Ministério da Saúde será comandado por bolsonarista indicado por 01
Flávio Bolsonaro suplantou Centrão e emplacou o cardiologista Marcelo Queiroga na pasta mais importante da Esplanada
Publicado 16/03/2021 às 07:32
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O cardiologista Marcelo Queiroga será o quarto ministro da saúde do Brasil na pandemia. Jair Bolsonaro anunciou sua escolha ontem, pouco depois da reunião que teve com o médico no Palácio do Planalto. A notícia foi dada após assessores do presidente espalharem para a imprensa que mais postulantes ao cargo seriam recebidos ao longo da semana, o que sempre tem o condão de fazer os jornalistas parecerem pouco confiáveis.
Também foi de forma fiel ao seu estilo que Bolsonaro divulgou a decisão: em conversa com apoiadores plantados no Palácio da Alvorada, transmitida pelo canal bolsonarista no YouTube Foco do Brasil. Afirmou que Marcelo Queiroga “tem tudo para fazer um bom trabalho”. De que forma? “Dando prosseguimento em tudo o que o Pazuello fez até hoje.” Pois é.
No figurino de ministro, Queiroga foi bem menos contundente do que havia sido na véspera, quando concedeu entrevista à Folha. No domingo, ele disse que não era favorável ao uso da cloroquina para o tratamento da covid-19 – e destacou que a Sociedade Brasileira de Cardiologia, entidade que até então presidia, não recomendava a prescrição.
Depois da conversa com Bolsonaro, saiu-se com essa, em entrevista à CNN Brasil: “Existem determinadas medicações que são usadas, cuja evidência científica não está comprovada, mas, mesmo assim, médicos têm autonomia para prescrever”, afirmou, emendando que se deve chegar a “um ponto comum”.
Sobre lockdowns, Queiroga disse que não podem ser “política de governo” e há “outros aspectos da economia para serem olhados”. Segundo o colunista Beto Bombig, alguns secretários estaduais de saúde e governadores estão esperando o apoio do novo ministro às quarentenas. Já a colunista Camila Mattoso ouviu de secretários a avaliação de que Queiroga é “um gente boa”.
Marcelo Queiroga fez campanha para Jair Bolsonaro em 2018. Depois do resultado do primeiro turno, elogiou o então candidato nas redes sociais: “patriota, homem simples, espirituoso e acessível”. Meses antes, havia tomado café da manhã com ele e seu filho mais velho, Flávio Bolsonaro, ocasião na qual colheu essas impressões.
“Sobre a classe médica e suas demandas, o Jair diz que sempre votou a favor da categoria e que frearia a abertura indiscriminada de escolas médicas e a importação ilegítima de ‘médicos’ cubanos“, escreveu. O entusiasmo lhe rende um lugar na equipe de transição do governo e, mais tarde, uma indicação para a diretoria da ANS, que não foi concretizada por conta da pandemia.
O senador pelo Republicanos teve uma boa dose de influência na escolha do sucessor de Pazuello. Segundo o Estadão, tanto Queiroga quanto a concorrente, Ludhmila Hajjar, dividem a diretoria da Sociedade Brasileira de Cardiologia com o sogro de Flávio: Hélio Roque Figueira.
Sobre a sucessão em si, restam muitas dúvidas sobre as bases em que vai ocorrer. Queiroga é bolsonarista, disso não há dúvida. Mas será que estará disposto a se queimar para cumprir o script negacionista do presidente? Será que será tutelado, como foi Nelson Teich? Por enquanto, ele encontrará um ministério sob ocupação militar.
Na entrevista coletiva na qual admitiu que estava de saída do cargo, Eduardo Pazuello abusou das imagens de guerra para vender a ideia de que uma substituição completa terá consequências.
“A manobra mais difícil que temos de planejamento militar é substituição em posição, que é quando você está com sua tropa posicionada ou no ataque ou na defesa e você precisa substituir aquela tropa sem perder a impulsão ou sem perder a capacidade de defender”.
“Precisamos ver qual é a equipe que vai montar e se o governo lhe dará espaço e apoio”, resumiu uma figurinha conhecida nos meios empresariais da saúde, Francisco Balestrin, ao Valor.
Outros médicos ouvidos pela Folha acreditam que Queiroga vai seguir as ordens de Bolsonaro – e colocam em dúvida inclusive sua afirmação de que não é favorável ao uso de cloroquina. “O dr. Marcelo sempre foi bolsonarista, defensor da hidroxicloroquina e vai fazer tudo o que Bolsonaro mandar”, disse um cardiologista de São Paulo. “Nada muda. Assim como Pazuello, Queiroga não tem preparo para a função e vai seguir a cartilha de Bolsonaro“, afirmou outro especialista.