CPI: clima quente e confusão

Líder do governo na Câmara, Ricardo Barros não só mentiu à CPI como acusou a Comissão de dificultar a compra de vacinas. Sessão foi encerrada antecipadamente e senadores vão consultar STF

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Por Leila Salim

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O clima esquentou tanto ontem, no depoimento de Ricardo Barros à CPI da Covid, que a sessão foi encerrada antecipadamente. Os senadores avaliaram que o líder do governo Bolsonaro na Câmara mentiu em mais de uma ocasião e decidiram consultar o Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o que fazer quando um depoente que é parlamentar falta com a verdade diante da comissão. O deputado voltará à CPI na condição de convocado (quando a presença é obrigatória), e não mais convidado. 

Barros, envolvido até o talo nas denúncias de irregularidades na compra de vacinas, optou pelo contra-ataque: chegou seguro à oitiva e não pareceu se constranger ao levantar categoricamente argumentos frágeis em sua defesa. Minimizando as acusações sobre o caso Covaxin, disse que o aparecimento de seu nome nas acusações é um mero “mal-entendido”.

Segundo ele, Bolsonaro teria sido induzido a citar seu nome na famigerada conversa com o deputado Luis Miranda (DEM-DF), na qual o parlamentar alega ter alertado o presidente sobre a pressão atípica para o fechamento do contrato para compra da Covaxin. Barros  disse que o deputado abordou Bolsonaro tendo em mãos uma reportagem que trazia uma foto sua. “Ele, Luis Miranda, levou ao presidente a minha fotografia numa matéria do caso Global e, provavelmente, é a esse fato que o presidente se referiu”, disse. A versão de Miranda, já bastante conhecida, é bem diferente: ele relata que Bolsonaro teria “olhado em seus olhos”, entendido a gravidade da situação e, espontaneamente, mencionado Barros. 

O tom subiu ainda mais quando o líder de Bolsonaro na Câmara acusou a CPI de dificultar a compra de vacinas, o que irritou os senadores da oposição. Ele chegou a exemplificar – e ser prontamente desmentido – com a farmacêutica chinesa Cansino, que, segundo ele, “não tem mais interesse em vender [imunizantes] para o Brasil”. Pouco depois, o vice-presidente de negócios da Cansino afirmou ao Valor que a empresa continua interessada em fechar contrato com o Ministério da Saúde. 

Também contraditória foi a fala de Barros sobre a ação por improbidade administrativa ajuizada contra ele em 2018, quando ainda estava à frente do Ministério. Na época, um contrato com a empresa Global deixou desamparados pacientes que dependiam do recebimento regular de medicamentos para sobreviver. Ao menos 14 pessoas morreram, quando, por falta de registro legal, a Global não entregou os remédios contratados pelo Ministério da Saúde. Mesmo assim, a pasta pagou R$ 19 milhões à empresa. Depois de longo atraso, os medicamentos foram entregues apenas parcialmente. 

Para lembrar: a Global pertence a Francisco Maximiano, que também é dono da Precisa Medicamentos, a empresa que está na mira das investigações do caso Covaxin. Quando questionado, Ricardo Barros apenas afirmou que as mortes em questão não estavam relacionadas ao desabastecimento de medicamentos. Uma resposta, no mínimo, frágil.

O coletivo Aliança Rara, que reúne associações e movimentos de apoio a pessoas com doenças raras, divulgou nota repudiando as declarações de Barros e o responsabilizando pelas vidas perdidas. “​​O ex-ministro joga sobre os pacientes a responsabilidade por esse custo e nós o responsabilizamos pela morte de dezenas de pessoas com doenças raras por conta dos atrasos na compra e entrega de medicamentos, em ostensiva desobediência a sentenças judiciais​”, diz a nota.

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