Afinal, quem deve receber prioridade na vacinação?

Câmara aprova inserção de militares e agentes de segurança entre os grupos prioritários, e Planalto antecipa vacinação de parte da categoria

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A Câmara aprovou ontem o texto-base de um projeto que inclui várias categorias entre os grupos prioritários para a vacinação. Profissionais como coveiros, garis, taxistas e mototaxistas, trabalhadores de farmácia, agentes de segurança pública e privada e oficiais de justiça, entre outros, passam a ter prioridade na vacinação. Não se sabe quantas pessoas a mais essa adição significaria.

Em paralelo a isso, o próprio governo federal decidiu antecipar a vacinação de militares e agentes de segurança que atuem no combate direto à covid-19, em atividades como fiscalização do distanciamento social, atendimento ou transporte de pacientes e ações de vacinação. Como parte das forças de segurança, eles já faziam parte dos grupos prioritários, mas atrás de outras pessoas, como os idosos com mais de 60 anos. A nova orientação foi definida na terça e informada ontem a governadores, que pressionavam por uma orientação quanto a isso – os secretários locais vinham relatando forte pressão por essa mudança, temendo eventuais motins de agentes da linha de frente, diz o Estadão. 

Governadores também têm proposto por conta própria mudanças na ordem, contrariando o plano nacional. Em ao menos seis estados, os gestores decidiram antecipar a imunização de professores e policiais. Em São Paulo, João Doria (PSDB) anunciou que essas pessoas começariam a receber vacinas agora em abril, antes de se completar a vacinação dos idosos e de pessoas com comorbidades. No caso dos trabalhadores da educação, talvez o plano de Doria não se conclua. Isso porque o número de doses disponibilizadas (350 mil) só seria suficiente para alcançar aqueles com mais de 47 anos, e o sindicato dos professores da rede estadual entrou com um pedido na Justiça para que todos sejam vacinados.

As mudanças são controversas, já que o plano federal tenciona cobrir os grupos que têm maior risco de desenvolver doença grave e morrer. Na CNN, a sanitarista Ligia Bahia critica a decisão do governo do Rio de priorizar policiais: “Como se o Rio fosse vacinar primeiro um policial jovem, e deixar a mãe dele, que tem doença pulmonar crônica obstrutiva, atrás do filho. Não faz sentido em termos epidemiológicos, porque o objetivo da vacinação é diminuir a mortalidade, não é aumentar a popularidade de determinados políticos”, avalia. 

Um problema é que, devido ao seu grau de exposição ao vírus, certos trabalhadores podem de fato acabar tendo seu risco de adoecimento e morte aumentados. Só que o Brasil não tem dados sobre como a covid-19 afeta cada categoria. Pela natureza das ocupações e dos locais de trabalho, podemos imaginar que motoristas de ônibus e funcionários de supermercados, por exemplo, estejam mais expostos a risco do que muitos outros. Mas não há números, o que faz com que a definição de categorias profissionais prioritárias seja feita meio no escuro, sem critérios epidemiológicos irrefutáveis.

Na falta desses números, é interessante olhar para o levantamento feito pelo Lagom Data sobre os setores da economia em que os desligamentos por morte mais aumentaram em 2020, com base em dados do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados). 

O setor de vigilância e segurança privada foi o pior, com 51% maior mortes do que no ano anterior. No transporte de cargas, o crescimento foi de 46% – em ambos, o aumento foi maior até do que no setor hospitalar, que teve um crescimento de 42%. Construção e transporte público tiveram quase 40% de aumento também.

Vale frisar que nenhuma conclusão muito sólida pode ser tirada a partir desses dados, porque há várias limitações: eles só incluem trabalhadores com carteira assinada, não levam em conta aumento ou redução nas contratações e, claro, nem todas as mortes são por covid-19. Mas não deixam de ser um ponto de partida para pensar a vulnerabilidade de trabalhadores na pandemia.

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