O que é o Urbicídio? Uma leitura crítica

No século XX, guerras se “urbanizaram” — e Direito Internacional avalia tornar ataques à patrimônios culturais e históricos crimes contra a Humanidade. “Novo” conceito poderia banalizar a tipificação de genocídio? Como punir a destruição de cidades?

Saravejo, 1922
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Em setembro de 2018, o Brasil perdeu uma das suas joias culturais, o Museu Nacional do Rio de Janeiro e, em abril de 2019, a França assistiu à destruição do emblema de Paris e da nação, a catedral Notre-Dame de Paris. Essas novas “catástrofes culturais”, usando a expressão da professora francesa especialista da história da arte1, espantaram e entristeceram o planeta. A transmissão ao vivo, durante intermináveis horas, da ação do fogo em ambos os patrimônios da humanidade e a emoção mundial que esses incêndios provocados pela imprudência e negligência suscitaram, demonstram que estamos apegados ao que estampa a história, a memória, a cultura, a identidade da humanidade, em resumo, a dignidade dos seres humanos. Esses sentimentos de indignação e de desespero se acentuam quando a destruição do nosso patrimônio é o fruto de um ato deliberado, como acontece nos tempos de conflitos armados, quando os bens culturais se tornam alvo prioritário dos beligerantes.

A sociedade internacional, em particular sua componente civil, vítima dos atos deliberados de tentativa de aniquilamento da sua cultura, mobiliza-se para despertar a consciência dos representantes dos Estados a respeito da gravidade da situação e refletir sobre como reagir de maneira eficaz para prevenir o desmoronamento do patrimônio e sobretudo punir os que cometeram infrações contra a herança cultural do gênero humano. Já houve várias iniciativas no campo jurídico que merecem nossa atenção2. Desde os tempos remotos, o direito humanitário foi pioneiro em criar um arsenal normativo rematado, visando preservar os bens culturais em tempo de guerra. A fundação da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura – Unesco, depois da 2ª Guerra Mundial – evento histórico, um símbolo, diante do vandalismo, a pilhagem e a destruição em grande escala de cidades históricas –, constituiu também um grande avanço para a concretização dos instrumentos internacionais existentes, a elaboração de novos diplomas legais e a extensão da proteção dos bens culturais no tempo de paz. Esta organização internacional elaborou, por exemplo, a lista do patrimônio em 1972, que está em constante atualização. As jurisdições penais internacionais que surgiram depois da queda do Muro de Berlim – inspirados pelo Tribunal de Nuremberg, que julgou os crimes nazistas – efetivaram as normas internacionais que visam conservar os bens culturais. Existem hoje vários julgamentos condenando carrascos por terem cometido crimes de guerra ou crimes contra a humanidade ao deliberadamente destruírem o patrimônio da humanidade3. No entanto, esses avanços merecem, segundo uma corrente doutrinária, serem aperfeiçoados, para tornar a luta contra a devastação dos bens culturais uma prioridade.

Este artigo visa iniciar uma reflexão sobre a proposta doutrinária de promover um novo crime, que consiste em destruir deliberadamente o patrimônio cultural e histórico de um povo, ao patamar mais elevado das infrações internacionais, para oferecer uma proteção melhor aos bens culturais. Alguns jurisinternacionalistas sugerem não mais se contentar em apenas incluir a ruína do patrimônio cultural como elemento de um dos crimes internacionais elencado no Estatuto de Roma de 1998; militam em prol da concepção de um crime sui generis, o “crime de urbicídio”. Esta proposta merece ser apresentada e analisada de maneira crítica. Na perspectiva de descobrir como o conceito “urbicídio” surgiu e de defini-lo (cap. 1), realizou-se uma pesquisa qualitativa, bibliográfica e documental, com enfoque na literatura estrangeira, baseada em procedimentos metodológicos comparativos e históricos. A partir deste estudo preliminar, foi iniciada uma análise crítica deste novo conceito: foram ressaltadas suas vantagens em comparação com os outros crimes internacionais e destacadas as vicissitudes que criam potenciais obstáculos a sua posteridade, como novo crime no rol do Estatuto de Roma (cap. 2).

1. Evolução histórica e definição do conceito “crime de urbicídio”

Na Idade Média e até o século XVIII, a guerra de sítio era fundamental. Porém, na época de Clausewitz e de Napoleão, as modalidades dos conflitos mudaram: era o tempo do “levante em massa”4 e das batalhas-flashes (relâmpagos) e depois das grandes lutas sociais. O exército era responsável por manter a ordem nas cidades, mas preferia usar seus armamentos cada dia mais industrializados em palco de operação que permitia seu desdobramento, longe da população civil, no campo. Os estrategistas da Primeira Guerra Mundial evitaram os combates urbanos. Sem dúvida, os da Segunda teriam preferido evitar também, mas algumas cidades começaram a se tornar cidades simbólicas da guerra na Rússia, como Leningrado5. As operações contra centros urbanos alemães e japoneses, no final do conflito, instigam perguntar se a “guerra para a cidade” não se transformou doravante em “guerra na cidade”. A partir dos anos 80, a guerra se “urbaniza”, segundo a expressão de Jean-Louis Dufour6. Ao comentar os acontecimentos em Sarajevo, durante a guerra na ex-Iugoslávia, atacada das alturas rurais circundantes, Aleppo, a capital da Chechênia, aniquilada pelos russos, ou os territórios palestinos ocupados pelos israelenses, começamos a ler na literatura científica ou jornalística, ou ouvir na boca dos políticos as expressões “guerra contra a cidade” e “urbicídio”.

