Para conhecer outra agricultura
Publicado 09/08/2012 às 12:42
Seminário e feira no Vale do Ribeira debatem papel cultural da roça para comunidades quilombolas e promovem troca de sementes que ajuda a garantir segurança alimentar
Por Taís Capelini
De onde vem o que nos alimenta? Das prateleiras de supermercados? O hábito de consumir produtos cuja origem desconhecemos quase nos impede de enxergar que a agricultura pode ser, além de produção e comércio, uma forma de… cultura! Dois eventos programados para o final de setembro, em Eldorado (Vale do Ribeira) ajudam a superar esta cegueira. Estão relacionados à prática e à teoria da agricultura dos quilombos.
O trabalho agrícola é a principal atividade produtiva nos quilombos do Vale do Ribeira, sustentando há dois séculos a produção de alimento da região. Mas a atividade de cultivo vai muito além do simples plantio de sementes. Envolve um conjunto de relações, saberes e práticas que, ancorados em valores compartilhados, serve de base para a organização sociocultural quilombola. A roça, que é o centro deste sistema agrícola está também no cerne da manutenção do patrimônio cultural dessas comunidades. Por isso, o reconhecimento de sua importância para a subsistência e segurança alimentar das comunidades quilombolas é imprescindível para a sustentação das mesmas e para a difusão dos valores culturais desses grupos.
Com essa preocupação em mente, o Instituto Socioambiental (ISA) promoverá no dia 18 de agosto a “V Feira de Troca de Sementes e Mudas Tradicionais das Comunidades Quilombolas do Vale do Ribeira”. Essa feira será uma oportunidade para as comunidades quilombolas — localizadas nos municípios de Eldorado, Iporanga, Itaoca, Iguape, Cananeia, Registro e Barra do Turvo — trocarem variedades agrícolas, como tubérculos, verduras, hortaliças e frutas, garantindo assim a conservação da diversidade agrícola. As edições anteriores do evento permitiram que agricultores tradicionais recuperassem variedades de arroz, feijão, milho, mandioca, cará, abóbora, entre outras variedades, garantindo assim a segurança alimentar de todos e ressaltando a importância de iniciativas como essa. Além de conhecer e trocar sementes e mudas, a riqueza cultural do evento também possibilitará que as pessoas provem a culinária local e assistam apresentações culturais das comunidades tradicionais da região.
Antecedendo a Feira, no dia 17 de agosto acontecerá o Seminário “Roças Quilombolas: Alimento, Cultura e Biodiversidade”, que terá como tema o papel da roça na segurança alimentar e na cultura quilombola. O objetivo é fomentar o diálogo a respeito da importância das roças e da agricultura nas comunidades tradicionais, a inserção dos jovens nas atividades tradicionais e políticas públicas de valorização e conservação das roças e sementes. Além disso visa discutir as questões que envolvem soberania alimentar, cultura, uso sustentável dos territórios tradicionais e conservação da biodiversidade, bem como suas tendências e implicações locais e globais. Também há o intuito de construir um conjunto de relatos dos quilombolas a respeito dessas temáticas. Para esse seminário está prevista a participação de cerca de 100 pessoas, representando as 25 comunidades presentes, instituições parceiras, outras comunidades tradicionais e gestores públicos.
A Feira e o Seminário foram finaciados pelo público. Uma cotização lançada por meio do site Catarse, que levandou 31 mil reais e tornou possível a realização dessa importante iniciativa.
Mais informações:
ISA Programa Vale do Ribeira
Rua Paula Souza, 103- Eldorado-SP
Tel (13) 3871 1697
Serviço:
Seminário “Roças Quilombolas: Alimento, Cultura e Biodiversidade”
Data: 17/08/2012, das 09 às 18h
Local: Centro Comunitário de Eldorado, Rua Caraita, s/n. Centro – Eldorado, SP
V Feira de troca de sementes e mudas tradicionais Quilombolas do Vale do Ribeira
Data: 18/08/2012, das 9h às 16h
Local: Rua da Câmara Municipal de Eldorado, próximo à Praça Nossa Senhora da Guia, Centro, Eldorado/SP
Realização:
Instituto Socioambiental (ISA)
Apoio:
AIN/OD (Ajuda da Igreja da Noruega/Operação dia do trabalho); CFDD (Conselho Federal Gestor do Fundo de Defesa dos Direitos Difusos); CEPCE (Centro de educação, Profissionalização, Cultura e Empreendedorismo); EAACONE (Equipe de Articulação e Assessoria as comunidades Negras); FAQUIVAR (Federação das Associações Quilombolas do Vale do Ribeira); FF (Fundação Florestal); ITESP (Instituto de Terras do Estado de São Paulo); Núcleo Oikos; Prefeitura Municipal de Eldorado; Prefeitura Municipal de Itaóca, Prefeitura Municipal de Registro, SEC (Secretaria da Cultura do Estado de São Paulo).
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Esse evento é de suma importancia para a diversificação de sementes crioula e sua manutenção junto ao próprio agricultor, do qual a semente é seu maior patrimonio.
Parabens e boa feira para as comunidades Quilombólas e da Agricultura Familiar.
Abraço a todos e todas.
Um importante passo para a soberania alimentar é manter as sementes nas mãos dos camponeses e não no interior dos cofres das corporações da biotecnologia. Patentear sementes, patentear algo vivo, indispensável para a própria existência da vida humana, é um ato covarde e predatório. É retirar a auto-suficiência das comunidades agrícolas e ancorá-las aos grilhões neoliberais das commodities e das tecnologias que partem das gigantes químicas-farmacêuticas-biotecnológicas, e são impostas com violência.