Repressão histórica da PM em São Paulo tem centenas de testemunhos

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Manifestante encurralado na Rua Sergipe (Foto no perfil de José Eduardo Bernardes/ Facebook)

Estes são alguns relatos iniciais de um dia de ditadura na maior cidade do Brasil; que se instale imediatamente uma Comissão da Verdade para apurar a violência estatal

Por Alceu Luís Castilho (@alceucastilho)

“Neste momento, dezenas de bombas atiradas contra as pessoas, qualquer uma, manifestante, usuário de transporte, idoso, criança, ou quem quer que seja. o cenário é de guerra, pessoas feridas e presas, muita fumaça e desencontros. Estamos encurralados”. (Igor Carvalho, no Facebook)

“Estou na Paulista acabo de presenciar um massacre pela PM, muitas bombas e truculência. Estamos em meio a uma guerra! Com muitos me refugiei em uma loja asfixiados pelas bombas na porta. Só saímos pressionados e insultados pela PM, cercados de todos os lados! Liberdade de manifestação não existe em SP, foi suprimida pela Força e pelas bombas, fui alvo de várias, não há diálogo possível, tentamos tudo! Depois do Caldeirão de Hamburgo, a PM agora promove uma caçada dos manifestantes pelas ruas da cidade, os seguranças do metrô impedem a entrada, todas as ruas cercadas, manifestantes perseguidos e caçados com furor!” (Padre Julio Lancelotti, no Facebook)

“Hoje foi o ato mais violento que já participei na vida… a PM cercou o local do encontro da manifestação, dispersou todo mundo com bomba pra caralho jogadas EM CIMA das pessoas, rachou a cabeça de um moço” (Flavia Brancalion, em coletânea de relatos feita pelo Coletivo Juntos)

SEM ROTA DE FUGA

“Manifestantes que tentam se proteger em lojas, prédios e institutos da Avenida Paulista e imediações estão sendo rendidos pela Polícia e tendo que sair desses lugares sob ameaças, intimidação e de mãos para o alto”. (Coletivo Juntos)

Hoje estávamos no Instituto Miguel Cervantes e mesmo passando mal e com pessoas feridas a PM continuou a jogar bombas DENTRO do prédio pra nos torturar a PM lançou mais de DEZ BOMBAS com nós todos lá dentro, mesmo não fazendo nada, estando feridos e em pânico, a PM não poupou esforços e bombardeou tudo de gás, e ainda ameaçaram todos nós dizendo que quem não saísse de mãos levantadas seria preso”. (Juan Alan, no Facebook)

Desci a Consolação toda praticamente correndo… na altura do cemitério as pessoas que estavam descendo a Consolação tiveram que entrar por Higienópolis mas a PM continuava cercando tudo e todos, sem parar com as bombas. Toda a população ficou amedrontada”. (Miguel Tadeu Vicentim, no Facebook)

“Também nos fizeram uma emboscada na rua Sergipe. Bombas e mais bombas e mais bombas em uma rua cercada por policiais. Impossível passar por qualquer lugar. Depois disso, revistas, xingamentos, palavras de ordem autoritárias, pessoas detidas, chutadas, enfim, total despreparo de todos os policiais”. (Thaís Soares, no Facebook)

“Depois que a maior parte dos manifestantes foi empurrada pra tomar bomba na Paulista, que estava totalmente cercada e sem rotas de fuga, eu sobrei com um grupo pequeno de pessoas que teve que sair correndo. Mesmo depois de parar de filmar eles continuaram jogando bomba”. (Thomaz Pedro, no Facebook)

COVARDIA

“Durante a dura repressão da Polícia Militar ao ato de hoje (12/01) contra o aumento da tarifa de metrô, trem e ônibus em São Paulo, muitos manifestantes foram feridos por balas de borracha e estilhaços das bombas de gás lacrimogênio. Entre eles, o estudante de arquitetura Gustavo Camargos e Silva, 19 anos, teve uma fratura exposta na mão, com fraturas em vários pontos”. (Jornalistas Livres)

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“No momento meu primo de 19 anos, moleque de tudo, estudante de arquitetura, está no hospital sendo operado. ele tomou uma bomba de gás da PM na mão, teve fratura exposta e um tendão rompido”. (Paula Sacchetta, no Facebook)

Foi um massacre, ontem! Todos apanhamos… Jogaram bombas na minha direção sendo que estava com uma mulher ferida nos braços”. (Erick Vinicius Borges, no Facebook)

“E as Bombas explodem no vale e por aqui na Xavier de Toledo. Truculência, violências generalizadas, espancamentos covardes”. (Átila Pinheiro, no Facebook)