Antes de definir o complexo conceito em gestação, de urbicídio (b), é necessário entender em que contexto histórico ele surgiu (a).

a) Evolução histórica do conceito “urbicídio”

Não existem ainda textos normativos consagrando o crime específico de urbicídio. A ideia, no patamar internacional, surgiu após o ataque direto, em 1993, contra a ponte de Mostar, na Ex-Iugoslávia, alvo de bombardeios, posto que não representava nenhum caráter militar, não abrigava munições, não tinha nenhum valor castrense estratégico. A explosão pelos talibãs fanáticos, dos budas monumentais de Bamiyan, estátuas de 38 e 55 metros erguidas no século V da nossa era, provocou, em 2001, a adoção de uma resolução pela IV Comissão da UNESCO7. Abalada pelo desaparecimento total de obras, fruto de uma extraordinária fusão artística de várias culturas que testemunhavam a riqueza cultural afegã, a organização internacional, sediada em Paris, convidou os Estados permanentes do Conselho de Segurança da ONU a lutar de maneira mais eficaz contra a demolição propositada dos tesouros da humanidade. Uma das recomendações foi conceber um novo crime internacional, o “crime contra o patrimônio comum da humanidade”, para facilitar a condenação dos responsáveis de ações predatórias pelos tribunais internacionais.

Não há dúvida de que a inclusão de um quinto crime internacional no rol do Estatuto de Roma8 promoveria a tutela do patrimônio cultural como uma nova grande prioridade da sociedade internacional. Outra proposta para tornar mais eficaz a aplicação das normas seria, segundo o mesmo documento, dar mais poder ao Diretor Geral da Unesco para informar ao Secretário Geral das Nações Unidas quando o patrimônio comum da humanidade for ameaçado de destruição intencional, a fim que ele possa, por exemplo, propor medidas necessárias para proteger os bens histórico-artísticos. Sabemos que somente o Conselho de Segurança goza de legitimidade para adotar medidas militares, além das de natureza diplomática, política, econômica, no âmbito internacional. Somente em dezembro de 2012, o principal órgão das Nações Unidas refere-se, em uma das suas resoluções, ao patrimônio da humanidade. Ele condenou, no conflito maliano (guerra civil que começou em 2012 com a insurreição de grupos salafistas jihadistas e independentistas denominados Azawad), as violações dos direitos humanos pelos grupos islâmicos radicais, assim como “a pilhagem, o roubo ou a destruição dos sítios culturais e religiosos”9. Com certeza, essas organizações internacionais foram influenciadas pelas ideias difundidas pela sociedade civil internacional (intelectuais, ONGs, juristas etc.), preocupada com a urgência em salvar o patrimônio histórico-cultural em perigo.

A repetição dos fatos de vandalismo intencional pelos grupos jihadistas de obediência islâmica – fúria guerreira que sempre existiu na história da humanidade, porém, fenômeno novo, acompanhada por uma divulgação em grande escala como meio de propaganda e de terrorismo10 –, levou uma parte da doutrina a pensar em adaptar o direito penal internacional à evolução dos modos de conflitos armados. Assim, à luz da criação do genocídio pela Convenção sobre a Prevenção de Repressão do Genocídio de 1948, da tentativa doutrinária de positivar o “crime de ecocídio” nos anos 6011, o “crime de urbicídio” emergiu na literatura nos anos 90, período ilustrado pelas guerras que ocorreram na ex-Iugoslávia. Todavia, o conceito entrou na posteridade só recentemente.

Um grupo de historiadores de arte, arquitetos e jornalistas12 manifestaram sua aflição com uma nova dimensão dos problemas humanitários: o aniquilamento da identidade do inimigo pela destruição dos seus monumentos e lugares de culto que acompanham os assassinos, a fome, os sofrimentos e os êxodos. Cinco arquitetos que assistiram à destruição planejada da capital da Bosnia-Herzegovina, em 1991 e 1992, decidiram testemunhar e alertar o mundo sobre os acontecimentos com uma exposição itinerante que eles batizaram “Warchitecture13 – Urbicide Sarajevo”14. Foi apresentada, por exemplo, no Museu de Arte Moderna Contemporânea de Paris, no Centre Georges Pompidou em 199415. A ONG francesa Groupe, Reportage Etudiants, Environnement, Sociétés – GREES, associada ao projeto dos arquitetos precitados Midhat Cesovic, Borislav Curic, Nasif Hasanbegovic, Darko Serfic e Sabahundin Spilja, explica o uso do neologismo na época:

Porque se o assassinato de um povo é chamado de genocídio, a destruição de uma cidade e o que está acontecendo em Sarajevo pode sim ser chamado de urbicídio. (…) O urbicídio é óbvio, e é isso que estão tentando mostrar estes cinco arquitetos reunidos na associação multiétnica de arquitetos da Bósnia-Herzegovina e Sarajevo Das-Sabih. (…) Esta é uma das realidades da guerra na Bósnia e, mais geralmente, na ex-Jugoslávia. Claro que esta não é a única, mas esta guerra é marcada, entre outros crimes, pelo desejo de destruir as cidades e o que elas representam, para melhor aniquilar o inimigo. Osijek, Vukovar, Zadar, Mostar, Sarajevo … a lista é longa. Os sérvios querem matar a cidade porque ela encarna a civilização, a multietnicidade, as trocas. E Sarajevo entre as cidades do mundo goza de um lugar especial: “Com Jerusalém, Sarajevo é a única cidade do mundo que mistura tantas culturas e religiões diferentes”, explica Midhat Cesovic. Em Sarajevo, há uma catedral católica ao lado de uma sinagoga, de uma grande mesquita e de uma igreja ortodoxa. É o ponto triplo do encontro entre três grandes placas da civilização: o cristianismo ortodoxo grego, o catolicismo e o islamismo. (trad. nossa)

