Bancos: os juros podem cair muito mais
Publicado 09/04/2012 às 11:28
Estudo revela que sistema financeiro cobra taxas astronômicas dos clientes porque não precisa deles: já ganha demais emprestando ao Estado. Governo estará de fato disposto a virar a página?
Por Antonio Martins
A reação dos grandes bancos brasileiros e da mídia tem variado de modo revelador, desde que Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal anunciaram, semana passada, intenção de reduzir fortemente as taxas de juros. No primeiro momento, o ato foi visto como temerário e demagógico. Veja e O Estado de S.Paulo asseguraram, por exemplo, que a decisão, determinada pelo Palácio do Planalto, era incongruente: os bancos públicos teriam os clientes com maior risco de inadimplência, no sistema financeiro; não estariam, portanto, em condições de reduzir o custo do crédito oferecido a eles.
Mas a ficha rapidamente caiu. Os lucros bilionários dos bancos insultam, há anos, a opinião pública. Atacar o governo, quando este age para aliviar os clientes bancários, seria muito impopular. Por isso, os textos dos últimos dias são mais cautelosos: procuram dar voz aos dirigentes dos bancos privados que fazem exigências para seguir os passos do BB e Caixa. No Valor de hoje, Marcos Lisboa, vice-presidente do Itaú, considera “saudável e importante” o “debate” aberto pelo governo — mas reivindica, para baixar as taxas, medidas como cortes de impostos e direito de receber dos clientes, como garantias, imóveis ou fundos de Previdência…
Qual a sustentabilidade das medidas anunciadas na semana passada? Os bancos cobram, no cartão de crédito ou cheque especial, juros em torno de 10% ao mês — ou 214% ao ano. Será possível esperar uma redução abrupta destas taxas, verdadeiramente extorsivas? Um estudo produzido em 2006, pelos economistas Carlos Eduardo Carvalho e Giuliano Oliveira, da PUC-SP, demonstra que sim.
Publicado na revista Economia e Sociedade (da Unicamp), o trabalho tem 33 páginas, e naturalmente recorre a linguagem e fórmulas econométricas. Em resumo, seus autores afirmam que ao remunerar, por muitos anos, o sistema financeiro com as taxas de juros mais altas do mundo, o Estado brasileiro dispensou os bancos de oferecer crédito em condições favoráveis a empresas e pessoas. Não era necessário. Para que correr riscos, emprestando dinheiro a quem está sujeito a quebrar, quando é possível ganhar muito com o Estado, que nunca se torno inadimplente?
Numa de suas tabelas (reproduzida abaixo), Carvalho e Oliveira demonstram que, entre 2002 e 2005, a rentabilidade (retorno sobre o capital líquido) dos bancos brasileiros esteve em torno de 20% — duas a quatro vezes maior que nos países do G7, bastante superior à das maiores economias latino-americanas, w comparável apenas às do Paraguai e Peru… Estes ganhos foram alcançados, basicamente, com compra de papéis públicos; os empréstimos a pessoas e empresas tiveram sempre papel secundário.
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Taxa de retorno sobre o patrimônio do setor bancário
em países desenvolvidos
e latino-americanos selecionados, em % (2000 a 2005)
Países selecionados | 2000 | 2001 | 2002 | 2003 | 2004 | 2005 |
Países desenvolvidos (G7) | ||||||
Alemanha | 6,1 | 4,6 | 2,9 | -1,5 | 1,9 | 3,5 |
Canadá | 15,3 | 13,9 | 9,3 | 14,7 | 16,7 | 14,9 |
Estados Unidos | 13,5 | 13,0 | 14,1 | 15,0 | 13,2 | 12,7 |
França | 9,7 | 9,6 | 9,1 | 8,5 | 10,6 | 11,9 |
Itália | 11,2 | 9,1 | 6,4 | 6,7 | 10,7 | 13,3 |
Japão | -0,5 | -12,7 | -17,9 | -2,9 | 4,3 | 12,6 |
Reino Unido | 13,5 | 7,7 | 6,1 | 8,6 | 10,9 | 11,8 |
América Latina | ||||||
Argentina | 3,1 | -0,2 | -59,2 | -22,7 | -4,2 | 7,1 |
Bolívia | -9,5 | -4,1 | 0,6 | 2,7 | -1,2 | 4,2 |
Brasil | 11,3 | -1,2 | 21,8 | 17,0 | 18,8 | 22,8 |
Chile | 12,7 | 17,7 | 14,4 | 16,7 | 16,7 | 17,9 |
Colômbia | -20,7 | 1,1 | 9,6 | 16,9 | 23,2 | 22,5 |
México | 10,4 | 8,6 | -1-,4 | 14,2 | 13,0 | 19,5 |
Paraguai | 12,4 | 24,1 | 14,3 | 7,7 | 19,4 | 24,3 |
Peru | 3,1 | 4,3 | 8,3 | 10,7 | 11,6 | 22,2 |
Fonte: Dados de 2000, IMF (2005); a partir de 2001, IMF (2006) |
Depois de certa vacilação, o governo federal reiniciou, nos últimos meses, um movimento de redução dos juros pagos pelo Estado. As taxas recuaram para 8,75% (cerca de 4% ao ano, descontada a inflação). Há quem aposte que podem cair mais, ainda este mês. Neste novo cenário, sugere o estudo de Carvalho e Oliveira, as instituições financeiras serão obrigadas a se voltar para os clientes privados — que representam risco, mas oferecem imensa rentabilidade.
É aqui que a posição do Banco do Brasil e Caixa pode fazer muita diferença. Se a redução das taxas de juros for efetiva e duradoura, eles podem de fato roubar, dos bancos privados, clientes que agora são necessários. Ou, então, forçarão as instituições particulares a reduzir também suas taxas.
Fica claro, portanto, que não há sentido algum nem em oferecer benefícios fiscais aos bancos, nem em autorizá-los a exigir garantias adicionais de seus clientes. Por longas décadas, o sistema financeiro tem sugado parte importante da riqueza nacional. É hora de começar a inverter este jogo — e é perfeitamente possível fazê-lo.
Enquanto isso continua, dorme em berço esplêndido, desde 2000, no STF, a Açâo Direta de Inconstitucionalidade 2.316, embora já com votos majoritários (4×2) confirmando a liminar nela concedida, que suspendeu o art. 5º, cabeça e parágrafo único da MP nº 2.170-36, pela qual tenta-se legalizar, subrepiticiamente, o anatocismo praticado pelas instituições financeiras.
Banqueirinho ou BANQUEIRÃO é tudo ladrão. Ladrão que rouba ladrão tem 100 anos de perdão.
Belo artigo Antonio Martins.
Talvez agora com isso não só os bancos poderão ganhar.
Mas também a população e os empreendedores se o credito for realmente acessível e barato.
E assim gerar o tão esperado slogan campanha politica “emprego e renda”.
Parabéns você!!! pelo artigo, e parabéns ao governo pela iniciativa.
….Rissos é a hora pro cliente mudar de banco
Lorival Hoffmann