ATROPELAMENTO

“Ninguém me contou, eu vi. Por volta das 20h, na esquina da Consolação com a Maria Antônia, meia dúzia de policiais em motocicletas perseguiam um manifestante que fugia pela rua da Consolação, subindo em direção à Paulista. As motos atropelaram propositalmente o manifestante, que caiu e bateu a cabeça no meio-fio”. (Ícaro Vilaça, no Facebook)

“Depois de você ver um jovem ser atropelado por policiais de forma proposital e ser lançado no chão, perseguido por aproximadamente cinco motos, que lançaram o jovem na calçada que você estava e não poder fazer nada, porque muitos outros policiais te cercam e não deixam você filmar… Você se sente um impotente que não pode fazer nada”. (Fernando Rocha, no Facebook)

‘VOU QUEBRAR SEUS DENTES’

“O motorista tirou a arma de fogo letal de dentro do carro para me fazer parar. Joguei minha mala no chão e eles mandaram eu abrir as pernas e colocar a mão na cabeça de costas. Neste momento eles gritaram:

— Sua mala está pesada né? Tem explosivo aí? – Fiquei com muito medo de eles implantarem algo. — Você tem passagem na delegacia? O que faz da vida?

Eu respondi que não tinha, que era estudante e trabalhador de carteira assinada, que estava lá porque era contra o aumento.

– Repete para mim: você tem sorte de estar vivo – repeti – é a primeira vez que te vejo aqui, se eu te ver de novo em manifestaçãozinha de esquerda vou quebrar seus dentes e você vai cuspir um a um.

Estava com muito medo, mas tentei olhar as identificações dele. Eles não deixavam.

— Olho nos meus olhos seu vagabundo, vou dar um tapa nessa orelha com brinco até rasgar ele fora.

Depois disso eles tiraram dezenas de fotos minhas, do meu rosto com RG etc.

— Você tá no meu “book” agora, se eu te pegar de novo vou te estraçalhar.

Eles revistaram minha mala inteira, ficaram me aterrorizando. Depois que terminou eu segurava minha camiseta para cima pois ela encostava no machucado do estilhaço da bala e ardia muito.

– Tomou bala é? Isso é menos do que você merece, eu tô com vontade de te encher de porrada aqui. Tira essa camiseta do partido e põe na mala que cê tá liberado, cê entendeu?

Foi horrível, mas eu tive de tirar a camiseta que expressa minha posição política e colocar dentro da mala como se eu tivesse vergonha dela. Eu tinha outra camisa que ele me obrigou a vestir e fui embora”. (Raul Santiago, na página do PSOL)

‘OLHOS ARDIAM, MAS SEM LÁGRIMAS’

“A bomba de gás estourou no saguão externo do Instituto Cervantes, dali alguns segundos a fumaça iria se espalhar, fazer os olhos arderem, dificultar a respiração, atordoar ainda mais os sentidos. (…)

A primeira descida foi no momento do desespero inicial. Com bombas explodindo nas costas e uma numerosa tropa militar à frente restou a mim e a muitas outras pessoas encarar o confinamento. Respirar a fumaça que invadiu o espaço, ouvir o barulho das bombas lá fora e saber-se completamente sem saída. Voltar para o subsolo não era um horizonte razoável.

Mãos ao alto, tal como civil na linha de frente da guerra, caminhei na direção da avenida Paulista. Contei que o próximo disparo demoraria tempo suficiente para que pudesse me render. Ganhei a rua, mas a liberdade parecia inalcançável.

À frente o enorme buraco do túnel que cruza por baixo da praça do Ciclista, intransponível trincheira. À esquerda duas fileiras de policiais militares em formação perfilados na frente dos homens com escopetas em punho. Dali, a menos de 10 metros, era de onde saia o terror em forma de arma química.

Caminhei em direção a eles, um passo, talvez dois. Aos berros, mandaram-me voltar. Consegui ver que as pistas da avenida do outro lado estavam livres, bastava contornar o gradil que isolava o buraco para afastar-me do centro do massacre de terror.

Consegui chegar à retaguarda, onde outra linha de policiais com mais escopetas e menos escudos estava posicionada. Novamente meu rumo foi definido por um berro vindo de um policial militar. Deveria me posicionar atrás da linha e não na lateral.

