Números do IBGE indicam volta ao Mapa da Fome

Insegurança alimentar grave volta a crescer e atinge 10,3 milhões. Problema no campo é quase duas vezes maior que nas cidades. Nos lares onde há mais fome, mais de metade são chefiados por mulheres

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O número de brasileiros enfrentando insegurança alimentar grave subiu 43,7% em cinco anos. Segundo dados do IBGE divulgados ontem, em 2018 havia 10,3 milhões de pessoas nessa situação, contra 7,2 mil em 2013. Mais de um terço da população – 84,9 milhões – morava em casas com algum grau de insegurança alimentar em 2018, e esse foi o maior percentual registrado desde 2004, quando o levantamento começou a ser feito. Dos lares onde havia fome, mais da metade eram chefiados por mulheres. E, zonas rurais, a insegurança alimentar grave é muito mais preponderante do que nas cidades, com quase metade das famílias do campo vivendo com algum grau de insegurança – nessa população, a insegurança alimentar grave atinge 7,1%, contra 4,1% no meio urbano. 

Essa é a primeira vez em que houve queda nos níveis de segurança alimentar no Brasil. Em 2004, 65,1% da população  dizia ter acesso garantido à alimentação. O número foi crescendo e chegou a 77,4%, em 2013., mas em 2018 caiu para 63,3%. Como a desigualdade regional é a regra, no Norte esse percentual foi de apenas 43% e, no Nordeste, 49,7%. Nas demais regiões é muito diferente: 79,3% no Sul, 68,8% no Sudeste e 64,8% no Centro-Oeste. 

Tem mais: os dados são da Pesquisa de Orçamentos Familiares, que não inclui pessoas em situação de rua. Ou seja, o quadro deve ser ainda pior.

Os números gerais são a confirmação de que o Brasil voltou ao Mapa da Fome, segundo Francisco Menezes, pesquisador do Ibase e ex-presidente do Consea (o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional). O Mapa inclui países onde mais de 5% das pessoas ingerem menos calorias do que o recomendável. Como a população em 2018 estava estimada em 207,1 milhões, esse é justo o percentual que os 10,3 milhões de brasileiros com fome representam. 

E isso antes da pandemiaNos últimos meses, o auxílio emergencial certamente melhorou a situação de muitas famílias, nota o pesquisador. Só que ele não é eterno. Quando acabar, há grande risco de termos um cenário ainda pior do que o de 2018, até porque garantir acesso a alimentos não é uma preocupação recorrente de Jair Bolsonaro. “Em julho do ano passado o presidente declarou que quem falava de fome no Brasil estava pregando uma mentira. E nós respondemos na ocasião, ‘vamos discutir isso a partir da divulgação dos dados’. E os dados chegaram (…) Isso mostra que não adianta tentar fingir que o problema da fome não existe. O problema existe e tem que ser enfrentado com seriedade”, diz Menezes, no Valor

Por falar em alimentação, a notícia sobre o ataque do Ministério da Agricultura ao Guia Alimentar para a População Brasileira repercutiu fortemente, e a Aliança pela Alimentação Adequada e Saudável lançou um manifesto opondo-se à revisão proposta. Ele pode ser assinado aqui.

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