Venezuela: surge um adversário para Chávez

Henrique Capriles Radonski (Reuters)

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Embora rico e conservador, Radonsky diz que vai manter programas sociais do atual presidente, e faz menções a um “modelo Lula”

Por Claudia Jardim, BBC Brasil

Um dos principais candidatos a enfrentar o presidente venezuelano Hugo Chávez nas urnas em 2012 promete um ”modelo Lula” de governar, em menção ao ex-presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva.

Henrique Capriles Radonski, pré-candidato presidencial na Venezuela, lança sua candidatura nesta quarta-feira tentando desvincular-se do rótulo de conservador.

”Não é a hora da esquerda, nem da direita, é a hora da Venezuela”, afirmou Capriles Radonski, durante um ato de campanha eleitoral.

Com 39 anos, o atual governador do Estado de Miranda, o segundo mais populoso do país, aparece como favorito nas pesquisas às eleições primárias de fevereiro, quando a coalizão opositora definirá quem será o candidato que enfrentará Chávez nas eleições presidenciais.

Analistas políticos ouvidos pela BBC Brasil afirmam que Radonski tem como uma de suas ”preocupações” e ”desafios” convencer a população que seu projeto de governo é de centro-esquerda, ainda que sua origem e sua base de apoio representem a direita da sociedade venezuelana.

Fome zero venezuelano

”Radonski está sempre fugindo da etiqueta de que é um político conservador. Tenta ir à esquerda, diz que seu guia é Lula e quer ser do povo”, afirmou à BBC Brasil o analista político Carlos Romero, professor da Universidade Central da Venezuela.

Reiteradamente, Radonski diz que pretende seguir o modelo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva nas áreas econômico e social. Em sua gestão como governador, criou o ”Fome Zero venezuelano” para distribuição de alimentos para mais de 50 mil famílias.

Sua atuação, no entanto, está mais próxima da do atual mandatário venezuelano do que da gestão Lula. Radonski tem se esforçado em imitar o atual presidente. Tem prometido não só manter, como melhorar as “missões” – carro-chefe da política social de Chávez – e incorporou a suas políticas públicas no Estado de Miranda os conselhos comunitários – uma espécie de Orçamento Participativo, criado por Chávez.

Apoiado por um setor político-empresarial, Radonski busca se adaptar ao discurso político venezuelano, no qual a agenda social e progressista se tornou prioritária, na opinião do historiador venezuelano Miguel Tinker Salas, professor de História Latino-americana da Pomona College, da Califórnia. ”É impossível na Venezuela atual a eleição de um candidato conservador com um discurso pró-Estados Unidos”, afirmou Salas à BBC Brasil.

Voto chavista

Radonski se projetou na vida política no partido democrata-cristão Copei. Aos 26 anos assumiu o cargo de Presidente da extinta Câmara de Deputados, durante o governo de Rafael Caldera, antecessor de Chávez. Sua família representa uma das mais tradicionais e ricas da elite venezuelana.

Em 2004, esteve preso durante quatro meses, acusado de promover atos de violência contra a embaixada de Cuba em Caracas, durante o fracassado golpe de Estado contra Chávez.

Na ocasião, Radonski era prefeito e sua participação na crise política teria maculado sua carreira política durante um período. Sua popularidade voltou a crescer em 2009, quando, na disputa pelo governo do Estado de Miranda, derrotou nas urnas o candidato Diosdado Cabello, representante do setor conservador do núcleo chavista.

De acordo com a consultoria Datanalisis, Capriles Radonski é único candidato com condições, atualmente, de desafiar à Chávez nas urnas. ”Capriles conseguiu consolidar essa posição porque tem um perfil atrativo para as massas opositoras e indecisas: é jovem, tem experiência comprovada e tem mostrado uma gestão exitosa”, afirmou o diretor da Datanalisis, Luis Vicente León.

Além do voto opositor, na opinião do analista político Nicmer Evans, professor de Teoria Política da Universidade Central da Venezuela, Radonski está consciente que a única maneira de ganhar as eleições é conquistando o voto daqueles eleitores relativamente próximos a Chávez, que estão, porém, descontentes com a gestão chavista. ”Para isso ele vem utilizando a técnica de mimetização do chavismo”, afirmou Evans à BBC Brasil.

