Governo Trump afeta financiamento de OMS e Opas

Saída dos Estados Unidos da Organização Mundial da Saúde é protocolada. Decisão pode afetar financiamento da Organização Pan-Americana, que sofre com atrasos de vários países, incluindo Brasil

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A SAÍDA DOS EUA

Os Estados Unidos ultrapassaram ontem os três milhões de casos conhecidos de covid-19. No mesmo dia, o governo Donald Trump notificou formalmente as Nações Unidas sobre a saída do país da Organização Mundial da Saúde. O aviso foi enviado pelo secretário de Estado, Mike Pompeo, e estabelece que a retirada se dará em um ano, no dia 6 de julho de 2021. Ainda não está claro como (e se) isso vai acontecer. Especialistas em Direito argumentam que a decisão precisa passar pelo Congresso, num debate que pode se estender por meses – e não vingar. 

Mesmo parte dos republicanos são contra a medida. No mês passado, quando o presidente já ensaiava a saída, alguns deles pediram que reconsiderasse a ideia. Entre os democratas, obviamente a oposição é maior. “O Congresso recebeu a notificação de que o presidente está oficialmente retirando os EUA da OMS em meio a uma pandemia. Chamar as ações de Trump contra a covid-19 de caóticas e incoerentes não lhes faz justiça. Isso [a saída] não protegerá vidas ou interesses norte-americanos – mas vai deixá-los doentes e sozinhos”,  tuitou o senador Robert Menendez. Joe Biden prometeu reverter a situação caso vença a eleição presidencial.

Os Estados Unidos são os maiores financiadores da OMS (uma posição que sempre dividem com a Fundação Bill & Melinda Gates), injetando cerca de US$ 400 milhões na entidade todos os anos. Há, com razão, o receio de que sua saída acabe com o financiamento de importantes iniciativas. Mas, se recentemente Trump começou a justificar seu embate com a OMS por uma suposta má atuação durante a pandemia, a verdade é que antes disso ele já vinha desidratando a relação. O financiamento destinado ao organismo este ano deve ser só metade dos US$ 553 milhões estimados em 2019. Além disso, os EUA estão devendo cerca de US$ 200 milhões.

A OMS ainda pode se segurar em outros países que, diante dessa situação, começam a liberar mais verbas, como a Alemanha. Mas segundo a reportagem do Health Policy Watch, o maior problema deve ser a sobrevivência da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), o escritório regional da OMS nas Américas, que já vai muito mal – mais especificamente, está  “à beira da falência”, como descreveram três de seus assessores técnicos numa carta recente publicada na Lancet. Os países-membros acumulam juntos mais de US$ 160 milhões em dívidas com a entidade. Só do Brasil, são US$ 24,2 milhões.

Dois terços da verba da Opas, cujo orçamento é separado do da OMS, vêm dos EUA. Talvez o país decida manter os pagamentos, mas nem isso seria um alívio: nesse caso, é possível que o dinheiro passe a vir com restrições, fazendo com que a adminsitração da Opas precise se alinhar às políticas estadunidenses – o que teria resultados catastróficos para países como Cuba e Venezuela, ou ainda para a ações relacionadas à saúde sexual e reprodutiva, por exemplo. 

AINDA NÃO

Após cobranças de parte da comunidade científica, a OMS reconheceu ontem que estão surgindo “evidências” da transmissão do novo coronavírus pelo ar. Mas tudo indica que ainda não vão ser emitidas, por enquanto, novas diretrizes sobre o assunto. Segundo a organização, é preciso ter mais provas. “Temos que ser abertos a essa evidência e entender, ao mesmo tempo, suas implicações nas formas de transmissão e nas precauções que devem ser adotadas. Estão surgindo evidências, mas elas não são definitivas. A possibilidade de transmissão aérea em espaços públicos, principalmente em ambientes com ventilação inadequada e grandes aglomerações, não pode ser descartada”, disse a líder técnica da OMS no controle de infecções, Benedetta Allegranzi.

Na mesma direção, Soumya Swaminathan, cientista-chefe do organismo, pediu cautela: “Todo nosso trabalho faz parte de um processo bem estabelecido, claro que estamos melhorando este processo. Fazemos uma revisão sistemática das evidências e isso demora, pois temos um grande número de estudos. É um método estatístico para ver em que direção as evidências apontam, mas as evidências nem sempre estão em concordância com estudos anteriores, temos especialistas. Agora, precisamos ver quais são os dados e ver a direção específica”.

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