A Av. Paulista precisa dormir sossegada

.

Foi o que ouvi de um PM que me espancava domingo, por caminhar pelo cartão postal de São Paulo com uma camisa do Corinthians

Por Danilo Paiva Ramos

Na noite de domingo, o que mais me aterrorizou enquanto era espancado por um PM não identificado na Avenida Paulista não foi a violência dos golpes cada vez mais fortes em minha mão e barriga. “Cuzão!”, “Seu merda!”, “Filho da puta!”, “Quer ser espancado de verdade?” eram as palavras que acompanhavam as pancadas que eu ia recebendo sem ter como me defender.

Mas também não foram as ameaças ou as ofensas que mais me aterrorizaram ontem. O que mais me assombrou foi perceber, enquanto era espancado, o sorriso e o olhar do policial que mostravam um prazer maior a cada bofetada. A cada pancada meu medo aumentava. E foi com espanto que vi o prazer e ódio que cresciam nos rostos dos policiais à medida que investiam contra qualquer pessoa que, naquele momento, estivesse com uma camiseta do Corinthians comemorando na calçada, pacificamente, o título do campeonato brasileiro.

Indignado, sem saber por que apanhava, perguntei o nome de meu agressor. Mais ofensas e ameaças seguiram-se enquanto ele erguia novamente sua arma contra mim. Afastando-me, perguntei por que me batia. Ele, então, respondeu: “As pessoas da Paulista precisam dormir”.

Essa talvez fosse a fala de um “camisa negra”, grupo fascista que, na Itália, perseguia os operários que faziam greve. Ou talvez a fala de um policial da ditadura que investisse contra estudantes que lutavam pela democracia. Mas estranhei muito que o motivo da violência com que acabaram com a “festa da vitória” que um grupo de pessoas fazia por volta das 23 hrs na calçada da Paulista fosse o sono dos edifícios de bancos e empresas.

Ainda sendo coagido pelos policiais, fui conversar com o sargento que liderava o grupo. Comuniquei a ele que havia sido espancado por um de seus policiais e que queria saber a razão disso e o nome de meu agressor. Ele pediu que eu apontasse o oficial. Identifiquei-o. O 3° Sgt LUIZ disse que não conhecia o policial que continuava a espancar e a coagir as pessoas.

Memorizei a identificação do sargento Luiz e fui a uma delegacia próxima à minha casa. Quando contei ao delegado minha intenção de fazer um boletim de ocorrência por ter sido espancado por um PM, ele alterou seu tom de voz. Falando alto e gesticulando fortemente, afirmou que um policial “não batia por nada” e perguntava repetidamente o que eu tinha feito. “Nada, não fiz nada! Estava voltando para casa. Saí do metro Trianon-Masp, após assistir ao jogo com meus amigos, parei durante 5 minutos para ver a festa que o grupo fazia na calçada. Estava um pouco longe do grupo. Um cordão de policiais formou-se atrás de mim sem que eu percebesse. Quando virei meu corpo, já recebi os primeiros golpes. Não fiz nada”.

Vítima, machucado e apavorado, tive que perguntar ao delegado se esse era o modo de tratar as vítimas em sua delegacia. Afirmei que iria a outra D.P. fazer minha ocorrência, já que naquela não me sentia seguro. Somente, então, o delegado começou a tratar-me como vítima. Registrei a queixa, fiz exame de corpo de delito e aguardo que consigam identificar o sargento e meu agressor. Por sugestão do delegado, irei à Corregedoria da Polícia Militar para fazer uma queixa.

Antropólogo, pesquisador da USP, venho acompanhando a violência, o prazer e a liberdade com que policiais, soldados e autoridades “competentes” restabelecem a “ordem” na Universidade, na avenida Paulista ou na Amazônia, onde realizo meu trabalho com um povo indígena. Espancar, ofender, perseguir, rir, ameaçar parecem ser modos cada vez mais rotineiros das autoridades que aplicam a coerção física do Estado em estudantes, torcedores, índios, professores, trabalhadores etc.

O prazer que vi no rosto de meu agressor me aterrorizou. A dificuldade de identificar meu agressor — causada pela falta de distintivo, pela atitude do sargento que disse não conhecer seus soldados, pelo comportamento do delegado que insistiu que eu devia ter provocado ou pela dificuldade de saber de qual batalhão eram os PMs que atuavam na Paulista àquela hora — me assombra. O riso e o prazer de meu agressor iniciam-se no motivo banal da “Paulista que precisa dormir” e terminam na saciação do sadismo com que golpeava meu corpo que, naquele momento, por acaso — apenas por acaso —, era o corpo de um torcedor corintiano.

