SUS: 30 anos esta noite
Em 17 de maio de 1988, os constituintes aprovavam o capítulo da seguridade social e criaram o Sistema Único de Saúde
Publicado 17/05/2018 às 09:48
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SUS: 30 ANOS ESTA NOITE
. Embora muita água tenha corrido debaixo da ponte até a inscrição definitiva da saúde como direito de todos os brasileiros e dever do Estado na Carta promulgada em 5 de outubro, a data de hoje é um marco das contradições que povoam o SUS. Isso porque, após intensa negociação com os parlamentares conservadores reunidos no Centrão – que vocalizavam os interesses dos empresários da saúde –, o setor privado conseguiu esticar a corda e garantir na Constituição sua existência e participação na oferta de serviços públicos mediante convênios com governos. Passadas três décadas, o que antes eram brechas agora são vetores a orientar a administração pública.
Em artigo publicado originalmente na Abrasco, Paulo Capel Narvai analisa como a derrota do passado encontra os problemas do presente. Quando foi aprovado, diz ele, o SUS foi taxado de “natimorto” devido ao acordo firmado com entidades privadas. Mas, mesmo que “o fantasma do natimorto” nos ronde, diz o professor da USP, o “SUS vive”.
“Porém, para seguir em frente e se consolidar como a mais importante conquista da cidadania que veio com a Constituição de 1988 o SUS precisa romper as amarras do subfinanciamento, livrar-se das terceirizações que lhe vampirizam os recursos, inverter o modelo de atenção ainda predominante no Brasil, baseado em hospitais, colocando o centro da sua atuação na atenção primária à saúde e ousar criar uma carreira nacional do SUS. São desafios gigantescos, é certo, mas não maiores nem mais ousados do que o desafio da sua criação 30 anos atrás”.
Nossa repórter, Raquel Torres, escreveu para o Saúde é Meu Lugar nos mesmos termos: não é um ‘feliz aniversário’, mas dá pra se inspirar nele.
“Você pode dizer que não temos muito o que celebrar neste momento, e é verdade. O Sistema nunca foi financiado do jeito que deveria, passa por uma crise que parece eterna, a Emenda 95 congelou os gastos federais na saúde, a atenção básica está sendo desestruturada… Mas voltar um pouco no tempo é sempre bom para a gente se deixar contagiar com o clima de esperança que rolava naquela época (e querer esse clima de volta!)”, diz ela.
Também em clima de resgate, a repórter Leila Leal, da EPSJV/Fiocruz, ouviu militantes da reforma sanitária para entender exatamente quais eram as discordâncias que se tinha em relação ao desenho do SUS, sendo a maior delas a oposição entre quem acreditava que o movimento deveria lutar por uma estatização da saúde imediata (como aconteceu no Reino Unido em 1948, quando da implantação do NHS) ou uma estatização progressiva, posição ganhadora – que saiu lesada no acordo com o Centrão na Constituinte.
Mas, hoje, o cenário é tão confuso que mesmo um defensor célebre do SUS, como o médico Dráuzio Varella, que tem repetido que o Sistema Único é “um grande avanço” e “uma conquista da sociedade brasileira” que não pode ser perdida, como nesta entrevista para a BBC Brasil, acredita que o princípio da universalidade – que deu sentido à luta social – pode ser descartada em nome de uma confusa solidariedade dos mais ricos com os mais pobres que não tem a ver com os primeiros pagarem mais impostos para financiar o fundo público, mas com seu desembarque e, consequentemente, afastamento da defesa da saúde pública:
“Temos que defender o SUS antes de tudo. Mas acho que, num país com a desigualdade do Brasil, temos uma parte da população com condições econômicas bastante favoráveis que não deveria usar o SUS. Deveria deixá-lo para quem não tem outra alternativa: ou se trata pelo SUS ou não se trata. Então, não tem sentido de eu estar ocupando o lugar do outro, tenho que me entender com a iniciativa privada. Já outras pessoas defendem o fim da saúde complementar no Brasil. Acho que isso é um radicalismo incoerente, porque é jogar em cima do SUS pessoas que já são muito privilegiadas. O que temos que fazer é aprimorar o SUS”.
Ao longo dos próximos meses até outubro, como há 30 anos atrás, muita água e muita interpretação sobre o significado, os limites e o futuro do SUS há de correr…
FOI ADIADA
A reunião da comissão especial que analisa mudanças na legislação sobre agrotóxicos foi marcada pela oposição ao projeto. Os parlamentares conseguiram obstruir os trabalhos e a discussão do relatório de Luiz Nishimori será retomada só no dia 29 de maio. O vídeo da reunião pode ser visto aqui.
Também ontem, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (MDB-RJ), recebeu deputados, especialistas e ativistas contrários ao “Pacote de Veneno” e prometeu desengavetar a instalação de uma comissão especial para analisar a criação da Política Nacional de Redução de Agrotóxicos.
DIA INTENSO NO SENADO
Ontem o senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES) anunciou que vai apresentar um projeto de lei para que usuários de crack e outras drogas sejam “tratados” compulsoriamente, ou seja, contra sua vontade.
Já a Comissão de Assuntos Sociais do Senado aprovou proposta que obriga o registro, pelos serviços de saúde públicos e privados, de câncer e malformações congênitas. O Projeto de Lei da Câmara 14/2018 segue com pedido de votação em regime de urgência para o plenário.
E uma comissão mista foi instalada para analisar a Medida Provisória 827/2018, relativa às atividades dos agentes comunitários de saúde e de combate às endemias.
RAIVA HUMANA
A secretaria de saúde do Pará notificou 12 casos de raiva humana no estado, incluindo seis mortes. Até o momento, pelo menos um caso foi confirmado. Segundo o órgão, um paciente morreu na terça e quatro crianças estão internadas e um adulto estão internados com suspeita da doença. Por meio de nota, a secretaria informou que continua o trabalho de investigação e prevenção da raiva humana no município de Melgaço, no Arquipélago do Marajó. Casos confirmados de raiva humana no Pará não ocorrem desde 2005.
MAIS CRÍTICAS
Hoje, o candidato do PSDB ao governo de São Paulo e ex-prefeito da capital, João Doria, recebeu críticas do editorial da Folha: “Doria se elegeu prefeito cultivando uma imagem de gestor, mais que de político. Foi mais como político, contudo, que deixou a prefeitura antes da hora, movido pela previsível ambição de governar o Estado. Já como gestor, saiu do cargo em dívida com o que ele mesmo fixara como padrão de qualidade”.
DIAGNÓSTICOS ESSENCIAIS
A Organização Mundial de Saúde publicou uma lista de 113 diagnósticos aos quais todas as pessoas deveriam ter acesso. Tratam-se dos testes mais comuns, como para detecção do HIV e diabetes, até de doenças prioritárias para o combate global como a malária. A lista inédita complementa outra, de medicamentos essenciais, que existe há mais de 40 anos.