Parei em frente à igreja, os olhos ardiam, mas sem lágrimas. Centrei-me em respirar vagarosamente para não absorver mais gás tóxico. As mãos tremiam. O pior passou”.  (João Lacerda)

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12 comentários para "Repressão histórica da PM em São Paulo tem centenas de testemunhos"

  1. Alda Duarte disse:

    Injustificável, lamentável esse massacre num país democrático! Se alguém tinha alguma dúvida quanto a postura democrata do PSDB, agora a máscara e os escrúpulos caíram de vez! Caso a ser levado a corte internacional; Desmilitarização já!

  2. Cristiane disse:

    Infelizmente presencie toda essa violência e não como manifestante, mas como uma cidadã comum e indignada. Sou professora de espanhol e estudo no Instituto Cervantes. No momento que a primeira bomba explodiu estava na biblioteca do instituto trabalhando em um texto sobre o acidente nuclear de Chernobil que ocorreu 30 anos atrás por culpa dessa classe política que massacra o cidadão em prol do seus interesses. Parei imediatamente meu trabalho e corri para a parte da frente da biblioteca, onde a visão para a avenida Paulista era melhor. Nesse momento eu e meus colegas de estudos ficamos chocados com a quantidade de pessoas que corriam desesperadamente na tentativa de fugir das bombas e dos gases, enquanto mais e mais bombas explodiam.
    Num determinado momento essas pessoas começaram a entrar desesperadas no prédio e foi ai que a polícia jogou uma bomba praticamente dentro do edificio. Foi horrível. A sensação era que o prédio iria desabar. Junto com a explosão da bomba veio a explosão da porta de vidro que ficou em pedaços. O desespero era total. Os manifestantes, na maioria jovens, gritavam por água e por uma janela por onde pudessem respirar. Não tínhamos como ajudar, pois também estávamos presos ali. Alguns jovens saíram do prédio depois de um certo tempo e a polícia os recebia com o cacetete nas mãos. Vi muitos apanharem e essa ação só parou quando os policiais perceberam que estávamos fotografando e filmando. Por mais de 30 minutos ficamos todos ali, separados por uma parede de vidros, mas vítimas da mesma opressão. Em determinados momentos eu senti como se não vivesse em um país democrático. Repassei na minha mente as cenas de violência que aconteciam na época da ditadura e percebi que o nosso passado não foi esquecido e que de um dia para outro podemos perder essa frágil liberdade. Senti medo, senti raiva e é com muita tristeza que confesso que sinto vergonha do meu país.

    • Karina disse:

      Nossa… Me senti vivendo o que vc descreve e TB senti raiva e medo. A gestão do nosso estado (que da as diretrizes para a ação dos policiais) é lamentável! =(

      • Fernanda disse:

        Lendo seu relato parece que vivi este momento de terror.
        Muito ruim também perceber a fragilidade desta dita democracia e paz…”paz sem voz não é paz é medo…”

  3. Bruno disse:

    Massacre da PM

  4. Carolina disse:

    Sou a favor da ideia do protesto, um protesto Pacífico contra o aumento das passagens, porém o que pude perceber é que certas coisas dentro do protesto saíram do controle, surgiram vândalos para fazer arruaça e depredação à patrimônios públicos e privados. A partir dessa desordem fez se necessário a ação da polícia, e então tudo virou bagunça, das duas partes! Essas notícias publicadas pela mídia só estão mostrando um lado da história, como se a ação policial tivesse surgido do nada e por nada, o que é uma grande inverdade! Interessante seria se tais jornalistas buscassem expor os dois lados da história porque eles existem, e mostrassem a notícia de forma imparcial, como deve ser! Muitos manifestantes se machucaram não só por culpa dos policiais, mas também por culpa dos baderneiros que provocaram tal situação. A polícia tem como dever ao menos tentar proteger a população e bens, e diante de tal confusão é óbvio que fez se necessário intervir e tentar conter e acabar com a bagunça, infelizmente ela foi tão grande que acabou envolvendo muitas pessoas inocentes! Decepcionada com esse tipo de jornalismo que só defende um lado tentando fazer o outro se passar por vilão!

  5. marcio ramos disse:

    Nada justifica as ações da PM, mas… e tudo tem um mas, na boa, sempre foram assim, Mario Covas, Quercia, Kassab, Fleury, Alckmin, etc. Sei muito bem cansei de acompanhar movimento social nas ruas, de ver PM apavorando, batendo em criança e mulher sem-teto. Falar de novo… sempre foi assim. É claro é sempre seletivo as porradas, quem determina e o Comando da PM, ou alguém ja viu indígena se manifestar no MS de boa? Pescador artesanal se manifestar de boa no ES? Ambientalista se manifestar no Pará em alto astral? tubarão tem pescoço?

