SP: a quem interessam as notícias sobre “depredação” nas escolas?

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EE Fernão Dias Paes, em Pinheiros, na 1ª semana de ocupação (Foto: Alceu Castilho)

Existe risco de alunos que se mobilizaram em SP serem responsabilizados por um problema de segurança pública anterior às ocupações, que foram pacíficas

Por Alceu Luís Castilho (@alceucastilho)

Como jornalista, sou a favor da liberdade de expressão e da circulação de informações de interesse público. Se houve algum tipo de destruição em escolas, que isso seja noticiado. Mas com responsabilidade. Não de forma a culpar os estudantes que as ocuparam; muito menos todos os estudantes que ocuparam todas as escolas. Até porque a versão dos alunos é bem diferente. Interessa muito aos derrotados políticos passar à população a ideia de que as ocupações não foram tão pacíficas e politizadas (e artísticas, culturais) como vimos nas últimas semanas.

Vejamos o caso de Osasco, neste sábado. Foi o segundo caso em uma semana. Título no G1: “Osasco registra novo caso de escola estadual depredada“. Subtítulo: “Governo culpa manifestantes por vandalismo na escola Francisca Peralta. Alunos que ocupavam o espaço afirmam que não fizeram depredação”. Atentem a um detalhe: não é que eles somente afirmam que não fizeram depredação. Eles acusam diretamente um grupo de jovens que entrou nas escolas e os ameaçou.

Temos, então, que o governo paulista “acusa”. Mas cadê a Ronda Escolar? Cadê a legião de policiais que foi colocada nas primeiras ocupações, sob o pretexto de “oferecer segurança aos manifestantes”? Na EE Fernão Dias Paes, que se tornou símbolo do movimento, chegou-se a ter quase uma centena de policiais fazendo um cordão em volta da escola. Uma coisa é retirar uma tropa que ameaçava quem não precisa de tropa. Outra, retirar a segurança mínima. Por que ela foi retirada?

Está em jogo a velha pecha “de vândalos”, “baderneiros” ou “depredadores” para desqualificar a imagem de manifestantes. E a imprensa cumpre um papel importante na perpetuação deste discurso. Como mostrei neste artigo de 2013: “As elites vândalas, a imprensa baderneira e os policiais bandidos“. Desqualificava-se todo um movimento por causa de alguns manifestantes mais violentos, numa lógica de demonização – nunca feita na mesma intensidade para os atos violentos de Estado.

Note-se que os próprios secundaristas deste novembro histórico em São Paulo evitaram o confronto. Durante protesto no Palácio dos Bandeirantes, afastaram-se dos black blocs que pressionavam as grades da sede do governo. Essa opção foi decisiva para atingirem seus objetivos. Eles mudaram a estratégia e passaram das ruas para as ocupações de escolas, organizadas, pacíficas, ordeiras; chegaram a pintar escolas e tornar o espaço muito mais atraente do que antes o Estado oferecia.

Por que eles depredariam, então? Por que as lideranças não interviriam? O próprio texto do G1 conta que a Escola Estadual Coronel Antônio Paiva de Sampaio também foi alvo de “vandalismo”. Segundo o insuspeito Fernando Padula, aquele chefe de gabinete da Secretaria da Educação que falou em “guerra” contra os estudantes, foram movimentos políticos (e não estudantes) os responsáveis pela destruição. Mas, se foi assim, por que não usar a palavra “sabotadores”, e não vândalos?

DO LOCAL AO GERAL

Notem que os dois casos ocorreram em Osasco – onde o governo estadual já mostrou que não tem lá muito controle. O município foi, ao lado de Barueri, palco da chacina que deixou 23 mortos, em agosto, após a morte de um PM e um Guarda Civil Metropolitano. Uma cidade com um grupo de extermínio atuante, formado por policiais, não pode ter um grupo de extrema direita que sabote uma iniciativa política bem-sucedida de esquerda, voltada para a preservação de direitos?

Não sabemos se foi isso. Falta investigação. De qualquer forma, porém, sob ambas as hipóteses – grupo político de extrema direita ou mesmo um grupo de extrema esquerda – teríamos um fenômeno localizado. Não algo que possa colocar em questão a imagem de um movimento com outros objetivos e ampla capilaridade, que começou em Diadema e em Pinheiros e logo se espalhou para todos os cantos da metrópole e para outros municípios do Estado. Em ordem.

Agora, com a desocupação das escolas, corre-se o risco de se multiplicar esse discurso da “baderna” e da “depredação”. Alguns tentarão macular a evidente vitória política dos secundaristas. Os jornais têm duas opções: 1) fazer jornalismo; 2) bancar discursos chapa-branca de autoridades com interesse direto em desqualificar essa luta, transformar essas novas lideranças – centenas de lideranças – em “depredadores”. E os que defendem a resistência e uma real democracia precisam ficar atentos.

Até porque, como vemos nesta notícia do próprio G1, duas escolas municipais foram invadidas e depredadas durante o feriado de Tiradentes, em Serrana (SP). Em abril, portanto. (As escolas estavam sem vigilantes.) E não é preciso fazer muita pesquisa para trombar com casos similares. Em todo o Estado de São Paulo e em todo o Brasil, ao longo das últimas décadas. O governo e a imprensa vão culpar os estudantes de novembro e dezembro?

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5 comentários para "SP: a quem interessam as notícias sobre “depredação” nas escolas?"

  1. Tânia Franco disse:

    A estratégia é sempre a mesma: culpa-se o decote pelo estupro e o povo engole. Vemos isso acontecer todo dia. Isso me faz lembrar as mulheres do MST que, há muitos anos, entraram em um laboratório de uma empresa que estava contaminando toda uma região com seus transgênicos e venenos para defender nosso direito de alimentar nossas crianças com alimento limpo e não cancerígeno! Aquele alimento que o povo brasileiro, em sua pacífica convivência com a violência disfarçada, dá aos seus filhos sem reclamar. Foram transformadas em vilãs, medievais, violentas…Hoje, somos o povo que mais consome veneno no mundo! As doenças se multiplicando de forma meteórica e o povo “bem informado” lendo os mesmos pilantras de sempre, que alimentam a mídia comercial, que alimenta o domínio dos que – daqui ou lá de fora – exploram nossas riquezas e destroem nosso povo. O povo não é bobo? Parece que está começando a deixar de ser.

  2. FERNANDO disse:

    Aos pagadores de impostos.

  3. FERNANDO disse:

    Aos pagadores de impostos.

  4. Elcio disse:

    SP: a quem interessam as notícias sobre “depredação” nas escolas? A todos que pagam seus impostos que paga o conserto deste vandalismo !

  5. Elcio disse:

    SP: a quem interessam as notícias sobre “depredação” nas escolas? A todos que pagam seus impostos que paga o conserto deste vandalismo !

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