Essa nova terminologia foi rapidamente difundida nos discursos políticos e na mídia. O neologismo “urbicídio” começou a ganhar fama em particular na fala do arquiteto e professor Bogdan Bogdanovic16, um dos maiores oponentes ao regime ultranacionalista de Milosovic, acusado pelo Tribunal Penal para a ex-Iugoslávia antes de morrer e antigo prefeito de Belgrado. Assim, após a mutilação da futura capital da Bósnia-Herzegovina e diante da vergonhosa capitulação da comunidade internacional, o jornal francês Le Monde em maio de 199417 interpelou a opinião pública: “L’urbicide, le mémoricide, le nettoyage ethnique resteront-ils impunis ? Aucun tribunal international ne jugera-t-il jamais les auteurs de ces délits de lèse-humanité?” [“O urbicídio, o memoricídio, a limpeza étnica ficarão impunes? Nenhum tribunal internacional jamais julgará os perpetradores desses crimes contra a humanidade?”]. Hoje, várias obras científicas18 fizeram eco a este conceito que necessita ser definido juridicamente.

b) Definição jurídica do conceito de urbicídio

O termo “urbicídio” foi fabricado seguindo o modelo do conceito de “genocídio” idealizado por Raphael Lemkin em 194419. Sua etimologia é límpida: do latim urbs, cidade e caedere, destruir, matar; “urbicídio” significa então destruição da cidade. O primeiro uso registrado da expressão “urbicídio” foi feito na obra do prolífico autor britânico de ficção científica, Michael Moorcick, na novela “Elric: Dead God’s Homecoming”, publicada em 196320. Os norte-americanos de obediência marxista em geral usaram, a partir da década dos anos 60, este conceito para se referirem à reestruturação urbana (ou destruição), como o Bronx em Nova York, que tinha como efeito operar uma reconversão agressiva sobre a experiência social urbana21. Foi depois dos acontecimentos de Sarajevo, na década 90, que o neologismo abraçou outra realidade. Esse novo conceito designa uma realidade antiga, quer dizer, as violências que visam a destruição da cidade22, não na condição de objetivo estratégico, mas na condição de identidade urbana. Para retomar a expressão bastante eficaz de Paul Virilio23 – urbanista, sociólogo e filósofo francês que viveu os bombardeios da sua cidade Nantes na sua infância, em 1943 –, a estratégia da nova guerra, hoje, é uma estratégia anticidade. O espaço urbano tornou-se alvo não apenas por motivos estratégicos, mas sobretudo pelos significados que ele incorpora: identidade, valores sociais e culturais. O conceito compartilha com o de “genocídio” a ideia de purificação, limpeza étnica, aniquilamento. Porém o primeiro não centra sua atenção sobre o ser humano como objeto direto da destruição, como o segundo o faz. A cidade é o símbolo do que é detestado: a polis encarna o lugar de civilização, o centro de poder a ser derrubado, o epicentro de encontros, de trocas entre as populações. Este acordo entre populações de diferentes comunidades que forjam um modo de morar baseado no multiculturalismo ou cosmopolitismo, em valores sociais e culturais torna-se um alvo para os beligerantes que buscam promover uma única identidade da sua comunidade e aniquilar os “geosímbolos”24 do encontro entre as populações e terminar com o “komsiluk” (boa vizinhança)25. O urbicídio é um crime complexo: além de uma grade de análise que se refere somente aos fatores étnicos, religiosos e linguísticos, demonstra que os conflitos são também o fruto de lutas entre urbanos e rurais, entre dois modos de morar opostos que não se entendem26. O apagamento da cidade do mapa não visa exclusivamente, como foi o caso durante toda a história da humanidade, ganhar a batalha ou a guerra e desmoralizar o inimigo27; objetiva instaurar uma supremacia também cultural sobre o inimigo, o “Outro”. Se, na cidade, se concentram os poderes econômicos, os centros de informação, os locais estratégicos, há uma densidade populacional que a torna vulnerável; nela também são sediados os monumentos que refletem uma identidade, uma história, uma cultura a serem apagadas da memória.

Não é à toa que alguns locais são visados pelos bombardeios ou ataques por explosivos. O geografo Rémi Baudouï sublinhou assim como o incêndio da biblioteca de Sarajevo, em agosto de 1992, testemunhou no plano simbólico da raiva que animava os militares sérvios o intuito de acabar com a “cultura do Outro”28. A ponte de Mostar, que ligava dois bairros étnicos diferentes, um bosniano e o outro croata, tornou-se alvo privilegiado também dos bombardeios sérvios. Essa folia assassina irracional, esse “meurtre rituel des villes”29 caracteriza também as exações dos grupos como os talibãs, Al Qaeda no Magrebe Islâmico-AQMI, Ançar Eddine e o Grupo Estado Islâmico (ISIS, segundo o acrônimo inglês) relatados acima. Ponto comum que podemos salientar à leitura dos discursos dos líderes dos beligerantes, ultranacionalistas ou jihadistas, que rejeitam a identidade do inimigo, é a necessidade de apagar as cidades consideradas “impuras”.

Vale destacar que, no Afeganistão, no Mali ou na Síria, no século XXI, os beligerantes privilegiaram o ataque do patrimônio do inimigo aos alvos políticos, econômicos ou militares estratégicos. Em razão da facilidade de derrubar e surrupiar os bens culturais? Ou em razão do forte simbolismo que as estátuas, museus, sítios arqueológicos, mausoléus ou manuscritos representam? Segundo François Chaslin, no seu livro Um ódio monumental30, a resposta é óbvia: “O conflito na ex-Iugoslávia expressa um ódio ao monumento, uma vontade de destruir tudo que participa de uma história comum” (trad. nossa).

Por estas razões, muitas vezes, os traços deixados pelos eventos de guerra nos tecidos urbanos estão carregados de fortes valores simbólicos e a fase de reconstrução torna-se um momento de reescrever a paisagem da memória da cidade. Os projetos de intervenções de restauração, reconstrução ou demolição pós-guerra são, nessa perspectiva, a expressão de narrativas coletivas que estabelecem uma relação cada vez diferente entre a cidade, o evento de guerra e sua memória31.

Uma vez contextualizado e definido, resta analisar de maneira crítica a contribuição do novo crime à teoria do direito penal internacional.

2. Vantagens e desvantagens do novo conceito “urbicídio”

Uma reflexão preliminar sobre o risco da criação de um novo crime pode suscitar, na teoria do direito, uma comparação entre os crimes preexistentes e o novo crime de urbicídio.

