A revolução da Universidade Federal do ABC

Por Luis Nassif, no GGN

 

Sérgio Amadeu, ativista pela Internet livre e professor na UFABC

Sérgio Amadeu, ativista pela Internet livre e professor na UFABC

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Ruptura da estrutura de departamentos, grade curricular aberta e ênfase na pesquisa caracterizam instituição — que avança e é reconhecida, enquanto centros tradicionais mergulham em crise

Por Luis Nassif, no GGN

Com oito anos de existência, a Universidade Federal do ABC (UFABC) é o primeiro caso de sucesso das novas universidades federais.

Com seu reitor alemão Klaus Capelle, a UFABC deverá se transformar em um divisor de águas do ensino e da pesquisa universitária, na passagem para o século 21.

A primeira revolução foi na estrutura interna.

As universidades tradicionais são divididas em departamentos acadêmicos, caixinhas fechadas, compartimentalizadas.

A UFABC inverteu a lógica. Os grandes problemas contemporâneos da ciência e da tecnologia e as demandas das empresas não se encaixam em caixinhas, diz Capelle. A Universidade precisa formar pessoas capazes de resolver problemas, o que passa por uma formação interdisciplinar.

Para tanto, a UFABC foi organizada em três grandes centros:

1.      Centro de Ciências Naturais e Humanas, a etapa da descoberta.

2.      Centro de Engenharia e Ciências Sociais, a etapa da invenção.

3.      Centro de matemática, computação e cognição, a etapa da análise.

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Durante três anos o aluno receberá sólida formação interdisciplinar, generalista, aprendendo a aprender e sendo empreendedor de sua própria formação, como define Capelle. Por “empreendedor da própria formação”, significa que o aluno tem liberdade para montar sua própria grade.

Os alunos podem sair pelas duas portas de entrada, ou se dedicar a carreiras mais tradicionais: no total de 47 portas de saída, entre graduação e pós. Optando por ela, em dois anos sairá com diploma convencional, já que parte do ensino anterior vale como crédito.

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Na UFABC o aluno é estimulado para a pesquisa desde o primeiro dia.

Mal ingressa na Universidade, o aluno é envolvido em projeto de pesquisa. A maioria não dispõe de informação suficiente para definir seu projeto. Mas irá se beneficiar da experiência em ambiente de pesquisa.

Anualmente, são concedidas centenas de bolsas para iniciantes, com o orçamento da própria universidade.

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O pós-graduação tem um doutorado inovador, acadêmico-industrial.

Antes de montar o projeto, o aluno recebe uma bolsa CNPQ (Conselho Nacional de Pesquisas) para passar seis meses em empresas conveniadas, buscando desafios científicos e tecnológicos dignos do doutorado.

Se identificar o projeto, ingressa no doutorado e o desenvolve em colaboração com a universidade inteira. O financiamento será integralmente bancado pelo CNPQ, sem desembolso por parte da empresa.

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Em 2006 a UFABC foi inaugurada com 50 professores e 500 alunos, sem campus próprio. Oito anos depois, tem 552 professores, todos com título de doutor, 10 mil alunos, 26 cursos de graduação, 21 de pós, 2 campi próprios, 100 mil m2 de área construída e primeiro colocada em vários rankings.

Em 2012, entre as 2 mil instituições avaliadas pelo MEC, foi uma das 27 que tiraram nota máxima. O estudo holandês  Leiden Ranking of Brazilian Research Institutions and Universities analisou 60 universidades brasileiras e conferiu à UFABC o primeiro lugar em colaboração internacional e o segundo em quantidade de publicações entre os 10% mais citados em cada área.

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Sem a abertura das novas universidades, o país continuaria preso à estratificação das universidades tradicionais.

