Fora da mídia, mas forte nas ruas

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Por Moxphere

A imprensa tradicional precisa acordar para as novas mobilizações políticas e sociais. Se não, pode perder o bonde da história e cair em descrédito

A mídia tradicional ainda está longe de dar a atenção que o #occupywallstreet merece. Como sempre acontece, os jornalistas têm medo de anunciar uma revolução que não veio, especialmente se essa revolução quer que muitos anunciantes dos meios em que trabalham (leia-se, praticamente todo o sistema bancário) sejam pendurados na ponta de uma corda. Por isso, depoimentos de jornalistas que “admitem” a importância do evento mas têm críticas à sua objetividade são muito mais comuns do que declarações explícitas de apoio (que têm vindo de personalidades inesperadas, como o presidente do FED, Ben Bernanke). O ponto é que #occupywallstreet não precisa mais da mídia e azar dela se não se der conta disso.

No final dos anos 70, os jornalistas de São Paulo ameaçaram entrar em greve. Embebidos por um momento do país (que lutava contra uma ditadura burra e violenta, mas que seus patrões tinham amplamente endossado), mas também por uma fundação ideológica capenga e por uma liderança com miopia pesada, levaram a categoria a perder completamente o poder. Os donos de empresas se deram conta de que poderiam contratar quem quer que fosse para escrever em seus jornais e revistas. Quando os jornalistas se deram conta de que seus empregos estavam indo para o saco, a greve se esvaziou – assim como o poder da categoria, graças à gestão politizada do sindicato, que preferiu tentar fazer uso político da greve do que atender os interesses da categoria. Resumindo: os jornalistas deram aos patrões a prova de que não eram fundamentais (que tem como consequência duradoura a equiparação do diploma jornalístico a lixo).

A mídia tem sido tímida em reconhecer que #occupywallstreet é muito mais do que um protesto do PSTU contra o imperialismo. É um movimento que brota da indignação. Como todo movimento realmente genuíno (sem a interferência falastrona de políticos ou apresentadores sensacionalistas), não há uma declaração cristalina de objetivos. As pessoas só sabem que querem que os banqueiros sejam presos ou, ao menos, responsabilizados pelos crimes que levaram à crise de 2008. Não há, ainda, um manifesto como o Manifesto Comunista, de Karl Marx, por exemplo. Mas vai haver.

A posição de desdém da mídia tem várias razões. Uma delas é que o jornalista atual, nas redações, está treinado somente para os fatos que ele vê chegando no feed da agência de notícias. Os jornais não têm mais recursos para manter um newshound, um jornalista que sai às ruas para sentir o cheiro da noticia. O jornalistas chega na redação e tem uma lista de pautas que seu editor preparou para ele do conforto de sua poltrona. A pergunta chave é “Quem é que deu?” (jargão jornalístico para “quem publicou isso?”). Se ninguém deu, não aconteceu. Então é só mais uma bobagem.

Outra razão para matérias, como uma da capa da Folha, que diz que o movimento não diz a que veio, é que o jornalista em geral se coloca como mero espectador – mas não é. No caso, o artigo da Folha não leva em conta nem o que está acontecendo, até porque a mídia ainda teima em não prestar atenção no “5° Estado”, na mídia social. Num programa de TV americano, um debate deu o tom de quais as demandas do movimento (vale a pena ler a matéria ou ver o vídeo). Todas as demandas são claras: cadeia para os banqueiros envolvidos nas fraudes, fim da influência de Wall Street nas políticas econômicas, maior atenção às políticas sociais. Se elas não estão escritas na pedra, é porque Moisés não tem Twitter ou perdeu o Blackberry quando atravessou o Mar Vermelho. Ou então porque o jornalista quer uma frase de efeito.

Caso a mídia não se dê conta de que esse é um movimento extremamente poderoso e que está tomando as ruas no mundo, vai fazer como os jornalistas fizeram na década de 70: vai provar que, na verdade, ninguém precisa dela. A mídia tradicional vai entender que ela não é a censora das notícias, mas sim uma ferramenta para informá-las. Se ela não se der conta, como qualquer ferramenta que não funciona, vai para o lixo. Aliás, já está indo.

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