Polícia irritadinha de Alckmin disfarça objetivos eleitorais e planificadores

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Garantia de paz durante protesto em SP, segundos antes das bombas (Reprodução/ TV Drone)

Comportamento irracional de PMs está a serviço de um projeto para 2018; governador quer ser terceira via para setor mais conservador e intolerante da sociedade

Por Alceu Luís Castilho (@alceucastilho)

São Paulo tem uma polícia irritadinha. Estourada. Suscetível, cheia de quereres. “Eu não quero, eu não quero, eu não quero que a manifestação seja por ali, tá?” Uma polícia com profissionais impulsivos, vingativos. Comandantes traiçoeiros, que prometem paz enquanto a alguns metros outros estouram bombas. Uma antítese do que deveria ser uma polícia, portanto. Antropoformizada, alienista radical – somente ela é que está certa. Sob o argumento de proteger a população, que se cubra ela de porradas, que se ameace sua vida. Paradoxal.

Mas toda essa característica temperamental da Polícia Militar do Estado de São Paulo esconde cada vez mais um movimento inverso – frio e eleitoreiro – do governador do Estado de São Paulo. Sujeito apenas a punições etéreas (alguma condenação do Brasil na Corte Interamericana dos Direitos Humanos, em um futuro distante), ele se vê no direito de usar a tradição truculenta da corporação e a formação precária dos PMs para seus objetivos mesquinhos. O Caldeirão de Hamburgo – o cerco covarde a manifestantes – desafia a democracia, mas dá votos. A irracionalidade é aparente.

Geraldo Alckmin articula na repressão policial planejadamente impulsiva (o Brasil não é mesmo para iniciantes) seu trunfo eleitoral. Como terceira via à direita. Quem precisa de Russomannos e Datenas? O governador paulista consegue com essa truculência teimosa agradar o eleitor de Bolsonaro e a elite paulista – essa elite engordada por uma classe média raivosamente suicida – numa cajadada só. Ou numa sucessão de golpes de cassetete. Uma democracia para aqueles que gostam de democracia pela metade, quem sabe com um político de direita eleito por um partido socialista (o PSB).

É a política do cassetete fingido. Alckmin vislumbra o Palácio do Planalto a partir da lógica do gás de pimenta e da defesa incondicional das catracas. Na falta de uma discussão política séria, densa, diante de uma mídia idiotizada e com jornalistas devidamente uniformizados (e com a liberdade de imprensa ameaçada), o tucano aglutina em torno do gás lacrimogêneo o espectro do inimigo fácil, de um inimigo falso: os manifestantes, reduzidos à condição de perigosos. Não apenas os black blocs, todos os manifestantes são proclamados como perigosos nessa máquina de propaganda mortífera.

A birra de não querer que a manifestação siga por determinado caminho é acompanhada de movimentos planejados, do fechamento de estações e terminais, de forma a gerar insatisfação dos trabalhadores – a classe média foi ludibriada há tempos – com os estudantes. Como se os policiais violentos fossem honrados cidadãos a serviço da ordem e do progresso. Por mais que seja contraditório, Alckmin afirma seu lado certinho e sua aparência inofensiva a partir da dor, de dentes arrebentados. Como um bedel que convocasse os brigões da escola para colocar ordem no grêmio estudantil.

OS DEMÔNIOS DE SÃOPAULOSBURGO

Geraldo Alckmin lembra um pouco Piotr Stepanovich, personagem central de Dostoiévski em uma de suas obras gigantescas, “Os Demônios” (1872). Um manipulador que se utiliza da violência e da irracionalidade dos parceiros para atingir seus objetivos calculados – ainda que numa lógica paralela, insana. Um sonso, aquele que se faz de bobo, mas neste caso com marionetes fardadas. Diferença básica: o jovem russo era um revolucionário inescrupuloso. Alckmin, um reacionário, com seu aspecto discreto de contador incapaz de levantar a voz, a fina flor paulista dos reacionários.

Sim, a polícia de São Paulo precisa ser descrita como excrescência, em sua tradição de guardiã incondicional dos plutocratas e com práticas agravadas pela ditadura de 1964. Mas se não olharmos para 2018 não entenderemos seus últimos movimentos. Eles visam um eleitorado específico, detectado em planilhas. Não à toa se tentou encaminhar as manifestações para a sede da prefeitura. Cada escudo da Tropa de Choque não representa apenas uma defesa paradoxal da ordem; e sim um movimento adiante. Bélico, mas político. Com uma cuidadosa inversão dos demônios. A juventude que quer inclusão e mudanças precisa ter seu fogo apagado por policiais incendiários.

A história brasileira da infâmia assiste a um governador que pretende chegar ao poder com esse voto do medo, o voto por uma metrópole maquinal, por uma política que abafe as contradições. Onde as ruas estejam ali apenas para os carros e o transporte apenas para a ida pacata e sem sustos ao trabalho. E onde aqueles que brigam pelo direito à cidade sejam definidos como obstáculo a ser removido (tarefa facilitada por manifestantes menos estratégicos), por uma polícia que disfarce nos seus espasmos e excessos sua função de catapulta para burocratas planificadores. Esse voto fascistinha.

(Aguarda-se interpretação para a estratégia misteriosa do prefeito petista Fernando Haddad.)

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3 comentários para "Polícia irritadinha de Alckmin disfarça objetivos eleitorais e planificadores"

  1. Marcio Ramos disse:

    A desculpa para a PM bater, agora, é o trajeto.
    http://www.diariodocentrodomundo.com.br/a-desculpa-para-a-pm-bater-agora-e-o-trajeto-por-mauro-donato/

    PM desgracenta. Gambezada de merda, tudo pau mandado, não honram a farda que vestem. Só sabem bater em estudante, trabalhador e em mulheres e crianças sem-teto. Aposto que depois de uma pancadaria desta comandante da operação ainda ganha medalha, ja vi isto acontecer. Com o PCC estes covardes se borram. E o comando corrupto vai bem, só na corrupção desenfreada.

  2. Andréa disse:

    Não visa somente 2018. A PM não é subordinada a Fernando Haddad, que pode ter aumentado as tarifas dos ônibus como foram as da alçada estadual, mas é a favor do legítimo direito de manifestação e contra a violência perpetrada por aquela, não sendo cúmplice, mas alvo do que está a suceder. Vincule-se seu nome à violência perpetrada por quem é subordinada ao Governador e ao Secretário de Segurança Pública e sejam favorecidos com isso os candidatos à prefeitura alinhados com o governador. “Não à toa se tentou encaminhar as manifestações para a sede da prefeitura” diz o texto acima.

  3. Andréa disse:

    Não visa somente 2018. A PM não é subordinada a Fernando Haddad, que pode ter aumentado as tarifas dos ônibus como foram as da alçada estadual, mas é a favor do legítimo direito de manifestação e contra a violência perpetrada por aquela, não sendo cúmplice, mas alvo do que está a suceder. Vincule-se seu nome à violência perpetrada por quem é subordinada ao Governador e ao Secretário de Segurança Pública e sejam favorecidos com isso os candidatos à prefeitura alinhados com o governador. “Não à toa se tentou encaminhar as manifestações para a sede da prefeitura” diz o texto acima.

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