 

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9 comentários para "A revolução da Universidade Federal do ABC"

  1. Estava assistindo a um documentário sobre Educação com o professor Pedro Demo da UNB – Universidade de Brasília -, dizia que quando chegou a Alemanha para estudar, entrou no Campus, andou atrás de aula, não encontrou, a Universidade não tinha aulas, tinha e sim centro de pesquisas.
    A Universidade Federal do ABC, criada em 2006, portanto pelo governo Lula da Silva, sai à frente? Parece que sim.
    Dá para fazer isso, claro, guardando as devidas proporções, no Ensino Médio? Penso que sim.
    Iniciação Científica. Sim podemos.
    Estudantes escolhendo a sua grade horária? Sim podemos.
    Estudantes construindo seu próprio aprendizado, orientados por professores? Sim podemos.
    Estudantes participando das principais decisões em conjunto com direção, coordenação, educadores etc.? Sim podemos.
    Melhorar as estruturas: Salas de aula, salas de reuniões, auditórios, refeitórios, bibliotecas, áreas de convivências, Laboratórios? Sim podemos.
    Como a UFABC fez, o Brasil inteiro pode fazer.
    Precisamos é de vontade política, de compromisso de todos que estão envolvidos com Educação Pública no país.

  2. Luz disse:

    Sobre o movimento estudantil na UFABC ainda é muito fraco, sem representação. O assunto que reina é sobre videogame, sinuca no dce. Infelizmente não temos alunos com capacidade e maturidade para impor as propostas dos discentes. Como exemplo, posso citar o caso de um aluno que teve coragem bastante para entrar com um processo contra a universidade para que fosse retirado do Consepe o critério do CA maior que dois para estágio, depois dele outros alunos individualmente entraram com ações para conseguir estagiar. Portanto, não existe uma representação desse tipo na UFABC formada por alunos, nesse momento o dce teria que apoiar a causa e entrar com ações coletivas na justiça. Uma aluna sofreu uma perseguição de um professor na universidade, os representantes do dce pediram que ela consultasse uma outra aluna que estava movendo um processo com um assunto parecido. Sobre revisão de conceito que está no Consepe e nunca funcionou quando pedido pelos alunos, passou a funcionar quando uma aluna que não tem nada a ver com representação discente foi atrás e fez vale o que estava proposto na resolução. Enfim, nessas horas cadê a representação dos alunos, aqui cada um está preocupado com seu CA e CR,representação discente não existe.

  3. Gustavo Tarelow disse:

    Só cabe lembrar que o grande idealizador da UFABC foi o Prof. Luizinho, que foi injustamente execrado pela grande mídia, tendo seu nome envolvido no “mensalão”, sendo que nada sobre ele foi provado e ele e, no final das contas, foi inocentado.

  4. Armando Neri Junior disse:

    Aí está uma das grandes conquistas junto ao Governo Federal para orgulho do Grande ABC. Meta ambicionada por muitos na Fundação Santo André !

  5. J. C. Abrão disse:

    Oi, pessoal, ontem eu mandei um comentário sobre o texto do compadre Nassif e estava sendo lido e analisado. Pelo jeito, os analistas ainda não chegaram, devem estar tirando umas férias pós-camapanha Dilma. Aliás, merecidas, Tudo indica que os censores, ou melhor, os avaliadores não gostaram do conteúdo ou da minhas humildes idéias. Vai aqui um pedido: me mandem o conteúdo da censura para que eu possa futuramente debater o ponto de vista de vocês seja em publico seja por escrito. Afinal, os anos de chumbo da dita-cuja já se foram…ou, não? .

  6. bernardomendes disse:

    Luis, os centros tem uma representação estudantil ainda incipiente, infelizmente, mas há certos momentos onde os estudantes conseguem se organizar e alguns avanços são conquistados. Como a universidade é nova, ainda há muita coisa a ser discutida, mas estamos num rumo que se você parar para analisar nos levará a um status ainda não conhecido no Brasil.
    Por ser nova e os alunos serem empreendedores de sua própria formação, há diversas iniciativas louváveis por parte dos mesmos. Vale aqui ressaltar alguns belos exemplos como a Liga Universitária de Empreendedorismo, encubada pela Fundação Estudar e considerada a melhor liga do Brasil, a Liga de Mercado Financeiro, ainda muito nova mas já também considerada uma das melhores ligas do Brasil e duas Empresas Jrs, uma volta a consultorias de gestão/produção e outra voltada a Sustentabilidade.
    Há pontos altos e baixos no ensino, o método é desafiador tanto para o aluno quanto (ou talvez até mais) para o docente; Felizmente esta é uma barreira que está aos poucos sendo desconstruídas por uma iniciativa conjunta.
    Os movimentos ainda são tentáculos iniciais na universidade. Docentes, alunos e TA’s começaram mesmo a se organizar após as greves em 2012. Todo o calor do momento contribuiu, e muito, para uma organização suprapartidária, onde a universidade foi tomada para atividades que contribuiam para elevar as discussões e criar um espaço participativo.
    Sou aluno desde 2010 e pude ajudar a moldar alguns tijolinhos desta história em alguns momentos.

