Edição genética de bebês ainda é arriscada, aponta comissão

Grupo, porém, não descarta uso futuro. Críticos apontem que debate não pode ser apenas técnico

Foto: Reprodução / The He Lab
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Quem não se lembra do biofísico He Jiankui, que no fim de 2018 anunciou a criação dos primeiros bebês geneticamente modificados? Esse foi certamente o experimento mais controverso dos últimos anos e, não à toa, levou o cientista e dois colegas à prisão. Mas abriu de vez a porta para outros semelhantes (“Onde você já viu um pesquisador disposto a desacelerar?“, questionou no ano passado o biólogo russo Denis Rebrikov, após anunciar que não aguardaria protocolos internacionais para orientar sua pesquisa com a edição de óvulos humanos). 

O caso He Jiankui e seus inevitáveis desdobramentos na ciência motivaram a criação da Comissão Internacional sobre o Uso Clínico da Edição do Genoma Humano Germinal, com especialistas de vários países convocados pela Royal Society do Reino Unido, a Academia Nacional de Medicina dos EUA e a Academia Nacional de Ciências dos EUA. Ontem, após mais de um ano de investigações, o grupo divulgou um grande relatório

A comissão destaca que, no momento, os métodos de edição genética ainda não são seguros o suficiente para uso em embriões humanos, porque podem gerar alterações indesejadas e produzir resultados diferentes, mesmo entre células dentro do mesmo embrião. Isso está longe de ser resolvido. Quando for, diz o documento, as técnicas podem vir a ser usadas para evitar que distúrbios genéticos sérios sejam transmitidos – mas, mesmo então, isso deveria ser inicialmente restrito a um conjunto restrito de circunstâncias: doenças genéticas graves causadas por variantes de DNA em um único gene. 

Algo nada trivial é que o relatório se debruça sobre questões científicas e técnicas, e quase nada sobre as éticas. “Há um risco de que isso seja percebido como: ‘Se temos esse foco em questões científicas e técnicas, isso significa que já tomamos [eticamente] a decisão de ir em frente com isso”,  preocupa-se Jackie Leach Scully, bioética da Universidade de New South Wales em Sydney, no site da Nature. E essas questões, estão, definitivamente, em aberto. “A sociedade deve se perguntar até onde quer chegar e onde está a linha entre a cura e o melhoramento da espécie humana. Evitar o nanismo, por exemplo, seria cura ou melhoramento?”, pondera, no El País, o jurista Federico de Montalvo Jääskeläinen, presidente do Comitê de Bioética da Espanha.

Outro relatório, coordenado pela Organização Mundial da Saúde, deve tratar mais sobre ética. Está previsto para sair no fim deste ano. 

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