Maconha e a comunidade acadêmica

Por que o corpo docente da USP não se manifesta na forma de um abaixo-assinado contra a continuidade da proibição e perseguição ao uso da maconha no país?

Por Henrique S. Carneiro, no DAR – Desentorpecendo A Razão

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A tentativa de prisão de três estudantes pela PM na FFLCH e a reação dos seus colegas em sua defesa é um episódio revelador das muitas contradições que existem em nossa sociedade.

Em primeiro lugar, fica patente o sentido absurdo do proibicionismo de certas drogas. O uso de cigarros ao ar livre em lugar retirado seja de tabaco, de cravo ou de maconha, não afeta ninguém exceto os seus usuários. É uma conduta tipificada na teoria do direito como isenta de qualquer princípio de lesividade. O bem estar público não estava sendo afetado. Ninguém estava sendo ameaçado em seus direitos nem havia nenhuma violência em curso. A própria legislação vigente por meio da lei 4330 já entende que o uso de drogas em si não deva ser penalizado.

O uso de maconha em parques, praias e locais abertos é prática disseminada entre milhões de usuários e sua injustificada repressão envolve uma compreensão de que o papel da polícia deva ser o da coerção em massa de práticas culturais recreacionais e de estilos de vida característicos da juventude e das camadas populares. Essa função torna a polícia um veículo de distúrbio da paz social e uma fonte de corrupção devido às extorsões comumente praticadas contra usuários de substâncias ilícitas.

Toda a violência adveio da intervenção da polícia que terminou inclusive usando armas químicas lacrimogêneas que, embora sejam chamadas de “não-letais”, são armas extremamente tóxicas e inclusive cancerígenas. PMs chegaram a ameaçar atirar bombas no interior do prédio da Ciências Sociais e há relatos de que ao menos um tiro foi disparado para o ar. Após a brutal invasão da tropa de choque em 2009, novamente gases tóxicos são espalhados pelos prédios da FFLCH e estudantes agredidos pela polícia que supostamente estaria lá para defendê-los.

A PM no Brasil é um entulho autoritário do período da ditadura militar, é uma polícia militarizada com foros privilegiados que se constitui na força policial mais violenta do mundo, com registro de torturas, assassinatos, até mesmo de juízes, como ocorrido recentemente no RJ, onde a formação das chamadas “milícias” mostra como ocorre um acelerado processo de deriva delinquencial de uma parte do aparelho policial.

O uso de drogas por jovens não pode ser tratado como um caso de polícia. Menos ainda num ambiente escolar, onde o diálogo e a busca de soluções negociadas e não violentas deve ser uma parte constituinte do projeto pedagógico.

O uso de maconha pela juventude há muitas décadas é parte tanto de uma atitude de rebeldia e desafio, elogiável característica da juventude que lhe confere boa parte de sua capacidade de indignar-se, como de uma busca de recursos alternativos aos remédios farmacêuticos para se lidar com a tensão e ansiedade da vida contemporânea ou para se potencializar a criatividade. Quando se sabe que personalidades científicas como Carl Sagan, Stephen Jay Gould, Oliver Sacks ou Sérgio Buarque de Hollanda usaram maconha não se objeta que tal uso tenha sido contraproducente para sua criatividade. Quando um empresário como Steve Jobs declara que sua experiência com LSD foi uma das coisas mais importantes de sua vida ou quando cientistas como Francis Crick reconhecem que a experiência com psicodélicos tem enorme potencial cognitivo, eles não são acusados de apologistas.

Em 1967, diversos intelectuais de todo o mundo, como Gilles Deleuze, François Chatelet, entre outros, assinaram manifesto publicado no Times de Londres, solicitando a despenalização da Cannabis. Passado quase meio século e essa reivindicação continua presente e, mais do que nunca, necessária.

É mais do que hora da comunidade acadêmica se manifestar novamente contra a proibição do uso da Cannabis, explicar para a opinião pública os argumentos contra a mortífera e imperialista guerra contra as drogas imposta ao mundo pelo governo dos EUA e defender o direito ao autocultivo de maconha e exigir que a questão social e cultural das drogas não continue sendo tratada como caso de polícia.

Se até um professor titular da faculdade, ex-presidente da República, se autocriticou de sua política de drogas e aderiu à campanha antiproibicionista, por que a maioria de nosso corpo docente não se manifesta na forma de um abaixo-assinado contra a continuidade da proibição e perseguição ao uso da maconha no país, propondo uma alteração da atual legislação?