  7. bernardomendes disse:

    Luis, os centros tem uma representação estudantil ainda incipiente, infelizmente, mas há certos momentos onde os estudantes conseguem se organizar e alguns avanços são conquistados. Como a universidade é nova, ainda há muita coisa a ser discutida, mas estamos num rumo que se você parar para analisar nos levará a um status ainda não conhecido no Brasil.
    Por ser nova e os alunos serem empreendedores de sua própria formação, há diversas iniciativas louváveis por parte dos mesmos. Vale aqui ressaltar alguns belos exemplos como a Liga Universitária de Empreendedorismo, encubada pela Fundação Estudar e considerada a melhor liga do Brasil, a Liga de Mercado Financeiro, ainda muito nova mas já também considerada uma das melhores ligas do Brasil e duas Empresas Jrs, uma volta a consultorias de gestão/produção e outra voltada a Sustentabilidade.
    Há pontos altos e baixos no ensino, o método é desafiador tanto para o aluno quanto (ou talvez até mais) para o docente; Felizmente esta é uma barreira que está aos poucos sendo desconstruídas por uma iniciativa conjunta.
    Os movimentos ainda são tentáculos iniciais na universidade. Docentes, alunos e TA’s começaram mesmo a se organizar após as greves em 2012. Todo o calor do momento contribuiu, e muito, para uma organização suprapartidária, onde a universidade foi tomada para atividades que contribuiam para elevar as discussões e criar um espaço participativo.
    Sou aluno desde 2010 e pude ajudar a moldar alguns tijolinhos desta história em alguns momentos.

  8. J. C. Abrão disse:

    Prezado Nassif, me chamou a atenção o título do seu artigo. Só a atenção, pois, durante a leitura, a decepção começou a tomar conta das minhas reflexões. “Nada de novo na frente ocidental”, Isso mesmo, encaixo nesta frase consagrada uma afirmação que você faz com relação a aluno e pesquisa na universidade em seu destaque: “Na UFABC o aluno é estimulado para a pesquisa desde o primeiro dia”. Nassif, com relação ao predicado desta sua afirmação, eu aprendi há quase cinquenta anos atrás enquanto aluno dos professores Azanha, Roque Spencer, Villalobos, Laerte Ramos, e outros mais. Atenção: nós também éramos “estimulados” não a fazer mas a entender os passos que levavam os nossos mestres a realizarem as suas pesquisas que os levariam ao doutorado ou à defesa de tese voltada para a conquista de “Professor Titular”, etc… Durante os quatro anos em que me envolvi com o curso de Pedagogia da FEUSP, eu, como todos os meus colegas e amigos de curso podemos tranquilamente afirmar que com a prática íamos estabelecendo os parâmetros epistemológicos, gnoseológicos e históricos daquilo que é essencial a qualquer instituição de ensino da pré-escola ao doutorado: o processo “ensinar e aprender” e sua articulação com a política, o processo ideológico, com a vida cotidiana e suas implicações dialéticas, etc., etc… Entendido esse processo, fica menos complicado adentrar-se ou “aventurar-se” a desenvolver pesquisas na academia. Com relação ao reitor “alemão” da UFABC, respeitado e admirado Nassif, enquanto eu desenvolvia as minhas reflexões vinham às minhas lembranças a experiência pedagógica e formativo-científica com relação aos seminários de estudo baseados então no “processo alemão” de leituras e preparação de questões inicialmente e posteriormente debates em classe com a supervisão do/a professor/a para adquirirmos e estruturarmos conhecimentos… Nassif, mais uma vez: “Nada de novo no front ocidental”.. Felizmente a nossa história pedagógico-científica é bastante rica. para aprendermos com a mesma…

  9. luisvpc disse:

    Bom saber que existe pluralidade entre as universidades. Queria saber como é a estrutura de poder na UFABC, já que essa é uma questão há muito discutida na USP, pelo movimento estudantil que cansou de ter todas as decisões da universidade tomadas por apenas uma categoria: docentes, e apenas os da cúpula.
    Força

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