"Se elas quiserem, que comam em nossa mão"

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Breve ensaio sobre o machismo e os inseguros, que odeiam mulheres autônomas. Exceto se for para vê-las se beijando, e achar que é filminho pornô

Por Michel Yakini | Imagem: Paul Gauguin 

Eles são assim. Fazem de tudo pra que elas não descubram o segredo do horizonte. Eles têm medo. Sabem que lá tem mel jorrando das pedras e não querem dividir essa com ninguém.

Comem até se empanturrar e ficar molenga. Quando elas cruzam esse caminho, eles ficam olhando de rabo de olho, cochichando, maquinando como controlar os passos. Se elas quiserem, que comam na palma da mão deles. Vejam só! Eles são assim.

Muitas delas só conhecem o gosto do mel pela palma da mão deles. Muitas nem sabem que podem pegar sem permissão. Outras acreditam nas pragas que eles jogam, de que comer mel da própria mão dá uma baita caganeira até secar a bendita atrevida.

Sem contar aqueles que se acham donos do horizonte, como se aquilo tivesse papel passado e escritura exclusiva, e ficam ameaçando quem chegar perto das nascentes.

Apesar de que, esses ainda dá pra encarar, mas tem muitos que escondem um chicote cheio de pregos e tacam na primeira que ameaçar seu trono. Outros nem ameaçam, dão logo uma lapada pra garantir o serviço.

Pode ver. Eles só aceitam por perto, e olha lá, as que se parecem com eles, e se não for nem chegue.

Tem que cuspir no chão e coçar por debaixo da braguilha pra ter um mínimo de respeito no meio deles. Aí eles chamam de Cafu, de Maria Mocassin, Geraldona e fingem tratar como se fosse um “quase-igual”. Mas por trás chamam de Invertida.

Na real, odeiam que elas se gostem. Odeiam quando elas se amam, a não ser se for para vê-las se beijando, enquanto eles se saciam achando que é exibição de filminho pornô.

Eles são assim. Não gostam de ver do amor entre elas. Desconfio que nem gostem do amor. Talvez tenham medo de acabar se amando. Isso dá enjôo neles. Isso os deixa violentos.

E não me venha dizer que nem todos são assim. Porque os tais “inocentes” são farelos do pacote e quase sempre se fingem de morto no seu hétero-cúmplice-conforto.

Eles se irritam porque quando elas se amam, teimam em ficar com olho brilhante. Quando elas se amam, aprendem a decifrar os mapas do horizonte, o caminho das nascentes. Quando elas se amam exalam pelas ruas um perfume de mel. 

Michel Yakini é escritor e produtor cultural.www.michelyakini.com

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