Sim, era açúcar; caso Imbassahy ilustra o quanto perdemos o bom senso

blowup

Espécie de “Blow-Up” às avessas, investigação nas redes não passou de suposição; apego excessivo a um detalhe ocorre enquanto ocorre um golpe, estrutural

Por Alceu Luís Castilho (@alceucastilho)

Viramos caçadores de imagens fugidias. Durante a sessão de anteontem no Senado, subitamente decidiu-se, nas redes sociais, que o deputado federal Antonio Imbassahy (PSDB-BA), postado logo atrás do senador Aloysio Nunes (PSDB-SP). portava um papelote de cocaína. E essas conclusões súbitas têm-se tornado irrevogáveis. Como se fossem a verdade absoluta e como se fossem… relevantes.

Um olhar atento para o vídeo do G1, em alta resolução, mostra que o objeto que o deputado batuca na mesa é retangular – e branco. Compatível com um sachê de açúcar. E não com um papelote de cocaína. (Droga muito consumida em Brasília, no Congresso e fora dele, e em todo o Brasil.) O leitor mais teimoso poderá ter certeza do contrário. Mas estará sendo leviano se acusar sem provas.

No filme “Blow-Up” (1966), de Michelangelo Antonioni, o protagonista descobre um crime, em um parque, a partir de ampliações sucessivas de uma foto. Neste nosso arremedo de investigação, damos um close e decidimos que o parlamentar está cometendo um crime. Porque sim. Ou porque é tucano. Naquele caso havia a ampliação de sentido, uma ressignificação – do banal para o relevante.

No Brasil, em 2016, ocorre o contrário. Estamos em pleno processo de votação de impeachment de uma presidente eleita com 54 milhões de votos. Estamos diante de um golpe. De algo extremamente estrutural para os rumos do país. E, de repente, não mais do que de repente, voltamos nossos olhos para as mãos de um único parlamentar – como se fôssemos observadores de títeres.

A denunciar hipocritamente (em boa parte dos casos) a suposta hipocrisia do deputado. Ora, Imbassahy e tantos outros são hipócritas e cínicos pelo que eles vêm fazendo com a política brasileira, com essa implosão da democracia. Não por batucar um saquinho. E, se fosse cocaína, seria ele o vilão, como consumidor? Claro que não. Não era ele o dono do helicóptero com 500 quilos da droga.

É claro que a política antidrogas precisa mudar. Que ela tem interesses geopolíticos, convém aos aparelhos repressivos. Que ela é responsável por um duplo genocídio no Brasil: o que acontece nas periferias, com jovens assassinados por policiais, e nos presídios – onde essas pessoas são despejadas em condições subumanas para morrerem de tuberculose ou facada.

Mas não pode ser uma mão que balança um saquinho a notícia deflagradora desse debate. Temos chacinas o suficiente para que – observem que o cinismo nos ronda – tomemos esse fato banal (e suposto) como o fato a nos debruçarmos. Até porque a decisão que estava sendo tomada ali do lado – a do impeachment – pode significar uma piora também nos mencionados genocídios.

O curioso é que os que estão a julgar e linchar o deputado são os mesmos que abominam a condenação sem provas de Dilma Rousseff. Ou pelo menos a condenação desproporcional. Contraditório, claro. E típico do momento linchador em que vivemos. Passamos a tomar as imagens aparentes como expressões da realidade. E perdemos o senso de proporção – esse que era tão caro a Michelangelo Antonioni.

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16 comentários para "Sim, era açúcar; caso Imbassahy ilustra o quanto perdemos o bom senso"

  1. Pedro Costa disse:

    Perdão, mas esse republicanismo em política funciona só entre teóricos; discursos éticos não funcionam aqui embaixo onde foram as botinadas abaixo da correntinha que levaram a população, em sua maioria, a achar que todos os pilantras do universo foram e são os dos governos do PT.
    Aqui embaixo, um bote de lata é um iate e um sachê de açúcar (tem certeza?) pode ser uma carreira, sim! Reproduzi (sem afirmar o que era e quem batucava o pacote suspeito) as imagens, entrando no jogo, e faria novamente.