2.1. Efeitos nocivos da inflação normativa

Entendemos a intenção dos defensores da criação de um novo crime internacional suscetível de tornar o Tribunal Penal Internacional (TPI) competente: conscientizar a comunidade internacional da extrema gravidade da pulverização da identidade de uma população através de seu patrimônio; insistir também sobre o efeito profilático da consagração de um crime ao acentuar, dramatizar esse caráter grave de todos os atos predatórios para acabar com essas atrocidades. Porém não podemos negar as vicissitudes próprias que surgem quando se cria um novo conceito. Como delimitar precisamente as fronteiras deste crime em gestação? Como atender melhor o princípio de legalidade? Esse crime pode realmente ser considerado um crime internacional capaz de fundar a competência da jurisdição criminal internacional? Não é redundante com os outros crimes internacionais? De modo mais geral, quais são os critérios para avaliar a relevância da constituição de novos crimes internacionais? Sem pretensão de exaustividade, podemos citar as propostas recentes de criação de infrações relativas à proteção dos indivíduos e dos povos (escravidão, apartheid, discriminação racial, tortura…), as relativas aos espaços e ao meio ambiente (ecocídio, pirataria, poluição, espaciocídio32…), as relativas à proteção do Estado, das organizações internacionais e de seus agentes (atos de terrorismo33…) ou as relativas às trocas internacionais (tráfico de entorpecentes, luta contra a corrupção internacional ou contra os paraísos fiscais…), as econômicas e financeiras34 etc.35. Todas são legítimas e dignas de atenção, porém não contribuem para inflação normativa criminal? Este crescimento exagerado não tem o risco de banalizar o crime internacional e finalmente tornar a luta contra a impunidade ineficaz?

Ao acolher todas essas propostas, chegaremos a uma hipótese de “non-droit”, quer dizer, a hipótese extrema da inefetividade do direito que seria a “ausência de direito em um determinado número de relações humanas onde a lei tinha a vocação teórica de estar presente”36, descrita pelo renomado sociólogo de direito francês, Jean Carbonnier, no meio do século passado. Tanto a escassez de direito quanto sua proliferação podem aniquilar ele mesmo, “como a serpente que se devora pela cauda. Em um imenso número de casos, ele devora fenômenos legais, neutraliza sua juricidade”37. Essa neutralização pela banalização já foi debatida e denunciada a respeito da qualificação quase sistemática dos massacres de população em genocídio (como foi feito para caracterizar os crimes na ex-Iugoslávia nos anos 90, no Darfur no Sudão, em Israel nos anos 2000 ou da juventude negra brasileira atualmente)38.

Em resumo: positivar o crime de “urbícidio”, seria o meio ruim para alcançar um bom objetivo? Precisa-se trivializar os crimes internacionais para “enobrecer” a destruição em massa do patrimônio da humanidade que assola atualmente várias regiões do mundo vítimas da ação de grupos obscurantistas ou de Estados visando nelas impor sua hegemonia? Essas questões merecem uma reflexão aprofundada para conciliar de maneira satisfatória a efetividade jurídica e a luta contra a impunidade.

Uma vez levantado o risco ligado à criação de um novo crime internacional, podemos questionar a sua relevância.

2.2. Comparação do crime de urbicídio com os crimes internacionais positivados

Na jurisprudência dos tribunais penais internacionais ad hoc e do TPI, a destruição deliberada dos bens culturais foi assimilada aos crimes contra a humanidade e aos crimes de guerra. Vale então desenhar as semelhanças e diferenças entre esses crimes.

Os crimes de urbicídio e os crimes contra a humanidade ou de guerra apresentam elementos comuns: visam aniquilar o inimigo e constituem atos de violência coletiva. Porém existem distinções profundas e intrínsecas. No crime contra a humanidade ou de guerra, os valores protegidos dos atos subjacentes visam diretamente a pessoa e, além disso, a espécie humana, como atentados à vida sob a forma de assassinato ou homicídio, atentados à integridade física e mental e à liberdade de deslocamento (sequestros e raptos). O crime de urbicídio é antes de tudo um crime direcionado contra o Estado. Mesmo se ele visa civis que vão sofrer na sua carne, visa de maneira colateral os símbolos do modelo combatido: a potência comercial e financeira, a supremacia militar, o poder político, o patrimônio cultural, através de um impacto simbólico e um grande choque midiático. Nota-se que o criminoso da humanidade ou de guerra busca eliminar os rastros das suas monstruosidades. Ao inverso, os responsáveis pelo urbicídio usam plenamente dos meios de comunicação para divulgar seus crimes. A violência contra o patrimônio, nesses últimos anos, foi teatralizada no intuito de melhor difundir o terror diante das populações visadas, e a reivindicação torna-se um elemento necessário. Parece que os bens são interesses jurídicos protegidos pelas duas incriminações, porém isso fica marginal para o crime contra a humanidade ou crime de guerra. O crime de urbicídio entende resguardar, tanto a pessoa humana quanto os bens da humanidade e os dos Estados. Enfim, o crime contra a humanidade ou de guerra só pode ser cometido por um Estado, enquanto os atos de urbicídio podem ser realizados por particulares para seus próprios interesses39.

Essas diferenças poderiam justificar a razão de ser do novo crime. Porém, do ponto de vista pragmático, sua concretização traz mais perguntas que soluções.