Leia Também:

15 comentários para "A Av. Paulista precisa dormir sossegada"

  1. Andre Goncalves Silva disse:

    Você ama dormir muito? Então vai entender isso
    http://www.mestresabe.com/2015/08/voce-ama-dormir-muito-entao-vai.html
    meu blog de uma passadinha http://www.mestresabe.com/
    aproveite e veja meu site de vendas
    http://www.lojadomestreandre.com.br/

  2. JORGE disse:

    Sem dúvidas a PM de São Paulo está, obviamente, se espelhando em seu alto comando, assim como este segue o governador e o prefeito que lhes apoiam e lhes indicaram o comando. Simples assim!
    Agora, quanto a uma ação/movimento que vise coibir este tipo de barbaridade acredito que a estratégia a seguir seja denunciar o fato, ao Ministério Público, de que o doente deste PM estava sem identificação! Isto é proibido… E que o sargento ao se negar a reconhecer e informar sobre a identificação do seu subordinado cometeu dois crimes: permitiu que seu comandado estivesse sem identificação e ainda negou a informação, que obviamente sabia.
    Acredito que esta seja uma boa estratégia a ser seguida pelo cidadão que sofreu esta barbaridade!

  3. Fred carbonera disse:

    contraponto. estive na região da paulista durante o jogo. não sou corintiano e não estava nem ai pro jogo. porém, na confirmação do título, teve início um tumulto que culminou com um quebra-quebra generalizado entre corintianos. quebraram TODAS as mesas do bar, expulsaram (e ameaçaram enfaticamente) TODOS que não eram corintianos e depredaram carros que estavam estacionados na rua. a situação piorou bastante quando a gaviões da fiel voltou do jogo e o tumulto se alastrou por toda a região, por HORAS. fiquei sem poder ir pra casa até a meia noite. legal né. se o estudante de antropologia fosse um pouco esperto teria evitado a aproximação com o grupo “desajustado”. na verdade, acho fácil falar de gente que ganha 600 Reais pra defender a população e colocar SUA vida em risco pra organizar baderna de gente “civilizada”.

  4. Anastácia Vaz disse:

    Não estou defendendo os policiais, mas eu estava na paulista domingo à noite e achei “pertubador” o barulho e a comemoração da grande maioria dos corinthianos que estavam lá. Não parava de buzinar, entravam no meio dos carros quando o sinal fechava e soltavam fogos em cima das pessoas.
    Não sou torcedora de nenhum tima. E acho um pouco “excessiva” esse tipo de comemoração.

  5. Lucas Gordon disse:

    me parece que quem confunde essas duas coisas é você! Uma instituição como a Polícia Militar é um traço dos que definem o fascismo e seu modus operandi. Se o compromisso social, ou a sua cobrança, é baseado nessa instituição, certamente haverá confusão com o fascismo.

  6. Wagner Dantas disse:

    Vamos ficar de olho nesses policiais mediocres….. sempre assim nunca fazem nada de errado !!!

  7. Como você disse? Boa vontade?
    Eles tem uma vontade má e que não acaba nunca. Tento olhar nos olhos deles e ver o humano la dentro, os tais sentimentos, mas politicos, policiais e boa parte da população parecem tem bolas de gude ao inves de olhos. Zero boa vontade nesses casos.

  8. Daniela disse:

    poisé, há quanto tempo isso acontece com pessoas que não falam nada? e agora que está chegando na camada da população que fala, que faz B.O., que não se submete à arbitrariedade, o que vai dar?

  9. Amador Bueno disse:

    FASCISTAS !!!!! kkkk tá vendo todo mundo pode usar as palavras para o que bem entender né! isso se chama esquizofrenia argumental !!!

  10. Amador Bueno disse:

    Ué….sumiu meu comentário…estranho não!

  11. Amador Bueno disse:

    isso …agora volta lá pro CRUSP e acende um baseado vai………até qdo vcs irão confundir compromisso público com fascismo? é muito fácil colocar palavras de montão na mídia sem saber o significado do que está sendo enunciado. me diz uma coisa, o que vc entende quando é entoado a palavra cidadania? vamo lá……ai vem uma pilha de besteira….

  12. Cleyton disse:

    Bom, identificar é a coisa mais fácil pois o que tem mais na paulista é câmera, sendo nas instituições ou nas ruas, se tiverem boa vontade encontrarão o policial e tudo que aconteceu .

  13. Fábia Mercadante disse:

    Quando o governo é omisso às necessidades da população os doentes e necessitados sofrem com isso e os covardes se sentem livres e protegidos para essas e outras agressões contra TODA a população, não há motivo, não há justificativa para esse tipo de atitude. A cidade está se tornando “terra de ninguém”, onde pode mais quem bate mais forte.

  14. Esse é o modo como os PM’s tratam diariamente pessoas em comunidades, favelas e afins. Fazem coisa bem pior. Pra ser PM, só tendo uma tendência facista, porque, com bandido, eles conversam e negociam. Quem não é criminoso leva porrada mesmo. Até porque, segundo eles, “dá nada não”. Que coincidência, acabei de lembrar do “Rambo”, na favela em Diadema/SP, que liderava o grupinho que batia, humilhava e tirava dinheiro dos moradores. Será que ele faz isso na cadeia? Será que tá preso?
    Lamentável…

  15. Mais um… até quando? Semanalmente, espancamentos e assassinatos na av. paulista e em todas as quebradas, seja pela PM / Estado, seja pelos neo-fascistas… Está na hora de perder a paciência!

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *