Resenha Semanal

2 a 9 de agosto de 2019. Mais uma semana de agitações dúbias: há um novo consenso republicano ou continuamos na rota do fechamento?

Mais uma semana no novo normal… As violências decorrentes do perdão antecipado da boca do presidente continuam se acumulando, desde o “monitoramento” de reunião do PSOL até a prisão de um torcedor no estádio.

As declarações escabrosas do presidente continuam, para escândalo internacional que se espanta com sua defesa aberta do desmatamento e desqualificação dos dados científicos que o atestam.

A agitação da quase transferência de Lula para o presídio de Tremembé acabou no zero, o que hoje em dia passa por vitória para a esquerda. Há quem veja na reversão da decisão da juíza de Curitiba uma vitória das instituições e do Supremo Tribunal Federal contra a Lava Jato. Por um lado, Dallagnol parece que vai cair mesmo, e uma nota de defesa deixa ler que ele admite a veracidade das mensagens vazadas pelo Intercept, e que há uma onda republicana pela queda de Bolsonaro e da Lava Jato. Gilmar Mendes faz declarações quase todos os dias contra a Lava Jato.

Mas uma entrevista do presidente do Supremo Dias Toffoli reconfirma que o STF é coadjuvante no golpe: em abril, Toffoli foi protagonista de um acordão com o Congresso, empresários e militares que impediu a explosão de uma crise. Reunido com chefes do Judiciário e do Legislativo, ficou combinado o pacto. No Congresso, o projeto do parlamentarismo e a CPI da Lava-Toga foram arquivados e a reforma da Previdência destravada. No Planalto, o vice-presidente, Hamilton Mourão (PRTB), foi calado, e Santos Cruz, demitido da Secretaria de Governo. No Supremo, Dias Toffoli instaurou inquérito para apurar ameaças contra os ministros, adiou o julgamento que poderia soltar Lula e paralisou as investigações contra o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ).

Lula vai ficar preso ainda, e a euforia de ter um placar favorável no STF para sua soltura ficou menor…

3 de julho

A pressão de fechamento na forma de ações repressivas de autoridades sob ordens ou não teve três ocorrências.

Uma delas foi em São Paulo, onde a Polícia Militar entrou na plenária do encontro de mulheres do PSOL em São Paulo, pedindo documentos e dizendo estar “monitorando presentes”. Quem esteve lá diz que eles foram postos para fora pelas manas.

Já no Pará, em cerimônia de aniversário de uma unidade da força policial local, a ROTAM, policiais gritaram, dias depois do levante prisional, na presença do governador: “Arranca a cabeça e deixa pendurara, é a ROTAM patrulhando s noite inteira, pena de morte à brasileira”.

4 de julho

Já no clássico Palmeiras e Corinthians, no Itaquerão, um vendedor foi preso pela PM por gritar contra Bolsonaro no estádio. A delegada Monia Olga Nerbern Pescarmona assinou flagrante onde se lê que os policiais que o prenderam “informaram que estavam em patrulha quando visualizaram Rogério gritando palavras de ordem contra o atual presidente, Jair Messias Bolsonaro”. 

O Corinthians divulgou nota oficial depois repudiando ação da Polícia Militar.

Ficamos sabendo que os dentes de Feliciano valem ouro: ele gastou 157 mil em tratamento, verba da Câmara. O deputado afirmou que a boca é seu “instrumento de trabalho” e que precisa cuidar dela.

Repercute a contagem de 102 parentes do clã Bolsonaro, empregados no Legislativo ao longo de 30 anos. O levantamento abrange desde a vereança de Jair, no Rio de Janeiro. Dos 286 assessores nomeados nesse tempo, 35% tinham alguma relação de parentesco com o clã, que é acusado de usar esses funcionários como “laranjas”.

Bolsonaro, ainda em período boquirroto, defendeu o excludente de ilicitude para policiais e disse que os suspeitos confrontados na rua podem “morrer como baratas”. As mortes da PM desde a posse acusam aumento em número, chegando em 2019 a 414 em São Paulo e 434 in Rio.

Nassif escreve que grande reação institucional a Moro e a Bolsonaro começou. Essa opinião não é consenso, mas expressa uma tendência dentro da esquerda mais institucional que é barrar Jair e o pior da extrema-direita em favor de alguém minimamente republicano a surgir do tardio civismo da direita. Nem que seja com Mourão.

L coloca que o Nassif talvez esteja querendo provocar essa discussão na direita e nas cinzas fumegantes do PSDB, mais do que constatar uma onda nova realmente existente. Há vozes nas instituições que agora se levantam contra o desmonte, tais como o diretor do INPE e funcionários do IBAMA.

As parcas escolhas da esquerda talvez redundem nisso mesmo, dando chance a quem propiciou o diabo sair de democrata, especialmente DEPOIS da aprovação da Previdência. As declarações de Rodrigo Maia, presidente do Congresso, por vezes críticas a Bolsonaro, animam esta vontade de ver o Executivo diminuído. Maia se coloca como o administrador confiável, pois foi ele que fez ṕassar a Previdência, a despeito do pateta no Planalto. Maia é mais democrata que Jair, mas…

O presidente operou mais uma inversão no cenário, radicalizando um confronto que o PT nunca teve coragem de fazer: ele estabeleceu que a publicidade legal (editais, balanços e etc) agora pode ser publicada apenas nos sites da CVM, da Bolsa de Valores e da própria empresa, e não mais nos jornais de grande circulação, como era obrigatório. Um golpe forte na imprensa impressa. Essa obrigação estava prevista para acabar em 2022.

6 de agosto

Saiu no El Pais mais Vaza Jato: Dallagnol investigou ilegalmente o ministro Gilmar Mendes para propiciar movimento de seu impeachment. Teria acionado a Rede, na figura de Randolfe Rodrigues, para apresentação do pedido, que foi de fato protocolado.

Consta que Mendes e Dias Toffoli estão irados contra a Lava Jato e que o quórum a favor de Lula teria aumentado… Mas na entrevista do presidente do STF à Veja, na sexta, ele revelou que colocou panos quentes e adiou a decisão sobre o julgamento em segunda instância, que poderia beneficiar Lula.

Bolsonaro hoje se irritou com repórter e afirmou ser Johnny Bravo, que ele venceu e que a imprensa tem que aceitar isso. Os ataques do presidente à imprensa são muito maiores do qualquer regulamentação que o PT quis fazer e não fez. O silêncio dos jornalões frente às ameças contra a imprensa em geral atestam que não é a Liberdade de Imprensa que lhes interessa, mas o“Direito do Inimigo”: a lei só para os outros.

Uma apresentação da OSESP, a orquestra de São Paulo, foi interrompida por Bolsonaristas que gritou: “Stop the music! Nós temos uma jornalista aqui que omite informações da Rede Globo contra o STF”.

Vi na televisão do boteco uma propaganda do exército brasileiro em horário nobre. Foi como na infância dos anos 1970 e 1980. Além da propaganda institucional da ditadura, tinha também a publicidade das atividades do Exército Brasileiro: a ExpoEx (Exposição do Exército), Jogos Militares, até a Biblioteca do Exército fazia seus spots na TV ou no rádio. A erotização da presença militar era parte do projeto ditatorial.

O cordão as Madalenas… o ex-cantor Lobão atacou que o ataca de ter mudado de lado: “… incoerência é apoiar o funcionário público eleito que mente, descumpre ou se alia a forças tenebrosas”. Nossa, Lobão,

Hoje deu para sentir que o SESC abandonou sua escolha estratégica de apoio às indústrias criativas e que pode estar a entrar em outra avenida: a educação militarizada. Valdeci Cavalcante, presidente do conselho regional do Sesc do Piauí, convidou o presidente para a inauguração de uma escola que vai levar o seu nome, na cidade de Parnaíba. A escola está sob a administração do SESC.

“A escola terá a metodologia do Sesc com administração militar, onde os alunos vão cultivar o amor à pátria, cultivar o civismo, a ética, uma boa formação, educação diferente dessas escolas do PT que é todo mundo pichando escola, se beijando na sala de aula. Isso não vai ter nas escolas do Sesc nunca, especialmente em uma escola do Sesc com formação militar”, afirmou Cavalcante.

“Não estamos homenageando o Bolsonaro. Ele é que irá nos homenagear se aceitar colocar seu nome em nossos anais”.

Já escrevi isso antes, mas parece que a mudança nos ventos políticos atinge as instituições de produção de cultura. O SESC já montou exposições excepcionais e no geral busca se manter na crista da indústria criativa. Mas breve parece que teremos exposições como “Arca de Noé e a Arqueologia”, “Jesus e a História”… Parece piada, mas já tem um site, e livro em inglês, “Jesus como o melhor modelo de gestão”.