Com efeito, uma discussão a ser resolvida, por exemplo, é de determinar quais seriam os elementos da sua definição a serem comprovados para punir o crime de urbicídio. As evoluções da jurisprudência do Tribunal Penal para a ex-Iugoslávia – TPII corroboram a dificuldade quanto à qualificação do crime (crime de guerra ou crime contra a humanidade?) e quanto aos critérios exigidos para determinar se houve ou não um crime contra o patrimônio da humanidade.40 Em vários julgamentos, o TPII, de maneira solene, condenou os atos visando o patrimônio cultural41. No “caso Kordic”, julgado em 26 de fevereiro de 2001, o ato de demolição e degradação de edifícios consagrados à religião ou à educação, quando tal ato é perpetrado deliberadamente, foi equiparado a um ato de perseguição, posto que equivale a: “um ataque contra a identidade religiosa própria de um povo. Assim, o Tribunal exemplifica a noção de crime contra a humanidade, pois deste fato, é a humanidade no seu conjunto que é afetada pela destruição de uma cultura religiosa específica e dos objetos culturais vinculados”42. No “caso Miodrag Jokic”, o julgamento de 18 de março de 2004 puniu, mais uma vez, esses atos bárbaros de hostilidades contra o patrimônio cultural nesses termos: “O bombardeio da velha cidade de Dubrovnik (classificada na lista da UNESCO) constituiu um ataque não somente contra a história e o patrimônio da região mas também contra o patrimônio cultural da humanidade”43. No julgamento de 3 de março de 200044, T. Blaskic foi acusado por ter atacado o patrimônio cultural do inimigo. No entanto, o tribunal ad hoc entendeu de maneira restritiva o artigo 3° al. d). Foi estabelecido que o dano ou a destruição precisam ser cometidos de maneira deliberada contra edifícios claramente identificados como consagrados à religião ou ao ensino e não usados, no momento dos fatos, para fins militares. Neste “caso Blaskic”, o ataque contra os edifícios não caracterizou um dos quatro crimes internacionais, tornando o TPII competente, pois eles estavam localizados perto de objetivos militares, condição que legitima os bombardeios. No entanto, a jurisprudência da corte criminal evoluiu: no julgamento “Natelic e Martinovic” do 31 de março de 200345, a definição do crime não contemplou mais o elemento de proximidade do edifício bombardeado com os objetivos militares. Mas os juízes internacionais requereram a prova da intenção do autor do delito de degradar o imóvel, prova sempre delicada a fornecer, como é para qualquer elemento subjetivo. Essas exigências são compreensíveis, pois se trata da definição dos crimes internacionais, quer dizer, os de maior gravidade, que afetam a comunidade internacional no seu conjunto, justificando a competência excepcional dos tribunais penais internacionais e relativizando a soberania dos países beligerantes.

O terrorismo compartilha várias semelhanças com o urbicídio, em particular o de propagar o terror e destruir, não somente fisica, mas também moralmente, uma parte da população civil, focar em alvos simbólicos da identidade do inimigo. Mas vale lembrar os fracassos da sociedade internacional ao definir o primeiro para descartar o raciocínio analógico46. Apesar de o terrorismo ser considerado uma das ameaças mais terríveis destas últimas décadas, não houve consenso internacional até hoje, para circunscrever este conceito47, o que não deixa pressagiar, pelo menos a curto prazo, novo conceito de urbicídio.

Mesmo que o desafio da delimitação do conceito esteja superado, restarão outras questões a serem resolvidas. Qual seria seu regime jurídico? O crime é mais grave que os outros crimes internacionais vigentes hoje no Estatuto de Roma? A sanção deveria ser agravada? Quais são as causas para se eximir da sua responsabilidade pela destruição de uma cidade?

Estes são apenas exemplos de incertezas jurídicas que o TPI permanente encontrará se o conceito de urbicídio vier a ser incorporado no artigo 8 do Estatuto de Roma. Além disso, a capacidade deste termo para abranger uma variedade de campos, tais como, direito, política internacional, urbanismo e arquitetura, história da arte, antropologia, filosofia e sociologia, tornará especialmente difícil estabelecer uma definição finita que satisfaça a todos.

Conclusão

A discussão doutrinária sobre a qualificação jurídica aplicável às violações voluntárias aos monumentos históricos tem o mérito de demonstrar as novas expectativas da sociedade internacional quanto à tutela do patrimônio da humanidade. Porém, por enquanto, parece mais conveniente conservar a principal caracterização de “crime de guerra” aplicada pelo TPI. Se a criação de um crime sui generis apresenta intelectualmente argumentos a favor, a mudança da terminologia poderia ser contraproducente. O governo francês, nas suas “50 proposições para proteger o patrimônio da humanidade” reveladas em 201548, propôs sistematizar o acionamento do TPI para responsabilizar individualmente os que perpetraram crimes de lesa patrimônio (proposição n° 42) sem, no entanto, tentar modificar a qualificação de crimes de guerra para outro crime. Emendar o Estatuto de Roma no intuito de criar uma nova infração tem o risco de deixar entender, segundo Jean-Luc Martinez, redator das proposições, que as destruições das pedras podem ficar no mesmo patamar que os massacres da população, o que é difícil de ser compreendido pela opinião pública. Essa falta de legibilidade provocada pela alteração de jurisprudência seria contraditória com a preocupação de consolidar a efetividade das regras em germinação existentes. Ademais, o processo de reforma do Estatuto de Roma pode se revelar arriscado pois a probabilidade de uma emenda entrar em vigor é fraca. Alterar as cláusulas do tratado de 1998 necessita da aquiescência da maioria dos 2/3 dos Estados membros da jurisdição criminal internacional e vinculará somente os Estados que ratificaram a emenda. Como o TPI está hoje sofrendo uma fase de contestação, em particular pelos países africanos que contestam sua legitimidade49 e também pelos presidentes russo, Vladimir Putin, norte-americano, Donald Trump, é melhor não dar oportunidade aos Estados de denunciar ou enfraquecer o ato constitutivo desta instituição judiciária, que demonstrou recentemente sua importante contribuição na luta eficaz contra a destruição do patrimônio da humanidade.


