad e Tobago; e, este ano, em Angola. 

NO BOLSO

O Senado aprovou ontem um projeto de lei da Câmara para fazer com que agressores de mulheres precisem ressarcir o SUS pelo tratamento prestado às vítimas. Segundo os autores, o objetivo é que seja mais um desestímulo à prática da violência doméstica. O texto volta agora à Câmara para análise, porque no Senado houve mudanças na redação.

SALVEM AS ABELHAS

Nos últimos três meses, mais de 500 milhões de abelhas foram encontradas mortas por apicultores no Brasil, e a Deutsche Welle discute as causas, que em outros países já são investigadas há anos. Há doenças e redução do habitat natural, mas um dos fatores importantes é o uso de agrotóxicos nas lavouras – aqui, pesticidas à base de neonicotinoides e de fipronil foram os principais causadores. As abelhas, ótimas polinizadoras, são necessárias pra garantir tanto a própria agricultura como as florestas. Na Europa, a pressão de ativistas foi fundamental para a UE proibir três substâncias que danificam o sistema nervoso central de insetos; a França baniu cinco inseticidas; o fipronil está proibido em vários países e tem uso restrito na União.

Já no Brasil, só incentivos, com 74 novos registros em andamento só este ano. O deputado e ex-ministro da Saúde Alexandre Padilha apresentou um projeto para barrar as liberações.

MAIS UM

E, pela segunda vez, um júri nos EUA considerou que o Roudup (agrotóxico à base de glifosato) provocou câncer. Agora, a vítima foi Edwin Harderman, um homem de 70 anos que usou o produto por décadas. Há oito meses, a Bayer (que comprou a Monsanto) foi condenada a pagar US$ 289 milhões a Dewane Johnson em um outro caso semelhante. Agora, esse outro juri vai decidir se a Monsanto vai ser penalizada, e em quanto. Há outros 11 mil processos em jogo. 

SEM SANEAMENTO

Segundo um relatório da ONU lançado ontem, 2 bilhões de pessoas vivem sem acesso à água potável. Quando se vai para “instalações de saneamento com segurança”, o número salta para 4,5 bilhões. Ou 60% da população mundial… A pobreza é o principal limitante no acesso a água. Casas urbanas ricas com água encanada tendem a pagar muito menos pelo litro, enquanto pessoas pobres que moram em favelas muitas vezes precisam comprar água de caminhões, quiosques e outros fornecedores, gastando cerca de 10 a 20 vezes mais, informa a Deutsche Welle.

TAXAR OS RICOS

Saiu em um estudo da OCDE: 60% das pessoas nos países desenvolvidos querem que seus governos aumentem os tributos dos ricos para melhorar a vida dos pobres. 

PÓS-PARTO

A agência de vigilância sanitária dos EUA aprovou ontem a primeira droga voltada especificamente para mulheres com depressão pós-parto. 

EDIÇÃO DE DNA

A OMS criou um comitê consultivo para debater o futuro da edição de DNA humano. Vai ser um trabalho de 18 meses, e um dos objetivos é criar uma estrutura global para ser referência na área. O comitê também pediu que a Organização estabeleça um registro global desse tipo de pesquisa. 

CICLONE IDAI

A contagem oficial está em 84, mas o número de mortos pelo ciclone Idai no sul da África pode passar de mil em Moçambique, segundo o presidente do país. Cem mil pessoas precisam ser resgatadas e outras 600 mil foram atingidas por enchentes, desabamentos e deslizamentos. No Zimbábue, já são 98 mortes e 217 desaparecidos. 

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