DIU “afronta a moralidade cristã”, afirma juiz
• Juiz decide a favor de São Camilo, que recusou DIU • Setor suplementar deve seguir diretrizes do SUS, afirma professora • Inflação na saúde privada global • Ministério da Saúde anuncia retomada de obras • Adeus a Mena •
Publicado 02/02/2024 às 12:09
A atitude fundamentalista do hospital São Camilo encontrou guarida na 1ª Instância da Vara da Fazenda Pública de São Paulo. O juiz Otavio Tokuda considerou procedente a decisão do hospital São Camilo de negar o método contraceptivo de implantação do DIU (dispositivo intra-uterino) solicitado pela jornalista Leonor Macedo, através de seu plano de Saúde. Tokuda afirmou que as alegações religiosas se amparam no caráter de direito privado da instituição. Segundo sua decisão, “a imposição de um direito secular de um indivíduo a uma instituição de orientação católica, o que é inadmissível, […] violaria o direito constitucional de liberdade de consciência e de crença”. Vale lembrar que o São Camilo, ao se dizer filantrópico e prestar serviços ao SUS, recebe recursos diretos do governo federal.
Doutora em Saúde Pública critica decisão
Ao Outra Saúde, Lenir Santos, advogada, doutora em Saúde Pública e professora da Unicamp, detonou a decisão de Tokuda. “A Constituição determina que a participação complementar do privado no SUS se dá sob suas diretrizes. Até mesmo o privado-privado deve observar regramentos das políticas de saúde pelo fato de as ações e os serviços públicos e privados serem de relevância pública sujeitos à regulamentação, fiscalização e controle público. A atenção ‘integral’ à saúde também é um regramento importante. Um hospital que atue na especialidade que envolve procedimentos de concepção e contracepção não pode restringir seus serviços nesse campo por convicções religiosas. Tem que atuar em acordo com a ciência. Seria o mesmo se recusasse a transfusão de sangue. Além do mais, uma instituição não pode alegar objeção de consciência por ser um direito ‘individual’ personalíssimo do médico, cabendo ao hospital providenciar outro médico quando isso ocorre”, criticou.
Consultoria prevê alta inflação na saúde privada global
Após a notícia de que aumentos nos planos de saúde privados podem chegar a 25% no Brasil, em um momento marcado também pela crescente insatisfação de usuários com seus planos de saúde, a consultoria WTW realizou a Pesquisa Global de Tendências Médicas 2024. Ela conclui que o mundo deve observar aumentos de até 10% nos custos gerais de saúde em 2024, praticamente o mesmo índice registrado em 2023 (ver quadro abaixo). Para o Brasil, a previsão é de 16,62%, o que sinaliza uma escalada de preços de serviços de saúde a perder de vista.
Além da demanda reprimida, ainda pelo período da covid-19, que adiou e negligenciou diversos acompanhamentos e tratamentos necessários, o relatório reforça a noção de que há um problema de concepção da prestação de serviços de saúde no setor privado. “O principal impulsionador dos custos médicos, de acordo com as seguradoras, continua sendo o uso excessivo de cuidados (59%) devido a profissionais médicos recomendando ou prescrevendo muitos serviços. Quase metade das seguradoras (49%) também indica que os maus hábitos de saúde dos segurados estão entre os principais fatores. A subutilização ou falta de serviços preventivos (47%) também é um fator significativo de custos”, observa.
Tendências médicas globais: aumentos nos custos dos benefícios de assistência médica, 2022-2024
Ministério da Saúde publica portaria para retomar 5,5 mil obras
Em 12 de janeiro, o ministério da Saúde publicou a Portaria 3.084, que trata de organizar entre os entes federativos o Pacto Nacional pela Retomada de Obras Inacabadas, programa de governo que visa finalizar 5,5 mil obras relacionadas às estruturas físicas do SUS que foram paralisadas em algum momento dos últimos anos. Trata-se de restaurações ou ampliações de UBS, UPAS, Centro de Reabilitação, dentre outros estabelecimentos que fornecem serviços de saúde. Para registrar o interesse dos gestores municipais e estaduais, o governo utiliza o site InvestSUS, ferramenta para inscrever e coordenar os projetos. Os interessados têm até 60 dias para aderir ao programa.
Luto por Maria Filomena Gouveia Vilela
Universidade, governo, movimentos sociais e militantes do campo da saúde manifestaram seu luto pela morte da sanitarista Maria Filomena Gouveia Vilela, a Mena. Considerada uma das idealizadoras da vigilância sanitária e da própria construção da Anvisa, Mena se dedicou à carreira de pesquisadora e docente, tendo se aposentado na Unicamp, onde fez mestrado e doutorado, tendo publicado em 2005 a tese “Da ‘moça da vigilância’ ao núcleo de saúde Coletiva na unidade básica de saúde: O que há de novo no modelo assistencial de Campinas?’” Também participou das primeiras experiências de implantação do SUS, a exemplo de sua passagem pela secretaria de saúde de Santos, ao lado de Davi Capistrano.
Em Campinas, contribuiu no governo de Antonio da Costa Santos, “Mena é da geração que viveu o final da ditadura. Éramos muito unidos na área de Saúde Coletiva, pessoas de diferentes cidades. Pudemos vivenciar a implantação e consolidação do SUS. A área em que a Mena sempre trabalhou foi a área responsável por implantar todo o sistema nacional de vigilância à saúde, que, apesar de todas as dificuldades de financiamento, conseguiu salvar vidas quando veio a pandemia da covid-19”, lamentou Josely Rímoli, sua colega de Unicamp.