1 SARTRE-FAURIAT, Annie. Proche-Orient : patrimoines en grand danger.Anabases, Toulouse, n° 23, 2016, p. 139.

2 ROBICHEZ, Juliette. A destruição do patrimônio cultural da humanidade como instrumento de aniquilamento da dignidade da pessoa humana. A gênese da proteção jurídica do patrimônio cultural da humanidade. Diálogos possíveis, Salvador, v. 14, 2015, p. 96. – ROBICHEZ, Juliette. A proteção do patrimônio histórico-cultural da humanidade e a crise do direito internacional. In: MENEZES, Wagner; ANUNCIAÇÃO, Clodoaldo S. da, VIEIRA, Gustavo M. (org.). Direito internacional em expansão, Belo Horizonte: Arrães Ed., 2015, p. 122.

3 ROBICHEZ, Juliette. A destruição deliberada do patrimônio cultural da humanidade: “crime de guerra” ou crime contra a humanidade”? Revista de Direito Internacional, 2020, v. 17, n.° 3, Dossiê temático: Direito da arte e do patrimônio cultural, p. 357. Disponível em: https://www.publicacoesacademicas.uniceub.br/rdi/article/view/6591. Acesso em: 21 abr. 2021.

4 Definido no artigo 4, A, §6 da Terceira Convenção de Genebra. Termo francês para a conscrição durante as Guerras Revolucionárias francesas, particularmente a de 23 de agosto de 1793.

5 DUFOUR, Jean-Louis. La guerre, la ville et le soldat. Paris: Odile Jacob, 2002.

6 DUFOUR, Jean-Louis. Villes et combats urbains au XXe siècle, in Guerres mondiales et conflits contemporains, Paris, 2002/2, n° 206, p. 95. Disponível em: https://www.cairn.info/revue-guerres-mondiales-et-conflits-contemporains-2002-2-page-95.htm. Acesso em: 07 mai. 2019.

7 UNESCO. Quatorzième assemblée générale des États parties à la Convention concernant la protection du patrimoine mondial, culturel et naturel. Paris, 14-15/Out/2003, p. 2. Disponível em: <http://whc.UNESCO.org/archive/2003/whc03-14ga-inf01f.pdf>. Acesso em: 10 fev. 2014.

8 Por enquanto, os crimes internacionais são: crime de genocídio, crime contra a humanidade, crime de guerra e crime de agressão.

9 Resolução 2085 (2012). Disponível em: <http://abonnes.lemonde.fr/international/article/2013/02/15/patrimoine-mondial_1833424_3210.html>. Acesso em: 05 mai. 2014.

10 No seu sentido próprio de aterrorizar a população.

11 CABANES, Valérie. Un nouveau droit pour la terre. Pour en finir avec l’écocide. Paris: Seuil, 2016.

12 Colóquio sobre as cidades destruídas nas guerras recentes, 31 jan. 1995, Ecole d’architecture de Paris-La Défense, sob a iniciativa da revista Urbanisme et da Associação Patrimônio sem Fronteiras. V. EDELMANN, Frédéric. Comment réconcilier les villes martyres et leur histoire. Le Monde, Paris, 11 fev. 1995. Disponível em: <http://www.lemonde.fr/archives/article/1995/02/11/comment-reconcilier-les-villes-martyres-et-leur-histoire_3836761_1819218.html#mQ8aDPHigO6hDpLU.99>. Acesso em: 14 mar. 2017.

13 Neologismo elaborado a partir da palavra “war”, guerra em inglês e “architecture”, arquitetura.

14 GREES. Urbicide à Sarajevo. Blogue Immersion à Sarajevo, s.d. Disponível em: <https://grees2009.wordpress.com/nos-recherches/urbanisme/urbicide-a-sarajevo/>. Acesso em: 14 mar. 2017. Fato interessante, o neologismo “urbicídio” não foi traduzido em inglês na mídia nova-iorquina, o outro “warchitecture-Sarajevo”, associando a palavra “guerra” e “arquitetura”, foi privilegiado para falar de uma cidade “ferida” (“A Wounded City”). V. STOREFRONT FOR ART AND ARCHITECTURE. Warchitecture-Sarajevo: a Wounded City. 04 fev. 1995. Disponível em: <http://storefrontnews.org/programming/warchitecture-sarajevo-a-wounded-city/>. Acesso em: 14 mar. 2017.

15 Une exposition sur Sarajevo au Centre Pompidou. Les ruines d’une ville assiégée. Le Monde, Paris, 03 mai. 1994. Disponível em: <http://www.lemonde.fr/archives/article/1994/05/03/une-exposition-sur-sarajevo-au-centre-pompidou-les-ruines-d-une-ville-assiegee_3829085_1819218.html#0D7axomAHhypp4uf.99>. Acesso em: 07 set. 2016.

16 BOGDANOVIC, Bogdan. Vukovar, Sarajevo. La guerre en ex-Yougoslavie. Paris: Ed. Esprit, 1993.

17 Pourquoi Sarajevo. Le Monde, Paris, 27 mai. 1994. Disponível em: <http://www.lemonde.fr/archives/article/1994/05/27/pourquoi-sarajevo_3831329_1819218.html#rUgtrD2dZmqhOEYS.99>. Acesso em: 07 set. 2016. Tradução nossa: “O urbicídio,o memoricídio e a limpeza étnica ficarão impunes? Nenhum tribunal internacional nunca julgará os autores destes delitos de lesa-humanidade?”

18 Por ex.: MAZZUCCHELLI, Francesco. Urbicidio. Il senso dei luoghi tra distruzioni e ricostruzioni nelle ex Jugoslavia. Bononia University Press, Bolonha, 2010.

19 LEMKIN, Raphael. Chapter IX: Genocide. In: ______. Axis Rule in Occupied Europe: Laws of Occupation – Analysis of Government – Proposals for Redress. Washington: Carnegie Endowment for International Peace, 1944. p. 79-95. Disponível em: <http://www.academia.edu/5846019/Raphael_Lemkin_-_Axis_Rule_in_Occupied_Europe_Laws_of_Occupation_-_Analysis_of_Government_-_Proposals_for_Redress_Chapter_IX_Genocide_>. Acesso em: 08 mai. 2019.