  2. Pedro Costa disse:

    Perdão, mas esse republicanismo em política funciona só entre teóricos; discursos éticos não funcionam aqui embaixo onde foram as botinadas abaixo da correntinha que levaram a população, em sua maioria, a achar que todos os pilantras do universo foram e são os dos governos do PT.
    Aqui embaixo, um bote de lata é um iate e um sachê de açúcar (tem certeza?) pode ser uma carreira, sim! Reproduzi (sem afirmar o que era e quem batucava o pacote suspeito) as imagens, entrando no jogo, e faria novamente.

  3. Lili Santos disse:

    Ah, faça-me o favor! Nessa altura do campeonato não podemos nem mais rir e sacanear um golpista? Discordo que quem está atento ao golpe tenha esquecido desse acontecimento por causa do saquinho de cocaína, açúcar, sal, pó de pemba ou seja lá o raio que for. Pelo menos, as pessoas que conheço não, vi muito mais um momento de riso e de desanuviar da porcaria toda. Além disso, também vi muita gente falando sobre a hipocrisia e a injustiça, o apoio a políticas repressivas em relação a drogas, a campanha safada pela redução da maioridade penal, caso aquilo seja mesmo um papelote.

  4. Lili Santos disse:

    Ah, faça-me o favor! Nessa altura do campeonato não podemos nem mais rir e sacanear um golpista? Discordo que quem está atento ao golpe tenha esquecido desse acontecimento por causa do saquinho de cocaína, açúcar, sal, pó de pemba ou seja lá o raio que for. Pelo menos, as pessoas que conheço não, vi muito mais um momento de riso e de desanuviar da porcaria toda. Além disso, também vi muita gente falando sobre a hipocrisia e a injustiça, o apoio a políticas repressivas em relação a drogas, a campanha safada pela redução da maioridade penal, caso aquilo seja mesmo um papelote.

  5. Alexandre Maruca disse:

    Ótimo texto, perfeito.

  6. Alexandre Maruca disse:

    Ótimo texto, perfeito.

  7. Marco Almeida Souza disse:

    Eu nunca vi açúcar ser vendido em pacotinho de plástico sem rótulo, mas… vai que é, né?

  8. Marco Almeida Souza disse:

    Eu nunca vi açúcar ser vendido em pacotinho de plástico sem rótulo, mas… vai que é, né?

  9. Paulo Dias Tavares disse:

    Que preguiça, gente. Nivelar o debate por causa do saquinho de sei lá o quê? É fácil partir dessa premissa, já que na internet tem opiniões e teorias pra todos os gostos, e usar isso de trampolim pra querer sanear o debate. Assim como quem diz categoricamente sem provas que aquilo era pó, outros, como você, dizem categoricamente que era açúcar, e assim ficamos sem saber o que era. Mas a suspeita que o gesto e objeto do senador levantaram são realmente relevantes, até porque é de se estranhar que alguém carregue açúcar naquela embalagem, num lugar que já tem açúcar de montão junto às garrafas de café; num lugar onde, como você mesmo disse, usar cocaína é comum, inclusive para aguentar acordado discursos monótonos e sessões que se arrastam madrugada adentro. Pra que então querer bancar o isentão imparcial a essa altura do campeonato e usar o mote pra criticar quem se indigna com corruptos hipócritas, aderindo ao jogo do meme? Pra que esse purismo estéril, sectário? Evocar como argumento que o usuário é vítima, nesse contexto, é de uma ingenuidade tosca. É querer ser mais realista que o rei.

  10. Paulo Dias Tavares disse:

    Que preguiça, gente. Nivelar o debate por causa do saquinho de sei lá o quê? É fácil partir dessa premissa, já que na internet tem opiniões e teorias pra todos os gostos, e usar isso de trampolim pra querer sanear o debate. Assim como quem diz categoricamente sem provas que aquilo era pó, outros, como você, dizem categoricamente que era açúcar, e assim ficamos sem saber o que era. Mas a suspeita que o gesto e objeto do senador levantaram são realmente relevantes, até porque é de se estranhar que alguém carregue açúcar naquela embalagem, num lugar que já tem açúcar de montão junto às garrafas de café; num lugar onde, como você mesmo disse, usar cocaína é comum, inclusive para aguentar acordado discursos monótonos e sessões que se arrastam madrugada adentro. Pra que então querer bancar o isentão imparcial a essa altura do campeonato e usar o mote pra criticar quem se indigna com corruptos hipócritas, aderindo ao jogo do meme? Pra que esse purismo estéril, sectário? Evocar como argumento que o usuário é vítima, nesse contexto, é de uma ingenuidade tosca. É querer ser mais realista que o rei.

