Covid compromete educação nas favelas da Maré

Dificuldade de aprendizado, desistência da escola, depressão e ansiedade entre alunos são alguns dos sintomas da pandemia de covid para jovens de 16 favelas da Maré, Rio de Janeiro, segundo levantamento da Redes da Maré

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Diante da urgência imposta pela pandemia, organizações da sociedade civil das 16 favelas da Maré, Zona Norte do Rio de Janeiro, criaram a campanha “Maré diz NÃO ao coronavírus!”. Entre as muitas ações realizadas por esses grupos está a pesquisa “Covid-19 e o acesso à educação nas 16 favelas da Maré: impactos nos anos finais do Ensino Fundamental e no Ensino Médio”, que demonstra o cenário trágico: 48% dos jovens entrevistados declarou ter aprendido pouco nos últimos dois anos e 26%, um a cada quatro, declarou ter aprendido nada.

A campanha realizou ações de apoio à segurança alimentar, geração de renda e prevenção em saúde, sempre incluindo a produção e difusão de informações seguras sobre a covid. “O contato com as famílias impactadas em um cenário tão complexo, agravado pela falta de ação do Estado, mostrou que era hora de entender o que estava acontecendo nas escolas da região”, escreveu Andréia Martins, diretora da organização Redes da Maré e coordenadora da pesquisa 

O complexo da Maré abriga cerca de 140 mil pessoas. Em 2019, às vésperas da pandemia, quase 20 mil alunos estavam matriculados nas 50 escolas públicas da região. A pesquisa entrevistou mil pessoas, levantando dados que “evidenciam os efeitos dramáticos da pandemia na vida escolar de toda uma geração de estudantes mareenses”. 

Eis o relato de um dos entrevistados: “Eu não consegui, não estudei. Eu não vou ser falso e fingir que fui um ótimo aluno. Estou boiando no 7º ano”.

Entre os motivos apontados pelos estudantes estão a dificuldade de adaptação ao ensino remoto (35%) e problemas de aprendizagem (28%). Apesar de 69% dos estudantes terem afirmado se sentirem prejudicados pelo ensino remoto, 62% deles disseram ter acompanhado as atividades escolares on-line. Apenas 8% dos alunos não conseguiram acompanhar as atividades durante a pandemia e 43% não usaram o aplicativo da respectiva rede de ensino.

Outro dado que chamou a atenção é relativo ao impacto da pandemia na saúde mental da comunidade escolar: 41% dos estudantes afirmaram ter enfrentado algum tipo de sofrimento psíquico, enquanto 69% relataram impactos na própria saúde mental e 72% dos profissionais da educação afirmaram sentir o agravamento de problemas psíquicos e emocionais. 

O Busca Ativa, projeto coordenado pela Redes da Maré, alerta para as crianças e adolescentes da Maré que abandonaram a escola nos dois anos de pandemia: cerca de 1.100 crianças e adolescentes foram cadastrados como alunos fora da sala de aula só em 2021. 

“Os dados evidenciam o acirramento das desigualdades educacionais de moradores da Maré. Esse cenário só poderá ser enfrentado com uma política robusta não só dos órgãos responsáveis pela educação, mas uma perspectiva intersetorial que considere a participação efetiva dos pais e das instituições locais”, pondera Andréia Martins. 
A pesquisa foi divulgada pela 16ª edição do Radar Covid-19 Favela, iniciativa da Fiocruz que estrutura dados a partir do monitoramento ativo de fontes não oficiais – prática também conhecida como vigilância de rumores. Mídias, redes sociais e contato direto com moradores, coletivos, movimentos sociais, instituições e articuladores locais – todos são fontes para o radar analisar e sistematizar informações sobre a saúde nos territórios. Pretende levar visibilidade às situações de vulnerabilidade e antecipar iniciativas de enfrentamento à pandemia.

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