20 MOORCOCK, Michael. Dead God’s Homecoming. Science Fantasy, n° 59, Nova Publishing, 1963, apud WIKIPEDIA, Urbicídio. Disponível em: <https://es.wikipedia.org/wiki/Urbicidio>. Acesso em: 08 mai. 2019. Nesta obra, o protagonista Elric, imperador de Melniboné, abandona seu trono para viajar e assiste impotente à destruição do seu mundo para deixar seu lugar ao nosso.

21 Por exemplo: MARSHALL, Berman. Falling Towers: City Life After urbicide, in CROW, Dennis, Geography and Identity. Ed. Maisonneuve Press, Washington, 1996, p. 172.

22 Pensamos em Troia sitiada e devastada pelos Gregos (1240 a.C.); a tomada de Cartago, cidade sediada no norte da África, originariamente colônia fenícia pelos Romanos que se espalharam pela cidade e semearam as terras de sal para que nada mais repele como diz a lenda (146 a.C.); a tomada de Tenochtitlán (antigo México), capital dos Astecas, pelos Espanhóis (1521)…

23 VIRILIO, Paul.Stratégie de la déception: à partir du conflit au Kosovo, réflexion sur la stratégie militaire du contrôle et de désinformation tous azimuts. Paris: Ed. Galilée, 2000.

24 TRATNJEK, Bénédicte. Des ponts entre les hommes : les paradoxes de géosymboles dans les villes en guerre. Cafés géographiques, rubrique Vox geographi, 12 dez. 2009. Disponível em: <https://halshs.archives-ouvertes.fr/file/index/docid/440892/filename/Des_ponts_entre_les_hommes.pdf>. Acesso em: 28 mai. 2019.

25 O termo “komsiluk”, de origem turca, designa as relações de vizinhança no seu conjunto. Na Bósnia-Herzegovina, no contexto pluricomunitário bosníaco, o termo abrangia um sistema de coexistência cotidiana entre as diferentes comunidades. Expressava-se essencialmente no trabalho, na vida hodierna, na associação na comemoração de todos aos eventos religiosos e familiares. BOUGAREL, Xavier. Bosnie. Anatomie d’un conflit. Paris: La Découverte, 1996, p. 81.

26 TRATNJEK, Bénédicte. La notion d’urbicide : exemples en ex-Yougoslavie. Blogue Géographie de la ville en guerre, 22 out. 2008. Disponível em: <http://geographie-ville-en-guerre.blogspot.com.br/2008/10/la-notion-durbicide-dimensions.html>. Acesso em: 07 set. 2016. Podemos também citar o exemplo de Phnom Penh, capital da Camboja, que sofreu graves destruições e descuidados durante a República Khmer (1970-1975). A “Pérola da Ásia” foi bombardeada pelas tropas comunistas e esvaziada durante quase quatro anos. Em 1975, a nova Kampuchea democrática evacuou pela força seus dois milhões de residentes para que estes trabalhassem nas fazendas rurais e se tornem o “novo povo”. Ver a obra cinematográfica sobre este tema: The killing Fields. Direção de Rolland JOFFÉ, Reino Unido, 1984 (138 min.).

27 Pensamos nos bombardeios de Paris e Londres na Primeira Guerra Mundial, de Guernica durante a guerra civil na Espanha ou Hiroshima e Nagasaki durante a Segunda Guerra Mundial.

28 BAUDOUï, Rémi. De la menace atomique aux conflits de “faible intensité”. L’emprise croissante de la guerre sur la ville. Annales de la recherche urbaine, n° 91, dossier “Villes et guerres”, 2001, pp. 31-32.

29 Idem. “Assassinato ritual de uma cidade”. (trad. nossa)

30 CHASLIN, François. Une haine monumentale. Essai sur la destruction des villes en ex-Yougoslavie. Paris: Descartes & Cie, 1997. – V. também TRATNJEK, Bénédicte. La notion d’urbicide. Op. cit.

31 Uma das primeiras medidas adotadas pela população vítima desses atos bárbaros foi de reconstruir a ponte de Mostar ou os mausoléus de Tombuctu.

32 HANAFI, Sari. Spatiocide, réfugiés, crise de l’Etat-nation. Multitudes, Paris, 2004-4, n° 18, p. 187. Disponível em: <http://www.cairn.info/article_p.php?ID_ARTICLE=MULT_018_0187>. Acesso em: 17 mar. 2017 – LEVY, Jacques. Topologie furtive. Espacestemps.net, 2008. Disponível em: <http://www.espacestemps.net/articles/topologie-furtive/>. Acesso em: 17 mar. 2017. Esses autores demonstram que o espaço é um recurso usado pelo Estado israelense para impedir a construção estatal palestina: as políticas de expropriações gerais das terras, deslocamento ou expulsão maciça dos habitantes; o assentamento consistente, exaustivo e definitivo por colonos visa a romper a continuidade territorial, a suprir a relação entre Palestino e seu território.

33 ROBICHEZ, Juliette; SPÍNOLA, Luíza M. C. A complexa definição de ato terrorista como crime contra a humanidade. Revista da Faculdade de Direito – UFPR, Curitiba, v. 65, n° 2, mai./ago. 2020, p. 149. Disponível em: https://revistas.ufpr.br/direito/article/view/69797/41512. Acesso em: 17 dez. 2020. V. também: MOLINS, François. Actes de terrorisme : nouveaux crimes contre l’humanité ? Paris: Colloque à la Cour de cassation: 70 ans après Nuremberg – Juger le crime contre l’humanité, 30 set. 2016. Disponível em: <https://www.courdecassation.fr/IMG/F%20Molins%20-%20Actes%20de%20terrorisme%20%20noueaux%20crimes%20contre%20l%20humanit%C3%A9%20-%2070%20apr%C3%A8s%20Nuremberg%20-%20Juger%20le%20crime%20contre%20l%20humanit%C3%A9.pdf>. Acesso em: 17 mar. 2017.