7 de agosto

A Secretaria de Segurança Pública de João Dória não reconhece a ocorrência do domingo, que resultou na prisão do vendedor no estádio. Bem aterrador.

A Petrobras enviou um comunicado ao escritório de advocacia de Felipe Santa Cruz, presidente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), cancelando o contrato que mantinha com ele. Ordem de Jair.

O bafon da semana foi por conta da retaliação da Lava Jato aos ataques que vem sofrendo. A juíza Carolina Lebbos determinou a transferência de Lula para o presídio em Tremembé, em cela coletiva comum. O PT conseguiu mobilizar parte importante da política contra a transferência, incluindo Rodrigo Maia (mais ou menos) e outros deputados do Centrão de DEM.

Nessa onda, uma comissão do Congresso foi admitida no STF para expressar oposição à transferência. Foram ouvidos.

Ministros do Supremo Tribunal Federal colocaram em votação com urgência, na pauta do plenário a petição da defesa de Lula que pede a suspensão da transferência. Por 10 votos a 1, a medida foi derrubada.

Mas houve tempo para escrotidões, dentre elas a do governador tucano de São Paulo, o Dória. Segundo ele, no presídio paulista, Lula ” terá a oportunidade de fazer algo que jamais fez na vida: trabalhar!”. Dá muita raiva ouvir isso de quem não viveu só de seu trabalho na vida.

A Previdência passou por mais um turno e parece fadada à aprovação.

“O Lula era o assunto. Eu não sou PT, não estou falando sobre política e sim sobre crime. Todo crime precisa ter prova e não houve prova. Cadê o cadáver? Então, qual foi o objetivo? (da prisão)”, afirmou.

Nelma Kodama, doleira, ex-esposa de Yussef e presa da Lava Jato, declarou em entrevista que “existiu uma delação premiada para entregar o principal alvo da Lava Jato, no caso o ex-presidente da República.”

Lembrei que a mesma Nelma Kodama foi objeto de “ensaio sensual” na revista Veja de julho 2016. Foi estranhíssimo e algo perturbador, me recordo. O justicialismo da Lava Jato turbinado pela imprensa (a Veja em particular), pós-golpe, expunha uma prisioneira na forma de caras e bocas de conteúdo sexual, incluindo a tornozeleira…

A Polícia Federal vai enquadrar um blogueiro, a pedido do ministro Moro, por ter postado ameaças ao presidente. Quando me lembro que tanto Dilma quanto Lula sofreram todo tipo de agressão aberta… O jornalista Mario Victor Rodrigues pediu na Veja de novembro de 2017 escreveu que Lula tinha é que morrer, e também o atual deputado Alexandre Frota pediu sua morte.

Troca de farpas entre Gilmar Mendes e Dallagnol: o primeiro chamou o segundo de “tarado institucional”, enquanto o procurador batizou o juiz de “brocha institucional”. Quem falou que as instituições não estão funcionando?

Já outra imagem foi lembrada na imprensa para descrever a relação colaborativa de Moro e Dallagnol: juiz e bandeirinha.

8 de agosto

Bolsonaro deu empurrão em Moro e disse que a sua reforma, o chamado Pacote Anti-crime, vai ter que esperar, pois há outras prioridades. Bolsonaro disse que Moro veio de um ambiente em que ele “decidia com uma caneta na mão”, mas que agora o governo não pode decidir de forma unilateral e que esse é um “jogo que tem que saber jogar”. Além disso, o COAF definitivamente vai ficar fora da alçada do ministro.

Cheiro de fritura no ar?

A empresa do deputado pastor, a Central Gospel, faliu. Ele culpou o PT. Essa é uma chave geral do ressentimento coxinha: a meritocracia só vale de discurso quando se vence. Quando se perde, nunca é mérito individual e sim obra das cotas, dos impostos, dos gays, do governo, do Lula etc.

O presidente recebeu a viúva do torturador Brilhante Ustra, a quem festejou. Já Sérgio Moro se recusa a receber a viúva de Marielle, Monica Benicio.

Além disso, foi ao lado do ministro da Justiça que Bolsonaro soltou que “Se excessos jornalísticos desse cadeia, todos você estariam presos agora”. Falava a favor do excesso de violència na ação policial.

Nenhum jornalão reclamou do ataque pouco velado ao jornalismo.

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