Equador, projeto original

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A convocação de uma Constituinte e a alta popularidade do presidente Correa levam a mídia a equipar o país à Venezuela. É uma caricatura enganadora

Assim como a Venezuela, o Equador é um país andino. Em ambos, o sistema político tradicional entrou em colapso e, em seguida, um líder carismático, dotado de propostas anti-oligárquicas, assumiu a presidência, iniciou reformas importantes e mantém alta popularidade. Convocaram-se Assembléias Constituintes. Na votação para eleger a do Equador, domingo passado, a coalizão liderada pelo presidente Rafael Correa alcançou um resultado superior às próprias expectativas das forças que a compõem. Elegerá entre 71 e 80, dos 130 integrantes da Assembléia. Por conta dessas semelhanças, o processo equatoriano é freqüentemente apresentado, na mídia brasileira, como uma espécie de cópia do que se passa na Venezuela; e Correa, como alguém muito parecido a Chávez ou Evo Morales.

Tal simplificação esconde dois dados essenciais, que serão os mais importantes para acompanhar o desenvolvimento da Constituinte e o próprio futuro do Equador. 1. Ao contrário do que ocorre em Caracas, a eleição de Correa à Presidência (em 2006) foi antecedida por várias ondas de mobilização popular. Elas se sucedem desde o início dos anos 1990 e formaram uma sociedade civil articulada, sofisticada e complexa. 2. Em Quito, o governo navega num mar econômico muito menos favorável, marcado por esgotamento das reservas de petróleo, aumento da pobreza, emigração maciça, desaparecimento da moeda nacional e deposição de três presidentes, nos últimos dez anos.

Um laboratório de alternativas: Juntos, esses dois fatores tendem a fazer do Equador, nos próximos meses, um país pouco previsível. Ao mesmo tempo (e também por isso…), um laboratório apaixonante de alternativas, onde vão contracenar, entre outros atores políticos, um presidente culto e voluntarioso; uma classe média cosmopolita, porém oscilante entre a rebeldia altermundista e os sonhos de consumo; maiorias indígenas-mestiças divididas entre a reivindicação radical de seus direitos e a cooptação por um ex-chefe-de-Estado (Lúcio Gutierrez) aliado a Washington; e uma oligarquia comercial-agrária endinheirada, disposta a tudo para manter seus privilégios, capaz de articular, em especial na costa, uma vasta parcela de empregados.

No início de setembro, um seminário internacional que reuniu, em Quito, intelectuais e ativistas latino-americanos, permitiu um amplo exame da realidade e perspectivas do Equador. Denominou-se “Socialismos [no plural] do Século 21”. Foi organizado por Ruptura 25, um grupo político curiosíssimo, que surgiu em 2004, teve enorme presença nos protestos que derrubaram Lúcio Gutierrez, em 2005 e assumiu, desde a eleição de Correa, duplo papel. Atua tanto a partir da sociedade civil quanto na disputa institucional (elegeu 15 constituintes e tem presença no ministério).

Do Brasil, participaram o ex-prefeito de Porto Alegre, Raul Pont, e o autor desta postagem. Nas próximas semanas, no Blog da Redação, relatos do seminário e da efervescência equatoriana.

Nosso dossiê:

No Le Monde Diplomatique:

Em nossa Biblioteca Virtual, pastas sobre Equador, Venezuela, América Latina.

Outras Fontes:

Na Wikipedia, o verbete sobre Equador (em castelhano) é vasto e relativamente atualizado. A Agência IPS, alternativa às fontes convencionais, tem seção especial sobre América Latina (castelhano). Parte do material é publicado, em português, pela Agência Envolverde. O site de Ruptura 25 traz a história do movimento, informações sobre sua atuação e uma esboço do que será sua plataforma na Constituinte.

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2 comentários para "Equador, projeto original"

  1. O processo equatoriano é não apenas original como também é corajoso. Devemos espalhar aos quatro ventos o fato de que o governo de Correa criou a Comissão de Auditoria da Dívida Pública que trabalha libertar o país desse verdadeiro instrumento de dominação que é dívida ao comprovar a sua ilegitimidade.

  2. Marcia Gomes disse:

    Muitobom poder sair da massificação mental capitalista e fechada em q vivemos. Parabéns.

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