O mal dos recuperados
O que dizem os dados ingleses sobre “covid longa” – e quais as suas limitações
Publicado 25/06/2021 às 08:16
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Um estudo feito pelo Imperial College de Londres com dados de 500 mil ingleses traz uma perspectiva bem impressionante quanto às sequelas de longo prazo da covid-19: segundo as estimativas feitas a partir da pesquisa, mais de dois milhões de ingleses sofrem ou sofreram a chamada ‘covid longa’. Para se ter uma ideia do que isso representa, ao todo o país registrou pouco mais de quatro milhões de infecções até hoje.
Os participantes foram questionados se haviam tido uma infecção sintomática e se tinham experimentado, por 12 semanas ou mais, algum entre 19 sintomas ligados ao vírus, como fadiga contínua, falta de ar, perda de memória , problemas de concentração, insônia, dor no peito e tontura. Entre as 76.155 pessoas que disseram ter tido covid-19 sitnomática, 37,7% confirmaram pelo menos um sintoma duradouro, e quase 15% disseram ter experimentado três ou mais desses efeitos.
Outro estudo semelhante, feito pelo departamento de estatística do Reino Unido (ONS) havia encontrado cerca de um terço da prevalência: de acordo com ele, 741 mil ingleses teriam covid longa. É uma diferença bem grande, que, segundo especialistas, é explicada pelo uso de metodologias distintas. Por exemplo, a pesquisa da ONS estimou o número de pessoas que tiveram covid longa em uma data específica (2 de maio), enquanto o do Imperial College quis ver quantas experimentaram o problema em algum momento entre setembro e fevereiro.
De todo modo, esse tipo de trabalho oferece bons elementos para desmanchar a narrativa furada de que ter “milhões de recuperados” é algo bom. Mais que isso, eles ajudam também a se ter uma ideia do impacto que a covid-19 pode ter nos sistemas de saúde.
Mas ambas as pesquisas têm limitações bastante relevantes. A divulgada ontem foi feita com base em perguntas cujas respostas podem não ser muito exatas. Os participantes tinham que dizer se acreditavam ter tido covid-19, mas não era necessário comprovar. E seus relatos não dão conta da gravidade dos sintomas relatados, portanto não dá para saber o quanto suas vidas foram afetadas por eles.
Além disso, talvez um dos pontos mais importantes dos dois estudos seja o fato de que não houve nenhuma comparação com um grupo de perfil semelhante que não tenha tido covid-19 – essa limitação em especial, que poderia ter um impacto muito grande nos resultados, tem sido pouco ressaltada na imprensa. “Alguns dos sintomas listados surgem com bastante frequência em pessoas que nunca tiveram covid-19, porque podem ser causados por muitas doenças diferentes”, nota Kevin McConway, professor emérito de Estatística Aplicada da Open University, no Science Media Centre.
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