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13 comentários para "Maconha e a comunidade acadêmica"

  1. solange whitaker disse:

    discutindo…o que mais preocupa…
    A fome ou o uso da maconha?
    Qual dano maior, o maconheiro ou o faminto?
    Os agrotóxicos? O planeta? A educação?
    O salário dos políticos, a aposentadoria, a saúde?
    O trânsito? A poluição?
    Equanto uns discutem fumantes – outros compram carro.

  2. Istar Lindo disse:

    parabens pela Luta rumo ao progresso!

  3. Vinicius disse:

    Regimes nazi-fascistas, que pretendiam segurar o aumento dos movimentos comunistas, que pretendiam manter um capitalismo, porém, sem o livre mercado (o capitalismo sem capitalismo), que pretendiam manter determinados padrões morais consagrados, eram revolucionários??
    Acho que vc acabou de usar maconha, né?

  4. Vinicius disse:

    uhauhauhuha, boa piada mermão. Esse alucinógino que vc consumiu, ainda tem sobrando?

  5. luciano bravim krüger disse:

    Em tempo, porque a ploícia militar – enquanto órgão résponsável por manter a ordem social, e por isso persegue e prende quem fuma maconha (?!?!?!), não promove o mesmo princípio coercitivo com quem bebe e sai andando pela rua – andando e não dirigindo – e em inúmeras situações causa atropelamentos (do próprio bêbado) e outros acidentes, envolvendo quem nada com a cachaça tinha ou têm?

  6. Irany disse:

    Concordo plenamente com o Jefferson e penso que se a democracia é legitimada pela vontade da maioria, a opinião que deve prevalecer é a dos demais estudantes e não dos professores. Será que todos os estudantes tem a mesma opinião de uma 1/2 dúzia ou esta 1/2 dúzia está lá estrategicamente infiltrada “recebendo favores” para disseminar uma hipócrita cultura de liberdade? Mas qual liberdade estariam apregoando se o viciado(drogas lícitas e ilícitas) é o maior e mais alienado de todos, prisioneiro de si mesmo. Se a maconha não é daninha, por que seus usuários não percebem o fascismo do FHC? Esta é a maior prova de sua alienação. Ademais, se não conseguem perceber algo óbvio, como podem se perceber como uma espécie de “testas de ferro”?. A quem de fato interessa esse tipo de rebeldia? O fato de precisarem de uma retaguarda dos professores, mostra a imaturidade dos manifestantes – bebes chorões que precisam dos pais para protegê-los, atitude típica de quem foi criado por babá(filhos da elite). Resta aos mestres a opção de agirem como pais e atenderem os caprichos de seus filhinhos ou agirem como profissionais comprometidos com jovens verdadeiramente conscientes.

  7. Will disse:

    Como esse Antonio é imbecil!
    Já mostra completa ignorância taxando o socialista fabiano FHC de representante da “elite conservadora”.
    Fica se fazendo de assustado falando de nazismo e o pobre idiota nem sabe que regimes nazi-fascistas eram revolucionários e não reacionários.
    Acha que pode taxar todas as opiniões contrárias a dele de reacionárias e pronto, “bora fumá um back!”
    Deve ser um maconheiro também, coitado … mas fazer o que né? THC faz um estrago irreparável nos neurônios.

  8. Jefferson Arruda disse:

    O que precisamos todos entender é: por que o campus de uma universidade precisa tanto ficar livre da polícia e de uma vigilância que atende exclusivamente à segurança dos alunos, já que se trata de um espaço mantido com o dinheiro de nossos impostos? Será que é só para terem liberdade de expressão?
    Ou é para criar um ambiente de extrema promiscuidade e permissividade, onde todas as práticas bizarras possíveis e imagináveis ocorrem nos corredores, quartos, salas, banheiros e gramados? Sabe-se que em várias universidades, aqueles que não usam drogas e não participam de orgias regadas a bebidas e drogas pesadas, são tratados como lixo, e sofrem bullying.
    Quem não é maconheiro fica marcado como “trouxa” e sofre humilhações.
    O que diriam os pais das garotas se soubessem que a maioria se prostitui para conseguir drogas, e até se envolvem com traficantes de favelas para conseguir mais do que maconha? É isso que precisamos pensar, no futuro dos jovens, que estão se perdendo. Eu já vi crianças fumando maconha e não gosto nem de imaginar como é que
    conseguiram a droga. Fica aí um bom motivo para não fazer apologia às drogas. Se fosse bom, maconha e cocaína seriam vendidas na cantina da escola.

