Problema político, mas não de um político

Descuido com o Museu Nacional é uma questão política agravadíssima pela Emenda 95, mas não é exclusividade do governo Temer

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Descuido com o Museu Nacional é questão política agravadíssima pela Emenda 95, mas não é exclusividade do governo Temer. Essa e outras notícias aqui, em dez minutos.

04 de setembro de 2018

PROBLEMA POLÍTICO, MAS NÃO DE UM POLÍTICO

Após o incêndio que destruiu quase todo o acervo do Museu Nacional, no Rio, muitas instituições estão manifestando pesar e apoio. A Fiocruz lançou uma nota em solidariedade onde diz que “este lamentável episódio do incêndio do Museu Nacional nos remete à reflexão sobre as condições que afetam as políticas públicas de preservação do patrimônio histórico, da cultura, da educação e da ciência mas, além disso, o setor público como um todo”. E ainda que “não podemos assistir passivamente à destruição de políticas públicas gerada no rastro da PEC do Teto dos Gastos [que não é mais PEC, mas sim a Emenda Constitucional 95], em favor de interesses que flagrantemente geram cada vez mais concentração de renda, desemprego e abandono de setores estratégicos como a saúde, a educação e a ciência e tecnologia, fundamentais para a construção de um Brasil justo, democrático e soberano”. O Museu Histórico Prof. Carlos da Silva Lacaz da Faculdade de Medicina da USP também se expressou. E, também em nota, a Abrasco diz que “a orientação ultraliberal como a do atual governo certamente não é a única responsável pela tragédia, mas é certo que, se mantida, propiciará novos desastres desse tipo”.

Muito se tem falado sobre a relação entre o incêndio e o teto dos gastos de Temer. Vários políticos – como Boulos e Dilma Rousseff –  escreveram a esse respeito. Aqui no Outra Saúde denunciamos o tempo inteiro os efeitos da Emenda 95 e, de fato, o recurso disponível para a manutenção do Museu em 2018 é de longe o mais baixo dos últimos anos. Segundo a Folha, a redução do ano passado para este foi de impressionantes 85%. O orçamento, de pouco mais de R$ 500 mil, não tem sido repassado integralmente há tempos, mas  quanto ao que já havia sido liberado e usado este ano, diferentes veículos trazem valores distintos. A BBC diz que foram usados R$ 268,4 mil até agora; o Uol fala em pouco menos de R$ 100 mil; o El País fala em uma previsão de R$ 205.821 para todo este ano…

Verdade seja dita, o descuido com o Museu Nacional é uma questão política agravadíssima pela Emenda 95, mas não é uma exclusividade do governo Temer – antes dele a situação já era muito ruim. Segundo esta reportagem da BBC, em 2004 já havia o temor de o prédio pegar fogo. A matéria do El País tem um gráfico com a evolução do orçamento para a instituição ao longo dos anos. Houve um bom crescimento entre 2007 e 2010 (quando chegou a R$ 1,9 milhão), mas em seguida veio a queda, com um aumento só entre 2012 e 2013. A partir daí, só ladeira abaixo. Mesmo nos melhores anos, não era muita grana. A BBC a compara, por exemplo, ao gasto com o estádio do Maracanã, que consumiu cerca de R$ 1,3 bilhão na reforma que o preparou para a Copa de 2014.

Quem administra o Museu é a UFRJ, e também tem gente criticando a universidade. Como Carlos Marun, ministro da Secretaria de Governo, que ressaltou a autonomia que a UFRJ tem para executar seus orçamentos (mas dizendo não “culpar ninguém”). A secretária-executiva do Ministério da Fazenda, Ana Paula Vescovi, também falou na necessidade de “enfatizar a discussão sobre prioridades de gastos e de melhorias”.

Do outro lado, o pró-reitor de Planejamento e Finanças da UFRJ, Roberto Gambine, disse que a universidade não tem recursos suficientes para fazer a manutenção de seus 15 prédios tombados no Rio, e teme que o destino dos demais edifícios seja o mesmo do Museu Nacional. Este já é o 7º incêndio em prédios da UFRJ desde 2011, e só em 2018 já foram três. Em junho, houve um princípio de incêndio em uma ala desativada do Hospital Universitário.  A Eté checou as contas da UFRJ, cujo orçamento sofre cortes. Em 2015, as verbas da União autorizadas foram de R$ 341 milhões para o seu custeio e investimentos, mas  R$ 53 milhões não foram repassados à universidade. Em 2018, o orçamento caiu para R$ 282 milhões, com mais contingenciamentos anunciados. As verbas para investimentos caíram de R$ 51 milhões, em 2016, para R$ 6 milhões em 2018.

O VENENO ESTÁ DE VOLTA

Contamos aqui que a Justiça Federal de Brasília tinha suspendido, via liminar, a venda de produtos à base de glifosato; isso foi logo depois que a Monsanto foi condenada a pagar US$ 289 milhões a um homem que desenvolveu câncer após exposição continuada a um herbicida com a substância. Para lembrar: durante o julgamento, foram revelados e-mails indicando que a empresa sabia dos problemas de saúde causados pelo glifosato há muito tempo. Bom, a novidade por aqui é que o TRF-1 derrubou a liminar de Brasilia. Quem pediu a revogação foi a Advocacia Geral da União. O desembargador Kássio Marques entendeu que a suspensão do uso do produto caracteriza “grave lesão à ordem pública”.