Há alguns meses, Radonski passou a copiar também o estilo de se vestir do mandatário venezuelano. A jaqueta esportiva estampada com a bandeira da Venezuela, usada por Chávez, também foi incorporada ao figurino do candidato opositor.

Os ”patrulheiros” chavistas, criados por Chávez para incrementar a participação de seus eleitores, também foi copiado por Radonski. Em sua campanha são chamados de ”comando tricolor” e cumprem a mesma função: angariar votos.

Motoqueiro místico

Para o analista político Carlos Romero, a estratégia de Radonski está equivocada porque parte da premissa de que a maioria da sociedade venezuelana é de esquerda. ”Isso não é assim. Na Venezuela, há um importante setor conservador que não verá com muito agrado que ele reforce seu perfil à semelhança de Chávez”, afirma Romero à BBC Brasil. ”Na decisão final, o eleitor opta pelo original, não pela cópia”, acrescentou.

As ”coincidências” também alcançam o lado espiritual. De origem católica, Radonski incorpora a seus discursos referências a Deus e às santas padroeiras da Venezuela. Há ocasiões em que Radonski exibe um rosário pendurado no pescoço. Chávez usa um escapulário e desde que foi diagnosticado com câncer, incrementou o misticismo religioso no gabinete chavista.

Assim como Chávez, o governador opta por dispensar o motorista quando participa de atos públicos. Muitas vezes foi visto sozinho, dirigindo sua moto, rumo à comícios ou inauguração de obras.

Capriles Radonski também quer mostrar uma ruptura com o passado. Foi o único do grupo de pré-candidatos que não compareceu ao velório do ex-presidente Carlos Andrés Perez, cujo corpo foi sepultado na semana passada em Caracas. “Ele não quer mostrar nenhum vínculo com a classe política conservadora”, afirmou Romero.

Para os especialistas, a vitória do candidato opositor nas primárias dependerá da capacidade de mobilização das bases da oposição e do apoio dos tradicionais partidos Ação Democrática (social-democrata) e Copei.

O passo seguinte, será enfrentar Chávez, que viu sua popularidade subir mais de 10 pontos em dois meses, alcançando 58%, o maior índice desde 2006. ”Quem quiser ganhar, não só terá de imitar Chávez e sim superá-lo”, afirmou o analista politico Nicmer Evans.

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Um comentario para "Venezuela: surge um adversário para Chávez"

  1. Matheus disse:

    Às vezes eu tenho a impressão de que os colaboradores do “Outras palavras” esquecem o que está em jogo na Venezuela, preferindo expressar opiniões excêntricas para demonstrar “independência e não fascinação por Chavez”. O regime constitucional-democrático venezuelano sofreu um golpe violento, mas fracassado, em 2002, e uma greve patronal que quase destruiu de vez a economia do país em 2003. Se não recordam, Salvador Allende também sofreu uma campanha golpista semelhante, e creio que os motivos são semelhantes: a nacionalização de setores estratégicos da economia do país, estatização de empresas monopolistas e reforma agrária e urbana. Guardadas as diferenças de personalidade, organização partidária e contexto histórico-geográfico, ambos souberam conquistar o governo por via eleitoral e mobilizar as camadas populares para um projeto redistributivo e socializante, o que pressupõe a expropriação de propriedades capitalistas privadas, tanto dos grupos multinacionais quanto das tradicionais oligarquias nacionais e locais. Isso explica porque a oligarquia venezuelana conspira junto com a elite norte-americana para derrubar o regime democrático-constitucional da Venezuela: querem pôr as mãos sobre as empresas e recursos naturais estatizados e sobre os cargos políticos. E lançam mão de todo tipo de crime, da calúnia sistemática ao assassinato e ao golpe de Estado para alcançar seus objetivos. Esse Rodonsky me lembra muito Collor: um oligarca reacionário da pior espécie de corrupto e autoritário, que apoiou o golpe de 2002 da mesma forma que Collor era um filhote da ditadura, e que aparece como o “salvador da pátria”, com discurso pseudoesquerdista e referências ao Lula, o ex-operário (e atual empresário e político) amado pela burguesia européia e norte-americana por ter desmobilizado os movimentos populares autônomos do Brasil e assegurado os fabulosos lucros capitalistas que o saque do patrimônio público e a exploração de mão-de-obra barata proporcionam ao capital imperialista e aos seus sócios brasileiros.

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