Resenha Semanal
10 a 17 de maio 2019. As manifestações contra os cortes da Educação mudaram o cenário político e podem indicar uma virada de jogo – e talvez a queda de Jair Bolsonaro.
Publicado 17/05/2019 às 13:57 - Atualizado 17/05/2019 às 14:22
A semana fechou com uma sensação que pode ser apenas uma miragem: o governo vai cair e os ratos já abandonam o navio. Parece que caminhamos para um duelo final da rebelião do baixo clero militar e policial contra a hierarquia… O Olavo prometeu se calar, o Globo praticamente pediu a renúncia do Coiso em editorial, o Estadão também, a Folha bombou a manifestação estudantil, o Congresso deu rasteira e propiciou a humilhação (verdadeira ou só digital) de Weintraub no Congresso, Mourão posou de democrata, Dória e Rodrigo Maia desautorizaram o presente regime nos EUA para uma plateia de investidores, o MBL e o Antagonista apartaram-se do seu filho o capitão, a Procuradoria do Rio de Janeiro explosivamente abriu o sigilo bancário de Flávio Bolsonaro e dezenas de pessoas, incluindo assessores de Jair, Moro aparentemente amuado com a perda da COAF e preguiça do Planalto em passar seu projeto no Congresso… Tudo isso tem causa: a espetacular manifestação nacional contra Bolsonaro e a favor da Educação. Pode ter sido a gota d’água geral.
Claro que há enorme hipocrisia em todos esses atores. As qualidades de Jair Bolsonaro e de seu governo estavam amplamente evidentes durante a campanha. A Justiça sabia das movimentações de Flávio Bolsonaro desde antes da eleição. A prisão política de Lula propiciou o Coiso. Todos sabiam e participaram da demonização do PT e da esquerda. Até o autor dos termos “petralha” e “apedeuta” agora escreve: “Bolsonaro serviu como uma espécie de prova dos noves para testar convicções realmente liberais. Havia muitos que disfarçavam a condição de reacionários delirantes vestindo esse uniforme. Nesse particular sentido, ele serviu para tirar muita gente do armário”.
Para a velha esquerda, um enorme alívio e lágrimas agradecidas à juventude que fez a oposição à extrema-direita sair da bolha e atingir a sociedade.
Permanece, é claro, a dúvida sobre o que virá depois. Isolar a extrema-direita é bom, mas ser reprimido com mais inteligência ou eficiência depois é ruim. Mas acho que quanto mais traumática a queda e transição, melhor: a divisão das direitas exigirá compromissos públicos relevantes. E a incerteza decorrente pode muito bem abrir brechas inesperadas. Esgarçar e gargalhar! Bailar na tempestade!
Além disso, uma transição traumática vai permitir uma explosão daquele grito que está difícil reprimir:
Resta verificar se a mágica dessa nova direita dita populista depende ou não de seus cúmplices liberais e tucanos. Saber se Bolsonaro de fato detém o baixo clero militar contra os generais, as polícias contra os governadores, se ele consegue fazer de seus robôs corpos nas ruas…
Na dúvida, seguir a juventude!
Hoje, dia 17 de maio, a Ocupação 9 de Julho recebeu ordem de reintegração. A situação é grave e urgente, eles pedem toda a ajuda que puderem mobilizar. A ocupação é em prédio público, e é onde atua Carmem Silva. O lugar é palco de incrível experiências de convivência: eles recebem refugiados, um bazar de roupas, uma biblioteca comunitária, uma brinquedoteca, espaço para exposições, uma cozinha comunitária (todo domingo está aberta ao público em geral), uma oficina de marcenaria onde constroem seus próprios móveis. Esta ocupação fez uma escolha estratégica que a colocou no centro da política urbana de São Paulo: aproximou-se das classes criativas e coletivos de arte e de ativistas. Checa em https://www.facebook.com/cozinhaocupacao9dejulho/ e também https://outraspalavras.net/blog/morar-questao-de-direito-e-resistencia/
Apoie, ajude e chegue junto!
