O Brasil vacila perigosamente diante da ômicron

Com os novos casos em ascensão explosiva, o país corre risco de retornar às fases mais dramáticas da pandemia. A ameaça só não é maior graças à excelência da vacinação brasileira. Mas a negligência governo continua a expor o país ao perigo

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Quem observa os dados atuais sobre a evolução da covid no Brasil fica perplexo – e assustado – com a avalanche de pessoas que em poucos dias adoeceram no país: o número diário de novos casos ficou mais de sessenta vezes maior, desde o dia 24/12, passando de 3.000 para 189.000, em 29/1. Enquanto o número diário de óbitos, que era de 97 em 4/1, passou a 539, em 30/1. Esse desastre se deve, com certeza, à difusão gigante do contágio pela variante ômicron, e constitui um risco intolerável de retorno às fases mais dramáticas da pandemia (veja nos gráficos abaixo).

Novos casos no Brasil

Novos óbitos no Brasil

Há agora um estado geral de alerta, já que também houve relaxamento das restrições à mobilidade social, que, por sua vez, foi amplificado pelo excesso de contatos no período de festas. Tanto que a OMS (Organização Mundial da Saúde) voltou a insistir em medidas fortes de contenção da covid na sua reunião desta terça, dia 1º/1. “Desde que a ômicron foi identificada há apenas 10 semanas”, disse seu diretor, Tedros Adhanom, “quase 90 milhões de casos foram relatados à OMS, mais do que foram relatados em todo o ano de 2020”. E o quadro está se agravando, observou ele.

“Agora estamos começando a ver um aumento muito preocupante de mortes na maioria das regiões do mundo. É prematuro qualquer país se render ou declarar vitória. Este vírus é perigoso e continua a evoluir diante de nossos olhos”. Diante disso, Tedros afirmou que é preciso lançar mão de todos os meios sanitários para assegurar o controle da doença – em especial, continuar expandindo a vacinação e apelar para outras medidas, com destaque para a testagem em massa das populações.

O Brasil constitui um caso de relevo nessa situação. Realizou uma vacinação extremamente bem sucedida, do lado positivo. Impediu com isso que a covid produzisse resultados mais graves no país. “Olhando o que foi a pandemia no início de 2021, quanto mais tempo ficássemos sem vacinas, mais mortes nós teríamos”, avaliou há alguns dias o sanitarista Cláudio Maierovitch, vice-presidente da Abrasco (Associação Brasileira de Saúde Coletiva). “Graças à vacinação, a partir da metade de 2021, começaram a diminuir as internações hospitalares”, assinalou.

A excelência da vacinação também foi recentemente atestada por Mônica Levi, diretora da Sociedade Brasileira de Imunizações. “Chegamos a aplicar 2 milhões de doses por dia, em maio [de 2021], lembra ela. “Isso mostra o know-how que o Brasil tem no assunto”. Isso é que está dando ao Brasil certo conforto nessa escalada espantosa da ômicron, havendo mesmo esperança de ela arrefecer nas próximas semanas.

Parece haver sinais disso em alguns estados, como se pode ver aqui. Os índices brasileiros de mortes são menos dolorosos do que os de países com desempenho vacinal menos efetivo. De modo geral, o gráfico abaixo mostra como os brasileiros estão encarando a ômicron em posição um pouco mais confortável do que inúmeros países, entre os quais os EUA.

Do lado negativo, o Brasil teve que enfrentar, além do vírus, a atitude negligente do atual governo, “que atua em favor do vírus, e não do seu controle”, na expressão precisa de um documento recente lançado por especialistas. O texto lista entre as principais dificuldades brasileiras, “a subnotificação de casos da doença devido à baixa disponibilidade de testes e a insuficiência da vigilância genômica”. E não há até agora nenhum sinal minimamente confiável de que o país conseguirá, afinal, vencer o jogo-contra do governo e estabelecer uma política de testagem capaz de enfrentar a pandemia na fase ômicron.

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