  9. antonio disse:

    O que chama a atenção é o fenômeno do reacionárismo destes tempos, na maior parte dos comentários nos diversos sites.
    Diria que existe uma certa hipocrisia pois quando o fhc, representante da elite conservadora, declara em documentario veiculado na grandes emissoras de tv que é favor da liberalização da maconha, os reacionários da midia e da sociedade concordam com a sua posição ou ficam em silencio, no seu cinismo, acham até politicamente correto.No entanto, quando eses atos a favor da maconha eclodem em uma parcela da sociedade ( os alunos maconheiros da FFLCH) aí a coisa muda de figura.
    Essa parcela reacionária crescente da sociedade, reflexo do momento economico, politico e cultural da epoca, esquece que o fhc era professor da FFLCH, entenderam?
    Outra coisa, é assustador perceber que uma parcela da sociedade ‘letrada e evoluida’ deixa-se influenciar, inconscientemente ou não pelo discurso ideológico hegemonico, disseminado pela grande midia, que molda visões de mundo e valores conservadores, moralistas e intolerantes,(nunca tivemos na grande midia, tantos formadores de opinião extremamente reacionários, preconceituosos e conservadores, que tem orgulho de sê-los). Não podemos esquecer jamais que uma grande parte da sociedade “evoluida” européia da primeira metade do século XX concordou com o pensamento, a moral, intolerancia o preconceito e o ódio dos governos fascistas de mussolini e hitler disseminavam nos meios de comunicação para a massa.
    Apesar de alguns dizerem que a história não se repete, esse cenário atual, me faz pensar o contrário.
    Para entender melhor esse fenômeno reacionário que cresce a cada dia e de forma explícita vale a pena assisitir o filme “das-weisse-band—eine-deutsche-kindergeschichte”, traduzindo para o português “a fita branca – a história de uma criança alemã”.
    Que se manifestem os intolerantes raivosos.

  10. PAULO disse:

    Este artigo deveria ter como título : “apologia do maconheiro”.
    Usar drogas até falar dorgas é ilegal, mesmo que isento de pena de detenção; entretanto, cabe à polícia, sim, fiscalizar e dar encaminhamento conforme determina a lei, “dura lex, sed lex”.
    Sem regras não existe convívio social.
    Se os maconheiros amotinados querem fumar baseado em bobagens revolucionárias, que arquem com as consequências ou busquem meios legítimos e democráticos para reverter o status quo atual do MACONHEIRO.
    Vá fumar mato seco na sua casa e não numa instituição de ensino que deve se ater à educação formal, legal e construtiva.

  11. poucas coisas eu detesto mais na vida do que maconha. O cheiro me causa nauseas. A estética ligada a isso me causa vergonha alheia. Etc.
    Mas dizer que alguém em uso de maconha pode praticar ´atos insensatos´ é de um leiguismo a toda prova. Salvo em raras reações paradoxais, ou num consumo realmente excessivo ao ponto de engendrar uma psicose canábica, o máximo de ato insensato que a maconha pode gerar é dormir, rir abobalhadamente e comer como se não houvesse amanhã.

  12. Rogério disse:

    Manifestação na USP e dos indignados na Cinelândia vários jovens (18 a 29 anos) ocuparam a praça da CineLândia, pós-adolescentes abobados por discursos de falsa liberdade. Na Cinelandia, com cartazes do arco-íris, dos sem-terras e um com o desenho de um orgão genital feminino aberto fazem suas manifestações com malabares e fumando maconha. Ridículo, que manifestação é essa? Compram no Mc Donlads do lado e exibem seus Ipads dentro da loja e restaurantes da região. Não usam roupas de marca, mas se vestem como pessoas pobres para dá um ar de alternativos. Porém, provavelmente, somente 10% são pessoas de baixa renda, o resto é classe média revoltada que daqui a dez anos seram extremamente consevadores e estarão investitindo na Bolsa de Valores.
    Alguns dessse jovens estão lá para promover a si mesmos e galgaram cargos políticos de esquerda.
    Protestar assim é mole e hipócrita, só ficam dando alfinetadazinha no sistema.

  13. Alf disse:

    É, mas ninguem fica doidão fumando cigarro. Há uma diferença fundamental ai. A Maconha pode induzir o fumante a praticar atos insensatos. Isso não ocorre aos fumantes.

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