10 de maio
Ontem o ministro da educação, Abraham Weintraub, apareceu em uma live de Bolsonaro para explicar os cortes na educação: trouxe bombons. Há uma celeuma acerca dos repasses federais obrigatórios e os não, se o cálculo dos cortes recaem sobre a totalidade do orçamento ou só sobre os repasses não obrigatórios. O ponto é que os cortes foram justificados como punição a “gente pelada” no campus. Começou como guerra cultural, agora é tarde para mudar a justificativa para o campo gerencial.
A deputada carioca Renata Souza na ALERJ denunciou o governador Witzel na ONU e OEA. Ela está sendo ameaçada e querem cassar seu mandato.
Uma mulher que foi baleada durante uma ação da Guarda Civil Metropolitana de São Paulo na região da Cracolândia, região central de São Paulo. Ela morreu hoje.
13 de maio
Bolsonaro diz que fechou com Moro durante a campanha fazê-lo ministro do STF. Para a esquerda, fica evidente a mancomunação da Lava Jato com projetos políticos reacionários. É mais uma evidência do caráter político da prisão de Lula. Em tempos normais, ou em ambientes democráticos, isso seria o suficiente para rever a prisão política de Lula. Mas vai demorar ainda. Moro negou que tenha imposto condição para ser ministro. Afirmou, à época, que aceitara o cargo apenas para combater a corrupção. A imprensa especulou muito se foi uma queima de Moro por parte de Bolsonaro, que, ao antecipar o prêmio do STF, teria exposto o ex-juiz prematuramente, neutralizando um rival à reeleição.
Na direita, essa franqueza não é muito esmiuçada, mas para quem ainda acha que precisa parecer democrata (Reinaldo Azevedo), Moro vai sendo desmascarado como um arrivista do baixo clero indevidamente endeusado para fins de destruição do PT.
Talvez uma iminente queda de Bolsonaro tenha atiçado apetites presidenciais de vários atores, incluindo o ex-juiz…
A direita ficou em chamas com uma notícia de demissão do general Santos Cruz de seu cargo na secretaria do Governo. Mas, na real, um decreto presidencial deu novos amplos poderes ao general: cabe a ele agora avaliar a “conveniência e oportunidade administrativa” da nomeação ou indicação dos reitores das universidades federais, embaixadores, secretários-executivos e ocupantes de cargos de confiança…
O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro determinou a quebra do sigilo bancário do senador Flávio Bolsonaro , do ex-policial militar Fabrício Queiroz e de quase uma centena de funcionários do gabinete do filho presidencial e de empresas que fizeram negócios com o agora senador. Foram 493 dias para que a Lava Jato e Sérgio Moro condenassem Lula, o que o levaria à prisão em 2018 e o impediria de disputar a eleição contra Bolsonaro. No caso Queiroz, foram necessários quase 500 dias para que, enfim, fosse autorizada a quebra do sigilo bancário de Flávio Bolsonaro e Queiroz. A Justiça sabia de tudo ANTES DAS ELEIÇÕES.
O bloco de mulheres Ilú Obá de Min saiu no centro da cidade, por ocasião do 13 de maio, que foi a controversa libertação dos escravos pela escravocrata princesa Isabel. Eu não fui, mas C foi e disse que foi incrível.
14 de maio
Mais um episódio da saga dos Moristas arrependidos: Gilberto Dimenstein se retratou do apoio que deu a Sérgio Moro. “E pensar que eu arrumei briga com amigos por defender esse sujeito. E escrevi que ele era um dos heróis nacionais. Desculpa, desculpa, desculpa”.
