Coronavírus: a Quarentena de Wuhan

Aeroporto fechado. Estações de trem bloqueadas. Rodovias patrulhadas pela polícia. Na cidade chinesa de 11 milhões de pessoas, foco do novo vírus, casos chegam a 600. Leia também: Guarani Kaiowá indenizados por chuva de agrotóxicos

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Por Maíra Mathias e Raquel Torres

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QUARENTENA EM WUHAN

Onze milhões de pessoas. O número – que equivale ao total de habitantes de países inteiros, como Bolívia e Cuba – se refere à população da cidade chinesa de Wuhan que, desde ontem, está sob quarentena decretada pelo governo. Ou seja, ninguém pode sair sem justificativa e aprovação. O aeroporto da cidade foi fechado, as estações de trem bloqueadas e as rodovias estão sendo patrulhadas pela polícia. Os moradores de Wuhan correram aos supermercados para estocar comida, deixando estoques vazios, segundo a Reuters.  

Os números do vírus de Wuhan cresceram bastante de ontem para hoje: na contagem oficial do governo chinês, eram nove mortos; agora são 17. O número de casos confirmados passou de 440 para 571. E os casos suspeitos chegaram a 393. Mas, ontem, o Colégio Imperial de Londres soltou novo relatório estimativo que conclui que, a essa altura, o número de casos em Wuhan deve ter chegado a quatro mil. 

Fora da China, são oito casos confirmados: quatro na Tailândia e Japão, Coreia do Sul, Taiwan e EUA tem um cada. Ontem, México e Rússia divulgaram que investigam a infecção em seus territórios. E circulou a notícia de que também o Brasil estaria investigando seu primeiro caso do novo coronavírus em uma paciente internada em Belo Horizonte. Mas o Ministério da Saúde desmentiu

A Pasta explicou que a mulher não foi a Wuhan, única região onde a transmissão do vírus de pessoa para pessoa está ativa, de acordo com a OMS. E, por isso, não pode ser considerado um caso suspeito. Contudo, a paciente esteve em Xangai até semana passada, onde há casos da doença causada pelo vírus de Wuhan. Por enquanto, o governo brasileiro não tomou nenhuma medida em relação ao vírus, como a contenção em aeroportos, por exemplo. O problema já subiu consideravelmente na lista de preocupações da população. O Ministério afirma que há “monitoramento diário” da situação.

A OMS, por sua vez, decidiu adiar para hoje a decisão de decretar ou não o vírus de Wuhan como emergência internacional de saúde pública. O comitê de crise ficou horas reunido, e houve apresentação da situação pelo governo chinês que está sendo elogiado pela resposta ao problema – bem diferente daquela dada no surgimento da SARS, quando as autoridades não optaram pela transparência. Ontem, aliás, a vice-ministra de Saúde chinesa foi a Wuhan e encorajou os profissionais de saúde que estão na linha de frente a compartilharem todas as informações com o público. 

Enquanto isso, mais dados sobre o vírus chegam. O mercado de peixe, em que também se vende vida animal selvagem, continua sendo o principal palpite de onde a infecção em humanos começou. E alguns cientistas, através do sequenciamento genético e da comparação com outros coronavírus, suspeitam que o animal hospedeiro desta vez seria a cobra. Esse animal teria também adquirido o vírus do hospedeiro original, o morcego. 

Já o diretor do Centro de Controle de Doenças (CDC) dos EUA, Anthony Fauci, deu uma entrevista à Scientific Americanem que resume o que se sabe até agora sobre o novo coronavírus. De acordo com ele, as estimativas de mortalidade estão girando em torno de 2% – menos grave do que a SARS (10%) e do que a MERS (30-35%). O mais provável é que a doença seja transmitida por gotículas de saliva e o tratamento usado tem sido antibióticos e respiradores, nos casos mais graves, mas também antivirais ainda em fase de testes. 

TIBUNGO

O novo podcast de Outras Palavras estreou semana passada e, no segundo episódio, publicado ontem, conversamos com a procuradora do Tribunal de Contas de São Paulo, Élida Graziane. Ela falou sobre a radical proposta encampada pelo senador Marcio Bittar (MDB-AC) de desvinculação dos orçamentos mínimos da Saúde e da Educação. Na entrevista, a procuradora resgatou o histórico da vinculação de recursos e alertou: apenas em períodos autoritários de nossa história esse mecanismo não foi utilizado. Para Graziane, os pisos de investimento são cláusulas pétreas da Constituição Federal, e garantem que os dois direitos sociais sejam mais que simples promessas.