34 MUNIZ, Lucas Maia Carvalho. A tutela dos crimes contra o sistema financeiro nacional no Tribunal Penal Internacional. Trabalho de Conclusão de Curso, Faculdade Ruy Barbosa, Curso de direito, orientador: Juliette Robichez, 2013 (n.p.).

35 Para maiores desenvolvimentos V. ASCENSIO, Hervé, DECAUX, Emmanuel, PELLET, Alain. Droit international pénal. Paris: A. Pedone, 2° ed., 2012, pp. 183 e s.

36 CARBONNIER, Jean. Flexible droit. Pour une sociologie du droit sans rigueur. Paris: LGDJ, 7° ed., 1992, p. 23 e s. Trad. nossa.

37 Idem. Trad. nossa

38 Ex.: JARREAU, Patrick. Simone Veil s’inquiète de la banalisation du génocide des juifs. Le Monde, Paris, 18 mai. 2003. Disponível em: <http://abonnes.lemonde.fr/une-abonnes/article/2003/05/15/simone-veil-s-inquiete-de-la-banalisation-du-genocide-des-juifs_320122_3207.html?xtmc=simone_veil_s_inquiete_de_la_banalisation_du_genocide&xtcr=1>. Acesso em: 21 abr. 2019.

39 V. ausência de consenso sobre essa questão no debate na Comissão de Direito Internacional sobre o projeto de código dos crimes contra a paz e a segurança da humanidade. ACDI, 1986, vol. II, 2 e partie, p. 48, § 98. V. também ACDI, 1990, vol. II, 2 e parte, comentários do art. 16 in fine, p. 29. Contra: Resolução da AG/OEA, 30/06/70, equiparando os atos de terrorismo a crimes contra a humanidade. Mesma posição nas resoluções 863 de 1986, 1170 de 1991 e na recomendação 1644 de 2004 da Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa. V. ROBICHEZ, Juliette; SPÍNOLA, Luíza M. C. Loc. cit.

40 DIAS, Anauene. Destruição do patrimônio cultural: crime de guerra. Revista Via Iuris, Bogotá, 2018, n° 25, p. 1. Disponível em: <https://www.academia.edu/38358730/Destruição_do_patrimônio_cultural_como_crime_de_guerra.pdf?email_work_card=view-paper>. Acesso em: 28 mai. 2019.

41 CARDOSO, Tatiana de Almeida F. R. Novos desafios ao direito internacional humanitário: a proteção dos bens culturais em caso de conflito armado. Revista de Direitos Fundamentais e Democracia, Curitiba, v. 14, n° 14, jul./dez. de 2013, p. 196. Disponível em: <http://revistaeletronicardfd.unibrasil.com.br/index.php/rdfd/article/view/381/338>. Acesso em: 25 jul. 2018.

42 TPII – TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL PARA EX-IUGOSLÁVIA. Câmara de Primeira Instância. Procurador v. Kordic & Cerkez. 27 fev. 2001. N° IT-95-14/2-T. <Disponível em http://www.icty.org/x/cases/kordic_cerkez/tjug/fr/kor-010226f.pdf>. Acesso em: 21 mar. 2014, pp. 64 e 65; p. 101 e s. e p. 311 e s. Trad. livre

43 TPII – TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL PARA EX-IUGOSLÁVIA. Câmara de primeira instância I. Procurador c. Miodrag Jokic. 18 mar. 2004. N° IT-01-42/1-S. Disponível em: <http://www.icty.org/x/cases/miodrag_jokic/tjug/fr/jok-sj040318f.pdf>. Acesso em: 21 mar. 2014, p. 21 e s. Trad. livre.

44 TPII – TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL PARA EX-IUGOSLÁVIA (2000a). Câmara de Primeira Instância I. Procurador c. Tihomir Blaskic.03 mar. 2000. N° IT-95-14-T. Disponível em: <http://www.icty.org/x/cases/blaskic/tjug/fr/bla-tj000303f.pdf>. Acesso em: 21 mar. 2014, p. 5 e s., pp. 53 e 56, p. 63 e s., p. 144 e s.

45 TPII – TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL PARA EX-IUGOSLÁVIA. Câmara de primeira instância. Procurador v. Mladen Naletilic e Vinko Martinovic. 31 mar. 2003. N° IT-98-34-6. Disponível em: <http://www.icty.org/x/cases/naletilic_martinovic/tjug/fr/tj030331f.pdf>. Acesso em: 21 mar. 2014, p. 230 e s., pp. 274-275.

46 ROBICHEZ, Juliette; SPÍNOLA, Luíza M. C. Loc. cit.

47 JAPIASSÚ, Carlos Eduardo A. Coleção para entender: o Direito Penal Internacional. Belo Horizonte: Del Rey, 2009. – MALUF, Elisa L. Terrorismo e prisão cautelar: eficiência e garantismo. São Paulo: LiberArs, 2016.

Ver referências in: ROBICHEZ, Juliette; SPÍNOLA, Luíza M. C. Loc cit.

48 MARTINEZ, Jean-Luc.Cinquante propositions françaises pour protéger le patrimoine de l’humanité. In: Rapport au Président de la République sur la protection du patrimoine en situation de conflit armé. Nov. 2015. Disponível em: <http://www.elysee.fr/assets/Uploads/Cinquante-propositions-francaises-pour-proteger-le-patrimoine-de-lhumanite.pdf>. Acesso em: 05 fev. 2017.

49 Acusado de ser uma instituição “racista e neocolonial” pela União Africana, alguns Estados africanos manifestaram sua vontade de sair da organização internacional. A partir de 2015, a África do Sul, o Burundi e a Gâmbia introduziram um processo de denúncia do Tratado de Roma de 1998.Ver ROBICHEZ, Juliette. A justiça penal internacional e a África. Análise crítica do “afrocentrismo” do Tribunal Penal Internacional. Cientifico, Salvador, 2018, p. 147. Disponível em: <https://revistacientefico.adtalembrasil.com.br/cientefico/article/view/626/390>. Acesso em: 21 abr. 2019.

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