Onde pode surgir a próxima “variante de preocupação”

Como a variante ômicron atingiu o pico de sucesso – mas pode facilmente perder o trono. Um mapa estima que os locais de risco máximo de uma possível próxima cepa estão todos na África – continente escanteado pelo apartheid vacinal

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O mundo assiste à escalada da variante ômicron até o pico. Em uma entrevista para o Jornal da USP, especialista em coronavírus, o virologista Paulo Brandão detalha como se dá a evolução dessa categoria de vírus e explica porque ela provavelmente não será a última cepa de risco que enfrentaremos nesta pandemia – a própria ômicron original já vem sendo substituída por uma subvariante dela mesma, a BA.2. É impossível prever quando e onde, mas diversos fatores de comportamento do vírus e condições geográficas específicas podem dar uma pista.

Para Brandão, há duas hipóteses sobre o sucesso evolutivo da ômicron: a primeira é que ela possa ter sido desenvolvida em um paciente com infecção crônica e o sistema imune comprometido, e que tenha servido de recipiente propício para moldar a evolução do Sars-CoV-2, resultando na ômicron. Outra é a baixa cobertura vacinal.

Ele explica também os fatores que levaram ela como a vencedora evolutiva no atual estágio da pandemia: as mutações importantes da proteína spike, que permite que ela escape da neutralização de anticorpos que produzimos contra as versões anteriores; a vantagem de se estabelecer em tratos respiratórios superiores (nariz e garganta), o que aumenta sua transmissibilidade; e por ter baixa virulência, muitos podem carregá-la sem que seja notada. Sem contar a baixa capacidade de rastreamento e que autoridades do mundo todo estão relaxando com as medidas de restrições sociais: “Pode haver um monte de outras variantes circulando que a gente simplesmente não esteja vendo”, sugere.

Um estudo da Airfinity, noticiado pela Economist na semana passada, tentou mapear onde a próxima “variante de preocupação” provavelmente surgirá. Eles calcularam a partir de dados das regiões com menor cobertura de imunização e onde grande parte da população sofre de sistemas imunológicos enfraquecidos (maior incidência de HIV, câncer e doença renal crônica). Os resultados apontaram que Burundi, Tanzânia, República Democrática do Congo, Iêmen e Nigéria correm o risco máximo de produzirem uma nova variante.

Até o final de janeiro, menos de 6% das pessoas que vivem nesses países estavam completamente vacinadas contra o coronavírus. Burundi é, de longe, o que corre mais risco, com apenas 0,05% da população imunizada. Nos cinco países, o alto índice de HIV é uma das condições que contribui para o alto risco. O estudo tem limitações, pois deixa de levar em conta alguns fatores como a densidade populacional e opções de tratamento da covid para pessoas imunocomprometidas. Mas não deixa de fornecer informações cruciais sobre onde procurar novas variantes e onde concentrar maiores esforços para aumentar a oferta de vacinas e campanhas de enfrentamento ao vírus.

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