Na ONU, a democracia radical dos conselhos de saúde

• Experiência do CNS é apresentada na ONU • Por que é preciso fortalecer os conselhos • Os números do suicídio entre os mais jovens • Superbactérias se proliferam, mas não são estudadas • Saúde da Família poderia realizar aborto •

Foto: Conselho Nacional de Saúde
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Para Fernando Pigatto, presidente do Conselho Nacional de Saúde (CNS), os conselhos locais de saúde representam a “radicalização da democracia” – e garantem “novos e mais amplos parâmetros para que o povo participe das políticas públicas”. O dirigente apresentou sua perspectiva em um evento nas Nações Unidas na semana passada, onde o CNS fez parte de uma delegação de entidades e movimentos sociais brasileiros que monitoram e defendem os direitos humanos. A agenda apresentou a experiência dos conselhos locais de saúde, intimamente ligados à história da reforma sanitária no Brasil, a representantes de outros países. Na mesa, dividida com lideranças negras e indígenas, Pigatto também afirmou que em comunidades onde os conselhos locais de saúde “estavam participando do combate e prevenção à pandemia, a covid-19 foi menos destrutiva”, o que comprova que “quanto mais controle e participação social, maior a possibilidade de garantir respeito aos direitos humanos em todas as suas dimensões”. 

O fortalecimento dos conselhos pelos órgãos oficiais

A atividade na ONU se soma a um visível esforço de impulsionamento dos conselhos locais, que reúnem usuários e trabalhadores do SUS e garantem a participação popular na gestão das unidades básicas de saúde. Em julho, o CNS aprovou resolução que defende uma campanha para “estimular a criação e o fortalecimento dos Conselhos Locais de Saúde”. No mesmo mês, na 17ª Conferência Nacional de Saúde – coberta em profundidade por Outra Saúde –, a ministra Nísia Trindade assinou um termo de lançamento da campanha, batizada como “Conselho Local de Saúde – Aqui Tem”. Na concepção do Conselho Nacional de Saúde, essa iniciativa tem o desafio de “aproximar a comunidade dos serviços de saúde do exercício do controle social”. Ao “contribuir com o planejamento das atividades da unidade de saúde, divulgar a importância dos serviços públicos de saúde e do SUS e fortalecer os laços das unidades com os seus territórios”, os conselhos locais se tornam decisivos, explica nota do CNS.

O problema do suicídio entre adolescentes e crianças

Um levantamento feito pela Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) concluiu que, entre 2012 e 2021, 9.954 pessoas entre 10 e 19 anos cometeram suicídio no Brasil, segundo dados levantados a partir de registros do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde. A grande maioria dos casos (84,3%) acontece entre os adolescentes de 15 a 19 anos. Os garotos são quem mais comete suicídio, representando mais que o dobro das meninas – representam 68,32% do total. Mas o que há por trás dessas quase mil mortes por ano? Luci Pfeiffer, presidente do Departamento Científico de Prevenção e Enfrentamento das Causas Externas na Infância e Adolescência da SBP, analisou a situação em entrevista para a Agência Brasil. Ainda sobre gênero, ela afirma que, apesar dos números mais altos entre rapazes, as meninas fazem mais tentativas de se suicidar. 

Aliás, um dado importante: “De modo geral, são cometidas duas ou três tentativas até que eles consigam chegar à morte. Por isso, nós teríamos ainda um tempo de prevenção secundária”, afirma Luci. Ela também ensina que a violência presente na vida da criança, física ou psicológica, são fatores que podem contribuir para o sofrimento a ponto de ela não ver mais saída. As redes sociais também têm papel preocupante. Luci explica que o certo a se fazer é levar o jovem a um pediatra para uma avaliação multidisciplinar. E importante: é preciso acionar também a rede de proteção da criança – o conjunto formado pela escola, pais e unidades de assistência à saúde, como os Centros de Referência da Assistência Social (Cras) e Centros de Referência de Assistência Social (Creas).

As superbactérias na mira da OMS e dos EUA

Um relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS) noticiado pelo Uol identificou um curioso fenômeno. O uso excessivo de antibióticos, estimulado pelas farmacêuticas, ampliou o número de superbactérias no mundo. Porém, agora que o problema se instalou, essas mesmas empresas zeraram seu desenvolvimento de fármacos que contornem a chamada “resistência antibacteriana”, já que estes não seriam lucrativos. Citado no documento da OMS, um estudo publicado na The Lancet estimou em 1,2 milhão as mortes diretamente atribuíveis às superbactérias no mundo. Em 2016, esses óbitos haviam sido estimados em 700 mil. Nesse cenário, com o desinteresse do setor privado em atuar contra as superbactérias, o relatório da OMS exorta os países a dedicarem recursos públicos a essa empreitada – e, segundo a Reuters, os EUA deverão ser um deles. Na quarta-feira (27/9), Joe Biden anunciou um pacote de US$100 milhões para pesquisas sobre o combate às superbactérias, a serem aplicados por uma agência pública de pesquisas.

O papel da Saúde da Família na realização do aborto legal

No Dia de Luta pela Descriminalização do Aborto na América Latina e Caribe, 28 de setembro, o grupo de trabalho de mulheres da Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade (SBMFC) emitiu um posicionamento em favor da inclusão da Atenção Primária à Saúde (APS) na rede de aborto legal no Brasil. O documento enfatiza a importância do acesso ao aborto seguro como parte dos direitos reprodutivos. Destaca, ainda, que a APS, por sua presença em muitos municípios, poderia desempenhar um papel fundamental na oferta de serviços de aborto legal, especialmente por meio do aborto medicamentoso até 12 semanas de gestação com misoprostol. O GT Mulheres na Medicina de Família e Comunidade busca promover o diálogo com instâncias do sistema de saúde e instituições de formação profissional para avançar nessa questão, com o objetivo de garantir o acesso ao aborto legal de forma segura e ética, em conformidade com os direitos humanos das mulheres e pessoas que podem gestar. Além disso, eles se comprometem a iniciar um diálogo com diversas instâncias do Sistema Único de Saúde (SUS) e instituições de formação profissional para tornar a APS um local seguro e ético para a interrupção legal da gravidez.

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