Eleições em cenário de impasse do lulismo

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Afastada hipótese populista de Marina Silva, país debate-se entre um projeto que foi bem-sucedido — mas que estancou e precisa requalificar-se — e tentativa de rearticulação das elites

Por Felipe Amin Filomeno | Imagem: Michelangelo CaravaggioO Trapaceiro

Ainda é difícil prever quem será o próximo presidente do Brasil. Entretanto, o que já se pode afirmar é que, ao final do primeiro turno das eleições presidenciais, a democracia brasileira sai fortalecida. O principal indicador disto é a derrota de Marina Silva.

Durante o governo Lula, uma combinação de condições mundiais favoráveis e de políticas nacionais de cunho neodesenvolvimentista e social-democrata gerou um novo ciclo de desenvolvimento econômico e social. Diante da crise mundial iniciada em 2008, o governo petista agiu de maneira criativa, utilizando políticas heterodoxas para proteger o país da recessão. A economia no país reagiu e teve um desempenho extraordinário em 2010. Na transição para o governo Dilma, o ciclo de desenvolvimento lulista começou a mostrar sinais de esgotamento, tanto em suas condições mundiais (agravadas com a persistência da crise), quanto em suas condições domésticas (com os ajustamentos apenas contingenciais e incrementais nas políticas públicas). As novas demandas do cidadão brasileiro, que surgiram daquele ciclo de desenvolvimento e foram manifestadas nos protestos em massa de 2013, passaram a ser atendidas apenas marginalmente. Não se trata do cenário de caos que a grande mídia tenta construir, mas sim de uma malaise com as instituições políticas numa situação em que para cada indicador positivo divulgado, outro negativo aparece no dia seguinte.

Neste contexto de exaustão do lulismo – enquanto padrão de desenvolvimento sócio-econômico e pacto político nacional – a morte de Eduardo Campos permitiu a emergência da candidatura populista de Marina Silva. Quando as elites governantes e as instituições políticas existentes não conseguem responder aos desafios gerados por grandes transformações na sociedade, cria-se solo fértil para a emergência do populismo. Líderes populistas mobilizam as massas diretamente, com base no carisma pessoal, com um discurso contra o establishment. Marina Silva se encaixa neste perfil. Não tem base partidária, mas seu carisma lhe permite uma relação direta com um segmento amplo da população. Sua proposta de uma “nova política”, capaz de contornar representações partidárias para recrutar “os melhores” e de dialogar diretamente com a sociedade civil, é populista. Seu discurso de renovação, de superação das polaridades em direção à união nacional e de salvação do país (“não vamos desistir do Brasil”) é populista.

Inicialmente, o eleitorado brasileiro pareceu responder positivamente ao feitiço populista de Marina. As pesquisas de intenção de voto indicavam que a ex-senadora não só disputaria o segundo turno com a presidente Dilma, mas também tinha chances de vencer ao final. Muitos cidadãos pareciam preferir arriscar o voto numa candidatura ambígua, em prol da renovação, do que endossar as atuais instituições políticas com um voto no PT ou no PSDB. A máquina partidária petista reagiu, evidenciando as inúmeras contradições do projeto de Marina: sua passagem por diversos partidos, sua afinidade com as elites das altas finanças, suas opiniões moralmente conservadoras. E o eleitorado simpatizante de Marina respondeu, migrando para as candidaturas de Dilma ou de Aécio (que terminou o primeiro turno com um desempenho melhor do que o esperado). Mas não foi só a propaganda petista que derrubou Marina Silva, foi a pedagogia da democracia, que “vacinou” o eleitorado brasileiro (hoje mais educado e informado do que no passado) contra o “canto da sereia” populista.

Neste segundo turno, duas forças políticas tradicionais se enfrentarão. Ambas terão de convencer o eleitorado de que são o veículo para iniciar um novo ciclo de desenvolvimento no Brasil. Isto é tarefa mais difícil para a candidatura de Aécio Neves, tendo em vista sua ligação carnal com as forças conservadoras do país. Conta, no entanto, com o ativismo político da direita midiática (Veja, Folha de São Paulo, Globo). Por outro lado, também não é tarefa fácil para Dilma, que precisa de um discurso de mudança qualitativa, para além da mudança incremental do “muda mais”.

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2 comentários para "Eleições em cenário de impasse do lulismo"

  1. Maria Cecilia Manso Silva disse:

    Errei, foi mal! Desculpe…

  2. Maria Cecilia Manso Silva disse:

    A ilustração também está sem crédito, mas essa eu sei de quem é: Caravaggio…

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