    É o seguinte, a PM e subordinada as Forças Armadas e ao Comando da PM e ao governador do Estado, o nazi Alckmin. Ou vai la e coloca o microfone pro comando se explicar ou vai ficar no blablabla. ate quando?

    Sabia que tem comandante da operação? Nem vou falar que o povo do paninho na cara, continuam fazendo uma merda atras da outra, mas até ai foda-se. Se o povo do paninho na cara quer confronto com a PM ja falei, vai tocar o terror no primeiro batalhão Tobias de Aguiar e deixa a população e os inocentes inuteis de fora da treta; se querem tarifa zero tem que ser pelas vias politicas, ter estrategia inteligente e convencer o povo, fora isso tem que ver direito porque o MPL continua fazendo cagada. Banqueiro ta cagando um monte que os do paninho na cara quebrem simbolos capitalistas, bobagem; a comunidade qd encontra sua loja detonada não gosta;qd encontram orelhão e outros detonados não gostam; ta perdendo moral com a comunidade. Em movimento social os do paninhos nem se achegam que apanham, Na boa, to falando a real. Ou muda a estrategia ou vai comer chumbo, quem come chumbo são os desavisados, os inocentes inuteis porque os de paninho na cara saem fora na hora certa, teatrinho montado, ja acompanhei esta merda. to fora pq to com ligamento do joelho rompido…

    Ja participei de manifestação do MPL com o povo do paninho na cara e e sempre a mesma estrategia, é sempre igual… teatrinho montado. Desta vez o cerco se apertou, é um processo. Soldadinho ja falei e pau mandado, espero que alguém ae consiga fazer o comando falar, eles que tem que se explicar, o resto e materia de midia burguesa, pode ter ate boas intenções mas não basta.

    • Alceu Castilho disse:

      Marcio, dois pontos: 1) Os policiais não estão subordinados às Forças Armadas. A rigor, a Polícia Militar não é militar – é civil. Ainda que funcione sob uma lógica militar. Quem manda é cada governador; 2) Sobre black blocs, creio que este artigo contribua para uma reflexão sobre as consequências dessa estratégia: http://outraspalavras.net/alceucastilho/2016/01/09/repercussao-dos-atos-do-mpl-esta-preestabelecida-maioria-e-figurante/ Mas tenho de colocar uma ressalva: não foi isso o que aconteceu no dia 12 e no dia 14 em São Paulo. O que houve foi apenas violência gratuita (o que também acontece quando participam os black blocs), de exclusiva responsabilidade da polícia.

      • Marcio Ramos disse:

        Não mesmo:

        1) A PM é subordinada sim. Eu servi o Exército. Aprontei muito e vi soldado da PM prestando continência dentro de delega pra mim e parceiros de pelotão. Pergunte pra qualquer soldado das Forças Armadas como a PM reage diante de uma farda das Forças Armadas. “A rigor” aqui não existe. Desculpa, a realidade é outra. 2) Governador manda? Manda sim se tiver poder. Presidente manda? Que é que manda? Então explique por que entra governo sai governo e ninguém muda a PM? Pesquisas apontam que a própria PM quer mudanças. Alguém vai entrevistar o comando, encarar o comando, saber quem e responsável por esta ou aquela operação? Não, ninguém.

        O que aconteceu dia 12 e dia 14 vai acontecer de novo. Quer apostar? Sim foi diferente sim, mas já esperado. Eu esperava. Tenho bola de cristal? Não tenho, mas ja participei de manifestação do MPL com os de paninho na cara é sempre a mesma estratégia, por isso eu ja esperava. Mas não vou descrever aqui o teatro montado, pra quê? Ou mudam a estrategia ou alguma coisa esta errado, não acha? Querem tarifa zero, transporte digno ou querem outra coisa? Cadê o apoio da população, pobre e carente como eles gostam de dizer que defendem? O nazi Alckmin falou sorrindo que a população aprovou as ações da PM. Alguém vai duvidar?

        • Alceu Castilho disse:

          Você se refere à IGPM? Não é ela quem manda, quem manda é cada governador.

          • Marcio Ramos disse:

            Tem razão, quem manda é cada governador, estão subordinadas administrativamente. Mas para fins de organização estão subordinadas ao Exercito Brasileiro, aprendi isso no Exercito e é de conhecimento publico. Em níveis operacionais estão subordinadas as Secretaria de Estado da Segurança.

            A IGPM, bem a IGPM é isso ai: “Executar, no âmbito do Exército Brasileiro, como Órgão Central, as ações de coordenação e controle das Polícias Militares e dos Corpos de Bombeiros Militares, de acordo com a legislação vigente”.

            Ficamos assim.

            Ditadura pra quê, com tudo isso né?

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