Bem, obrigado Gilberto, mas Lula continua preso por sua causa. “Foi mal” não basta, agora precisa trabalhar para reparar o seu estrago. Juro que nem vou jogar na sua cara aquele meu
Temer foi solto, sua prisão é ilegal. Falta o mesmo procedimento para Lula…
Com faixa com o rosto da vereadora Marielle Franco, assassinada por milicianos no Rio de Janeiro, e gritos de “parem de nos matar”, os integrantes do movimento negro entraram no plenário da ALERJ durante a sessão. Os apoiadores da homenagem feita por Eduardo Bolsonaro e Luis Phillipe de Orleans e Bragança chamaram a manifestação de “vitimismo” e “mimimi”. Além disso, o endogamista imperial declarou que a escravidão está no DNA da humanidade.
Weintraub foi convocado a explicar os cortes no Congresso, no mesmo dia das manifestações… deve ferver. Saiu agora que Bolsonaro mandou, por telefone, o ministro suspender os cortes – disse o líder do PSL na Câmera. Mas a Casa Civil desmentiu. Confusão e desmentidos…
Rodrigo Maia disse que a extrema-direita ainda não mostrou seu projeto, para uma plateia americana de investidores.
15 de maio
Hoje foi o dia das grandes manifestações contra os cortes da Educação. Tivemos atos em todas as capitais do país, e entre um e dois milhões de pessoas saíram às ruas. Foi incrível e mudou a pauta da politica nacional, provocando um realinhamento tanto das forças oposicionistas como daquelas que vinham até agora apoiando o governo Bolsonaro.
Meu relato: https://outraspalavras.net/gavinadams/2019/05/16/diario-grande-ato-pela-educacao/
As milícias digitais do clã Bolsonaro tentaram inundar as redes com imagens e vídeos associando a atividade universitária a nudez, drogas e desperdício. Uma contraofensiva encheu as redes de depoimentos pessoais de acadêmicos mostrando sua produção, o que parece ter neutralizado o esgoto.
Weintraub falou no Congresso: não acompanhei ao vivo, mas as notícias e posts posteriores conseguiram colocar o evento como fracasso e bagunça. Até Miriam Leitão falou mal.
16 de maio
O representante do World Affairs Council, em Dallas, nos Estados Unidos, Jorge Baldor, negou ter convidado o presidente Jair Bolsonaro para ser homenageado na sede da entidade hoje. “Ele mesmo se convidou e Bolsonaro não vai receber um prêmio”, afirmou, contrariando o que disse o Palácio do Planalto. Além disso, o prefeito de Dallas, Mike Rawlings, avisou que, além de não dar as boas vindas a Jair Bolsonaro, não participaria de nenhum evento com o capitão reformado. O ex-presidente americano G. Bush também não o esperava, a despeito da foto que o Coiso publicou. O melhor comentário veio de Guilherme Boulos:
Além disso, muita piada com sua gafe (de Jair) “Brasil e EUA acima de tudo”.
A direita está divida frente ao estrondoso sucesso das manifestações de quarta-feira. A ofensiva bolsonarista nas redes não funcionou. Depois, a direita tentou outra estratégia, em que tenta defender que os atos foram restritos a grupos de esquerda e que não foram “verdeamarelas”. As avaliações em geral foram de que os atos conseguiram romper a barreira da bolha de esquerda e chegar em um setor muito plural da sociedade. Essa é a avaliação inclusive de lideranças da direita.
José Dirceu volta à prisão.
17 de maio
O impeachment do presidente “entrou no radar” político e parece que é um dos assuntos mais comentados to twitter. Nassif, Folha e Reinaldo Azevedo falam abertamente nisso. Será que a “Ooperação Mourão” começou?
Repercute a demissão do presidente do INEP, Anísio Teixeira. O órgão é do ministério da educação, o Instituto de Nacional de Pesquisas Educacionais. Ele teria se recusado a abrir dados pessoais de estudantes, coletados pelo INEP, que o MEC pedia para fazer carteirinhas.
Li agora que o cantor de extrema-direita Lobão se posicionou contra Bolsonaro e está arrependido, depois de ter criticado Olavo de Carvalho…
Quais seriam as palavras mais adequadas nessa hora? Talvez: Lobão,
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