  11. sidney carvalho disse:

    amigos, sera que vivemos somente e sobre o grande manto da especutalizaçao de tudo? ate da nossa banalidade? afinal o saco ‘de pó branco nao identificado’ é mais importante do que o processo todo? fazemos despolitizaçao quando nao trazemos nosso debate pro campo correto. apresentamos fatos como se fossem provas, igualzinho eles tem feito, entao o que nos diferencia? porque fazer a denuncia se somos iguais? precisamos urgentemente olhar nossas praticas pra que nao fiquem copias daqueles que execramos.

  12. sidney carvalho disse:

    amigos, sera que vivemos somente e sobre o grande manto da especutalizaçao de tudo? ate da nossa banalidade? afinal o saco ‘de pó branco nao identificado’ é mais importante do que o processo todo? fazemos despolitizaçao quando nao trazemos nosso debate pro campo correto. apresentamos fatos como se fossem provas, igualzinho eles tem feito, entao o que nos diferencia? porque fazer a denuncia se somos iguais? precisamos urgentemente olhar nossas praticas pra que nao fiquem copias daqueles que execramos.

  13. Júlia disse:

    Ressalvado meu posicionamento pessoal de nunca ter usado nenhum tipo de drogas lícitas ou ilícitas, reconsiderei a questão da criminalização, em razão das motivações expostas pelos especialistas (juristas, médicos, estadistas etc) da área. O fato de a repressão servir para fomentar a violência, a indústria das armas, a lotação do sistema prisional e por aí vai. Definitivamente, de minha parte, não é complacência com maconheiro e muito menos com Senador viciado, que não se constrange em balançar seu pó em pleno CN…

    “ESCLARECIMENTO: É COCADA BOA OU NÃO É?
    Era açúcar ou Cocaína que estava na mão de um Senador, durante as perguntas que o Senador Aloísio Nunes do PSDB fazia para Dilma Rousseff, no Senado Federal nesta Segunda Feira 29 de agosto de 2016? descobrimos que os fabricantes de açúcar em “saches” não utilizam de embalagens plasticas, por questões higiênicas e de conservação do produto,buscamos 13 marcas de açúcar para ilustrar esse post, e não conseguimos encontrar fabricante que utilizam saquinhos plásticos e transparente, igual aquele que estava com o NOIA no Senado Federal, assistam o vídeo, e compartilhem.”
    https://www.facebook.com/mauriciopina.pina.5/videos/1085629341519170/

    No mais, quanto à acusação “sem provas”, estamos apenas “na crista do momento”. Portanto, compartilhei o post nos mesmos termos que ora comento. E não me arrependo!

  14. Júlia disse:

    Ressalvado meu posicionamento pessoal de nunca ter usado nenhum tipo de drogas lícitas ou ilícitas, reconsiderei a questão da criminalização, em razão das motivações expostas pelos especialistas (juristas, médicos, estadistas etc) da área. O fato de a repressão servir para fomentar a violência, a indústria das armas, a lotação do sistema prisional e por aí vai. Definitivamente, de minha parte, não é complacência com maconheiro e muito menos com Senador viciado, que não se constrange em balançar seu pó em pleno CN…

    “ESCLARECIMENTO: É COCADA BOA OU NÃO É?
    Era açúcar ou Cocaína que estava na mão de um Senador, durante as perguntas que o Senador Aloísio Nunes do PSDB fazia para Dilma Rousseff, no Senado Federal nesta Segunda Feira 29 de agosto de 2016? descobrimos que os fabricantes de açúcar em “saches” não utilizam de embalagens plasticas, por questões higiênicas e de conservação do produto,buscamos 13 marcas de açúcar para ilustrar esse post, e não conseguimos encontrar fabricante que utilizam saquinhos plásticos e transparente, igual aquele que estava com o NOIA no Senado Federal, assistam o vídeo, e compartilhem.”
    https://www.facebook.com/mauriciopina.pina.5/videos/1085629341519170/

    No mais, quanto à acusação “sem provas”, estamos apenas “na crista do momento”. Portanto, compartilhei o post nos mesmos termos que ora comento. E não me arrependo!

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