A decisão foi celebrada por Blairo Maggi, ministro da agricultura. “Agora sim, a boa notícia”, tweetou ele, que estava ansioso. Tem motivos pessoais para isso, conta Cida de Oliveira, na Rede Brasil Atual. “Blairo Maggi é dono de um conglomerado que vai além do cultivo e exportação de soja. A Amaggi tem fazendas onde são cultivados ainda outros cereais, empresas de navegação, de energia e também de venda de agrotóxicos”. Um relatório do grupo mostra dados sobre a venda de agrotóxicos, que, mesmo tímida, é crescente: quase triplicou desde 2011.

“APEDREJAMENTO ANTECIPADO”

Foi como Kátia Abreu, líder do setor ruralista e vice de Ciro Gomes, se referiu ontem à divulgação pelo Ministério do Trabalho da lista de empregadores com denúncias de trabalho análogo à escravidão. “O sujeito não foi investigado”, disse à GloboNews. Um irmão dela já apareceu na lista. Na mesma entrevista ela se posicionou contra a CPMF, que “foi criada com a melhor intenção possível. Mas ela virou ad eternum e se tornou desnecessária e um engodo à população”. Ciro tem cogitado recriar a contribuição, que era destinada ao custeio da saúde.

EUFEMISMO DA FOME

Agência Pública publicou ontem um vídeo – e hoje sai outro – sobre a ‘fome oculta’. É que tem menos gente morrendo de fome no país, mas ao mesmo tem quem passe a vida inteira com fome e sem se dar conta disso: a chamada ‘insegurança alimentar’ é definida como “redução da quantidade de alimentos entre os adultos, ruptura nos padrões de alimentação devido a falta de alimentos, redução da quantidade de alimentos entre as crianças ou quando alguém fica o dia inteiro sem comer por falta de dinheiro”. Os vídeos mostram histórias de pessoas que sofrem insegurança alimentar grave.

A alimentação também está no Intercept, que destaca a concentração da produção de alimentos em poucas empresas. Ao todo, 50 companhias vendem metade da comida do mundo.

MORTALIDADE MATERNA

A Abrasco publicou um especial sobre o aumento da mortalidade materna e infantil no Brasil. São várias entrevistas, como a da médica especialista em Saúde Materna da Universidade Federal de Pernambuco, Sandra Valongueiro.De acordo com ela, o Estado deve ser responsabilizado pelas morbidades graves e mortes evitáveis. “No Brasil, em 2016, 98,3% dos partos e nascimentos foram hospitalares, supostamente sob a responsabilidade dos serviços e profissionais de saúde, destes, a maioria SUS. Ou seja, as mulheres e suas famílias ao buscarem os serviços de saúde como formas mais seguros de parir, confiam no Estado como instância de garantia de direitos à saúde, à vida e à maternidade segura. Por isso, este Estado deve ser responsabilizado pela ocorrência de morbidades graves e mortes maternas evitáveis. A cobrança dessa responsabilidade, no entanto, vem sendo feita timidamente por diversas razões, dentre essas, a não compreensão da condição de evitabilidade da morte materna, o já citado viés de gratidão, o medo de retaliação, principalmente em cidades pequenas, desconhecimento de como proceder e mesmo por descrédito nas instituições de direitos humanos no Brasil”.

INOVAÇÃO

A USP vai inaugurar um espaço de pesquisa em saúde, biologia e tecnologia chamado Inova USP. Segundo o Estadão, a ideia é ter “o olhar para fora” e no começo vão ser quatro grupos de pesquisa que trabalhem mais integrados, mas a matéria não dá muitos detalhes sobre o funcionamento. Um dos grupos é a Scientific Plataform Pasteur, em parceira com o Instituto Pasteur, francês, que vai estudar doenças infecciosas e processos degenerativos.  “Também queremos transformar o conhecimento em aspectos de valor para a sociedade, gerando patentes”, diz um dos membros. Ainda vai ter um laboratório de games e soluções digitais com “pesquisas sobre jogos – os de brincar e os ‘sérios’, usados em treinamentos de saúde – e uma fábrica do futuro, para testar novas tecnologias no fluxo produtivo”: “Buscamos convênio com várias empresas. Elas trazem alguma coisa e se beneficiam do ambiente de ensino e pesquisa”, diz seu coordenador.

DE VOLTA

A discussão sobre planos de saúde com coparticipação e franquias não acabou. Você certamente lembra que, um mês atrás, a ANS publicou uma norma pra regulamentar os pagamentos extras que poderiam ser feitos consumidores para procedimentos, e, depois de muitas críticas, a revogou. Pois  hoje a Agência realiza uma audiência pública no Rio sobre o tema. E, também hoje, a Comissão de Assuntos Sociais do Senado vai fazer audiência pública sobre os reajustes nos planos individuais e familiares.

ABRASCÃO

Revista Radis deste mês traz as discussões do 12º Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva, que aconteceu no fim de julho no Rio.

DEPRESSÃO E SUICÍDIO NA PM

Um estudo realizado pelo Grupo de Estudo e Pesquisa em Suicídio e Prevenção entrevistou 19 mil PMs em 2018 – mais de 600 tinham tentado suicídio e mais de três mil tinha cogitado a ideia.

ACONTECEU

Como adiantamos ontem, o presidente da Argentina Mauricio Macri de fato acabou com o Ministério a Saúde, que virou uma secretaria subordinada à de Desenvolvimento Fiscal.

PRORROGAÇÃO

A campanha de vacinação contra pólio e sarampo foi prorrogada até dia 14 de setembro.

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