Insegurança e medo na atenção primária à saúde

Nova publicação da Editora Fiocruz traz retrato tocante dos profissionais da Saúde na batalha contra a covid-19. Leitura imperdível para entender o SUS e os ingentes desafios à sua frente

Foto: reprodução do Facebook
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Muito impressionante o perfil dos profissionais da saúde apresentado no novo e-book lançado essa semana pelo Observatório Covid-19 Fiocruz e a Editora Fiocruz. O retrato dos agentes comunitários de saúde – que também dá nome a este texto – é especialmente tocante. “Essa é uma classe extremamente afetada durante a pandemia, com adoecimento, estresse e também com o desafio de aprender a lidar com algo tão novo”, afirma Margareth Portela.

Ela é organizadora do e-book Covid-19: desafios para a organização e repercussões nos sistemas e serviços de saúde, junto com Lenice Gnocchi da Costa Reis e Sheyla Maria Lemos Lima, todas pesquisadoras da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca. O livro, uma coletânea, agrega análises, experiências e reflexões para tempos tão desafiadores. O volume é o quarto da série Informação para Ação na Covid-19, e está disponível para download gratuito na plataforma SciELO Livros. Apesar dos 30 capítulos escritos por 159 autores, o livro não pretende ser exaustivo, diz Margareth. Ele tem um caráter documental.

“Também nos leva a pensar em lições para experiências futuras que possamos vir a enfrentar ou mesmo aspectos que talvez precisemos ajustar na rotina dos serviços de saúde”, diz a pesquisadora. Entre as imensas dificuldades enfrentadas pelos trabalhadores da saúde, a experiência de medo e insegurança dos que ficaram na linha de frente – os mais de 2 milhões de trabalhadores que, na expressão dos autores, prestaram assistência a uma multidão de contaminados, vivenciando óbitos num ritmo insustentável.

À frente de todos vêm os agentes comunitários, que atuam na chamada Atenção Primária à Saúde, muitas vezes em áreas de favelas. O livro apresenta um estudo abrangente, de escala nacional, realizado em 2020 sobre essa categoria (composta por cerca de 269.000 trabalhadores, conforme se lê aqui). Os agentes têm papel de realce, aponta o texto, porque podem atuar na sensibilização da população sobre ações de saúde para mitigar o risco de comunidades pobres se tornarem grandes focos de disseminação.

A categoria é predominantemente feminina, de alta escolaridade, com idade entre 40 e 45 anos, e pelo menos metade dela trabalha no SUS há mais de 13 anos. O estudo aborda as múltiplas fontes de insegurança que os abatem, inclusive por perceberem que não sensibilizam a população tanto quanto deveriam. Ficam muito inseguros, por exemplo, quanto há baixa adesão da população das favelas ao distanciamento social. Quando a adesão é alta, a insegurança cai de 90% para menos de 80%. Quase 90% deles afirmaram que exerciam as atividades com insegurança.

Mais amenas, as seções iniciais do trabalho fazem um panorama geral do enfrentamento da covid no Brasil e em outros países e descreve a organização do cuidado e dos serviços na pandemia. Também analisa condições dramáticas de um universo de desafios: do desabastecimento de medicamentos, dos extremados esforços de vacinação, da custosa disponibilidade de leitos de terapia intensiva, dos efeitos da violência social sobre a saúde e tantos outros.

É como bem ponderou Margareth Portela: “o Brasil tem um quadro em que problemas crônicos foram exacerbados, e também em que novos problemas ficaram evidentes dentro de um contexto político muito difícil”.

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