ÁGUA CANCERÍGENA

A população dos EUA está bebendo água contaminada por uma substância que tem sido associada a problemas graves como risco aumentado de câncer, disfunção do sistema imunológico, danos hepáticos, infertilidade e interrupção hormonal: os chamados  PFAS (compostos perfluoroalquil e polifluoroalquil), usados para criar produtos antiaderentes e a prova de manchas. Há anos essa é uma suspeita de pesquisadores, mas ela acaba de ser endossada por um novo estudo do Environmental Working Group (EWG). Foram analisadas 44 amostras de água de torneira em 31 estados e no Distrito Federal. Em apenas um local não foi detectada a presença de PFAS.

A matéria da Vice conta que a presença de PFAS na água é testada há tempos, mas, conforme os métodos se tornam mais sensíveis, tem havido um aumento na detecção dessa presença. A reportagem enfatiza que não há um limite legal obrigatório para essa substância e que o nível recomendado pela Agência de Proteção Ambiental do país (70 partes por trilhão) é considerado alto demais por especialistas. A boa notícia é que não é impossível recuperar a água. Uma vez estabelecido um limite legal razoável, há métodos eficazes de tratamento.

BIOMÁQUINAS

Juntando inteligência artificial e biologia, uma equipe de roboticistas e geneticistas produziu os primeiros ‘robôs vivos’ do mundo e publicou seu método no Proceecings of the National Academy of Sciences of the USA. O vídeo de dois minutos com o time-lapse do procedimento é impressionante. Os novos organismos não são exatamente robôs porque, apesar de programáveis, são totalmente feitos com tecidos vivos. Medem menos de um milímetro de comprimento, possuem entre 500 e mil células vivas e foram chamados de xenobots (‘xeno’ vem das células de sapo – Xenopus laevis – usadas na produção). “Eles podem se impulsionar em direções lineares ou circulares, unir-se para agir coletivamente e mover objetos pequenos. Usando sua própria energia celular, eles podem viver até 10 dias”, explica a matéria do SingularityHub. E não menos importante: eles também podem se reparar após serem danificados.

Não faltam possibilidades para futuras aplicações. Algumas boas – uso nos oceanos para coletar microplásticos, ou versões futuras construídas a partir de células de pacientes para reparar tecidos ou mirar tumores. Mas sempre tem riscos. Eles poderiam, por exemplos, ser usados para fins biológicos proibidos por leis internacionais, ou ainda simplesmente funcionar mal e acabar competindo com outras espécies.

PERDE A CURA GAY

O STF determinou o arquivamento de uma Ação Popular contra a resolução do Conselho Federal de Psicologia que veta aos psicólogos o oferecimento de qualquer prática de reversão sexual. Em abril do ano passado, a ministra Carmen Lúcia já havia concedido liminar determinando que se suspendesse a tramitação da Ação Popular, mas, agora, foi a decisão definitiva. A nota do CFP diz que “com a decisão, fica evidente que a Psicologia brasileira não será instrumento de promoção do sofrimento, do preconceito, da intolerância e da exclusão”.

FINALMENTE

Falamos aqui na semana passada que, em uma decisão inédita da Justiça, indígenas da comunidade Tey Jusu, da etnia Guarani Kaiowá, ganharam indenização por serem atingidos por uma chuva de agrotóxicos. Jornalistas da Agência Pública e da Repórter Brasil  conversaram com membros da comunidade e do Ministério Público e contam detalhes do processo. Como já comentamos por aqui, não é incomum que agrotóxicos sejam usados como armas para tentar expulsar indígenas de suas terras, e a terra onde fica a comunidade Tey Jusu é justamente marcada por confrontos em processos de demarcação. Mas os acusados chegaram a culpar os próprios indígenas: disseram que “os indígenas teriam se afastado da aldeia, a mais de 500 metros da área de aplicação, para adentrar a lavoura de milho bem na hora da aplicação”. Os laudos provaram que não: não só não havia ninguém na lavoura como a pulverização aconteceu muito perto de alguns barracos da comunidade (30 ou 50 metros de distância).

CABEÇA BRANCA

Ficar estressado pode mesmo deixar os cabelos brancos, segundo um estudo feito por pesquisadores da USP e de Harvard e publicado ontem na Nature. Por dois dias, os cientistas expuseram ratos em laboratório a um estresse intenso, gerado por dor aguda. Quatro semanas depois apareceram os pelos brancos nos bichos. A explicação é que há uma ligação entre o sistema nervoso e as células-tronco do bulbo capilar. Quando estamos estressados, é acionado o sistema sintático, conhecido como ‘sistema de luta e fuga’, que libera noradrenalina. Ela afeta as células-tronco, que, por sua vez, param de produzir as células responsáveis pelo pigmento.

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