Fumacê, triste mito brasileiro

Justiça SP condena um (único) prefeito pela epidemia da dengue. Decisão bizarra sugere: que tal enxergar o fracasso dos métodos atuais de “combate” à doença? Leia também: boas notícias sobre a poderosa cannabis

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Por Maíra Mathias e Raquel Torres

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MODELO FALIDO

O Tribunal de Justiça de São Paulo condenou o ex-prefeito de Aguaí. O motivo? Improbidade administrativa por omissão no combate ao mosquito Aedes aegypti. Em 2015, 2.525 dos 30 mil moradores da cidade foram diagnosticados com dengue. Como punição Sebastião Biazzo, do MDB, terá que pagar uma multa de cerca de R$ 50 mil. Ele (que, em 2012, aos 89 anos, se tornou o político mais velho do país a ser eleito para o cargo) também perde os direitos políticos por quatro anos. “Houve epidemia de dengue em mais de 600 municípios, mas só o prefeito de Aguaí foi condenado. Pergunto se não era o caso de processar também o governo do Estado”, argumentou o advogado (e sobrinho) do ex-prefeito, José Ricardo Biazzo, segundo o Estadão. A sentença judicial afirma que ele não tomou “providências adequadas e suficientes para debelar os casos de dengue” e lista falhas: vigilância epidemiológica defasada, falta de treinamento dos servidores da saúde, insuficiência de transporte para equipes responsáveis pelas ações.

Seria bom que essa decisão abrisse um debate sobre o modelo de “combate” ao mosquito adotado no país e muito criticado por especialistas por ser caro, ineficaz e perigoso: é baseado em aplicação de larvicida e fumacê; usa uma lógica militar de guerra a um vetor que de nada esclarece a população sobre o problema; não preveniu, nos últimos 40 anos, que surtos e epidemias acontecessem, tampouco que o Aedes se espalhasse pelo país inteiro. Todo mundo sabe que, além do clima tropical, um fator determinante para a proliferação de vetores está a vista de todos, e causa muitas outras doenças… É a falta de saneamento e de planejamento urbano.

NO-SHOW

Termina hoje o prazo para que os médicos brasileiros se apresentem às prefeituras para ocupar as vagas para as quais se candidataram no novo edital do Mais Médicos. E, segundo a colunista Mônica Bergamo, até ontem, aproximadamente três mil não tinham dado as caras. Cerca de 40% num total de 8.517 vagas abertas. Um dos temores dos gestores é que, por volta de março, quando saem os resultados dos processos seletivos para residências médicas, boa parte dos profissionais que já se apresentaram abandone o programa. Esse alerta também é feito por especialistas, como Luiz Facchini, coordenador da Rede de Pesquisa em Atenção Primária à Saúde. 

E também hoje se esgota o prazo para que médicos formados no exterior se candidatem. Até agora, 6.634 profissionais completaram a inscrição.

DILMA

A ex-presidente Dilma Rousseff passou por uma angioplastia na terça, noticiada ontem a noite. O procedimento, feito para desobstruir artérias no coração, foi bem-sucedido, segundo o boletim do Hospital Sírio Libanês.

NOTÍCIAS DO CONGRESSO

Ontem, a comissão mista do Congresso aprovou a proposta orçamentária para 2019. O texto deve ser votado pelo plenário semana que vem. O salário mínimo foi reajustado e passa dos atuais R$ 954 para R$ 1.006 no ano que vem. O reajuste salarial aprovado pelos parlamentares para a categoria dos agentes comunitários de saúde e de combate às endemias vai sair do Programa de Sustentação ao Investimento, que teve R$ 600 milhões cortados. 

E um projeto considerado uma pauta-bomba não deve ser votado. Pelo menos nesta legislatura. Trata-se da proposta que retira 20% das receitas do Fundo Social do Pré-Sal para financiar a construção de estruturas privadas em empresas do setor de gás.

DESCOBERTA

Foi publicado em um das revistas científicas de maior impacto, a Cell, um estudo que pode mudar os rumos da prevenção e tratamento de uma das doenças mais temidas do mundo: o ebola. É que pesquisadores dos Estados Unidos descobriram que uma proteína presente nas células humanas chamada RBBP6 consegue interferir no ciclo de replicação do vírus. O G1 explicou de maneira clara o achado: 

“Primeiro, o vírus do ebola entra na célula humana. Dentro dessa célula, existe a RBBP6; O ebola, explicam os cientistas, tem duas proteínas que precisam se ligar uma à outra para que ele consiga se multiplicar — a VP30 e a NP; Os pesquisadores descobriram que a proteína do vírus VP30 e a proteína humana RBBP6 conseguem se ligar uma à outra. Quando elas duas se conectam, a proteína do vírus não consegue se ligar à sua outra, a NP, o que diminui o ritmo de reprodução do vírus do ebola. Quando a RBBP6 é removido das células, por sua vez, o vírus se multiplica muito mais rápido.”

SUBSTITUIÇÃO

A Vice entrevistou o neuropediatra Eduardo Faveret, coordenador do centro de epilepsia do Instituto Estadual do Cérebro do Rio. E ele argumenta que o canabidiol (substância presente na maconha, mas que não causa alucinação) poderia, no futuro, substituir o rivotril e diversos outros medicamentos, economizando recursos. “Rivotril é uma droga barata, mas no sentido qualitativo, (o canabidiol) trata-se de uma melhora interessante. Na saúde pública, quando pudermos produzir em larga escala no Brasil, reduzirá significativamente o custo da saúde, pois substitui anti-inflamatórios, remédios para dor, como morfina, tratamentos para osteoporose, artrites etc. Às vezes, a pessoa toma um remédio para cada problema desses, aí vem uma substância que equilibra o corpo e pode reduzir ou retirar diversos desses medicamentos. Pode ocasionar, também, uma redução de internações e do uso de outros medicamentos que têm diversos efeitos colaterais que seriam evitados. Seria um impacto significativo.”

CRISE HUMANITÁRIA

A ONU lança hoje um apelo mundial para que os países se estruturem para receber um fluxo de imigrantes venezuelanos que deve somar, em 2019, dois milhões de pessoas, projeta a organização. As Nações Unidas devem anunciar também que o caso da Venezuela é uma crise humana. Até agora, 3,3 milhões saíram do país, que enfrenta fome e pane na saúde.

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